TAP, Manutenção Brasil e direitos de tráfego – a explicação do negócio?


Neste post pedimos esclarecimento de situação que envenena o debate sobre a TAP:

-o investimento da TAP na Manutenção Brasil foi ou não condição necessária para que o Senado Federal aprove, em 2007, o ‘acordo Portugal Brasil’ que dá extraordinários direitos de tráfego à TAP?

Por outras palavras, é verdade ou não que

-este Acordo permite à TAP desenvolver o hub intercontinental de Lisboa e por essa via garantir a sua sobrevivência?

-esta sobrevivência foi levada ao limite pela incapacidade dos governos capitalizarem a TAP por via da sua privatização, como é oficial desde 2009?

Transparência, precisa-se. A Bem da Nação e para não nos desgastarmos em querelas inúteis.

 

*Regulação internacional por acordos bilaterais

O tráfego aéreo entre Portugal e os países da CPLP ainda é regulado por acordos bilaterais entre estados soberanos, quase nos termos da ‘velha’ regulação internacional de 1944/1946.

O argumento que ‘a TAP garante ligações com os países da CPLP (e não lusofonia, porque não há lusitanos por lá)’ deve ser temperado pelo respeito que estes países nos merecem e nos impõem.

Esta maneira diferente de ver as coisas é particularmente importante no caso do Brasil e da TAP no Brasil.

*O ‘acordo entre Portugal e o Brasil’ – de 2002 a 2007

O Acordo sobre Serviços Aéreos entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil é assinado em Lisboa em 11 de Novembro de 2002 e aprovado em 2003 pela Resolução da Assembleia da República n.º 38/2003 de 6 de Maio

É preciso esperar cinco anos até que o Senado Federal da República Federativa do Brasil aprove o Decreto n.º 6.058, de 8 de Março de 2007, que promulga o acordo assinado em 2002. (1).

*As rotas, quais rotas?

No Acordo, a alínea g) do Artigo 1 estipula:

- g) a expressão “Anexo” significa o Quadro de Rotas apenso ao presente Acordo e quaisquer cláusulas ou notas constantes desse Anexo.

As ‘rotas’ acordadas são um dos pontos mais importantes destes acordos.

Em todas as versões do Acordo a que tivemos acesso, incluindo PDF do Diário Oficial, não encontramos a lista das rotas no Anexo.

Uma coisa é certa:

-a TAP já voou para onze destinos no Brasil (actualmente dez) e conta voar para mais, o que é uma enormidade quando ‘do lado de cá’ Portugal apenas oferece Lisboa e Porto, este com tráfego pouco relevante.

É certo também que

-as vantagens comparativas e competitivas do hub de Lisboa se traduzem numa captação de turistas que se acrescenta à das tradicionais rotas ponto-a-ponto entre cidades brasileiras e da Europa.

Apesar desta racionalidade económica ser argumento para os interesses do Brasil, o número de rotas aceite pelo Brasil não é normal neste tipo de acordos.

*Maio de 2007 – entusiasmo do Jornal do Brasil

Avaliado ‘a seco’, o negócio da Manutenção do Brasil é mau e tem alimentado a ladainha de ‘a TAP é viável mas a Manutenção do Brasil dá cabo dela’.

Em 14 de Maio de 2007, o título do Jornal do Brasil fala por si: “Ex-empresa da Varig duplica receita da TAP com serviços” (2).

Citamos uma amostra de uma notícia toda ela entusiasta e parte do contexto em que o Senado aprova o acordo:

-“O grupo português TAP vai duplicar o faturamento neste ano com a manutenção de aviões. Com o aumento de 90% na participação na VEM Manutenção e Engenharia, o antigo braço de manutenção da Varig, a empresa conseguiu um novo canal para crescer. O presidente do grupo português, o brasileiro Fernando Pinto, revela que havia uma incapacidade de expansão da TAP Manutenção e Engenharia. Por isso, a TAP decidiu ampliar sua presença na VEM. […]

De acordo com o executivo, 50% dos serviços de manutenção realizados na TAP são para grandes empresas internacionais.”.

-“Para o consultor e presidente da Aeromarketing, Décio Corrêa, a compra da VEM pela TAP foi uma jogada de mestre da companhia portuguesa, uma vez que o Brasil tem o quinto maior mercado mundo e, por isso, detém tecnologia, normas e legislações severas para manter as aeronaves no ar.”.

-“A TAP encerrou o ano passado com um lucro de 7,3 milhões de euros, acima da meta de 4 milhões de euros prevista para o período. A companhia portuguesa também terminou o ano passado com resultado operacional de 30,3 milhões de euros, ante os 9,5 milhões negativos de 2005. Os vários tipos de negócio da companhia - transporte aéreo, manutenção e carga - fizeram a receita crescer 21,7% em relação ao ano anterior, ao atingir 1,65 mil milhões de euros.”.

*Um investimento estratégico

Vai para dois/três anos, com a Manutenção Brasil a acumular prejuízos, Fernando Pinto insiste em o negócio ter sido estratégico. Um CEO não utiliza ‘estratégico’ ao acaso e deu-nos para pensar, mas era pouco e só dava para teoria da conspiração

Há dois/três meses, num programa Prós e Contras, Fernando Pinto começa a falar sobre o negócio estar ligado a presença da TAP no Brasil … mas Fátima Campos Ferreira não o deixou continuar. Claramente, a moderadora não avaliou o interesse da conversa.

Diogo Lacerda Machado é gestor na Geocapital (de Stanley Ho e parceiro da TAP no negócio do Brasil e da VEM). No Correio da Manhã de hoje (10 de Fevereiro de 2016) afirma

-“a estratégia que em 2005 levou a TAP a investir na VEM foi decisiva para permitir à TAP posicionar-se como a maior companhia aérea estrangeira no Brasil”.

Estas palavras e actualidade da TAP já justificam publicar este post.

Voltaremos a algumas das disposições do Acordo em próximo post.

 

A Bem da Nação

Lisboa 10 de Fevereiro de 2016

Sérgio Palma Brito

 

Notas

(1)Ver


(2)Ver

14.05.2007.JornalBrasil.VEM.Sucesso


Jornal do Brasil

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