A grande seca que João Duque inflige aos leitores do Expresso

A crónica de João Duque no Expresso* é mais um exemplo que que o turismo é tema que as pessoas mais qualificadas abordam sem conhecer e assim degradam a sua intervenção. A crónica justifica post crítico porque o autor exagera no disparate. Vamos procurar pôr o esférico a rolar sobre a relva.


1.Conceito de turismo segundo ponto de vista da oferta e redutor

O primeiro parágrafo apresenta um conceito de turismo segundo ponto de vista da oferta, o que é possível, mas redutor a um ponto que o condena sem apelo nem agravo. Na essência, JD esquece a oferta de Alojamento Turístico em duas modalidades a não ignorar:

-Residência Secundária (ou Alojamentos Vagos) em utilização turística pelo proprietário família e amigos ou arrendada a turistas, o que agora se chama de Alojamento Local,

-Alojamento Gratuito por Familiares e Amigos, importante em País de Diáspora.
Tivesse o autor optado por um conceito de turismo do ponto de vista da procura 

teria consultado as Recomendações Internacionais sobre Estatísticas de Turismo (da ONU, UNWTO, OCDE e Eurostat) e evitado o erro grosseiro de ignorar como o comportamento das ‘pessoas’ gera a dinâmica de procura e oferta pelas duas modalidades de Alojamento Turístico referido antes.

Em Portugal, Alojamento Turístico é o que o Estado define como tal em sucessivos regimes legais, que reduzem o Alojamento Turístico à Hotelaria e ilegalizam ‘o resto’. A excepção é Adolfo Mesquita Nunes a legalizar o Alojamento Local, designação absurdamente absurda, mas era a que estava à mão.


2.”número de turistas não residentes entrados em Portugal”

Na senda do erro anterior, JD comete um segundo erro muito frequente em Portugal mas que um Professor Catedrático do ISEG não pode cometer:

-reduz ‘turistas’ e ‘dormidas’ ao que é de facto a Industria da Hotelaria ou Alojamento Classificado segundo os requisitos das ‘Leis Hoteleiras’.

JD não tem consciência de alimentar o que é talvez o mais importante erro da Politica de Turismo em Portugal desde há dezenas de anos:

-reduzir o Alojamento Turístico’ à Hotelaria, ilegalizando 'o resto' do alojamento turístico mercantil e ignorando a realidade da Economia do Turismo mais acordos internacionais desde a já longínqua Conferência de Otawa em 1991.

Desde esta altura e para as Instituções Internacionais refeidas antes,

-‘Alojamento Turístico é qualquer instalação, individual ou colectiva, utilizada por turistas. 

Se eu esporadicamente receber não residentes em minha casa, esta é Alojamento Turístico enquanto durar a estadia.


3.”ritmo crescimento de turistas e das dormidas está a arrefecer”

Seguimos JD na sua opção de apenas lidar com a Hotelaria ou Alojamento Turístico Classificado. JD compara as taxas de crescimento de turistas e dormidas de 2014 para 2015 e de 2015 para 2016 com as de 2016 para 2017. 

Com base nesta magnífica série histórica constata que estas últimas são positivas mas inferiores à anteriores.

Não lhe ocorre a ideia, conhecida desde há dezenas de anos, de variações conjunturais ao longo de uma tendência crescente no longo prazo. E a ideia de as variações conjunturais serem diversificadas, segundo países ou segmentos de mercado.

É isto que acontece com o número de turistas, dormidas, passageiros nos aeroportos e por aí adiante. É só consultar as séries longas.

Não nego que possa haver problemas (conheço alguns), mas a análise quantitativa tem de ser muito mais profunda.


4.”depedentes das companhias de aviação e em particular das low cost”

Aqui JD dá um pulo que só compreendermos por ‘a dependência’ ser um must em análises superficiais do turismo. No Algarve já tivemos ‘a dependência’ dos operadores turísticos. Hoje temos as ‘das low cost’.

O sucesso da procura/oferta de turismo em Portugal depende, antes de tudo o mais, da capacidade da atracção da oferta (publica e privada), pela sua competitividade assente nas pessoas (os portugueses), preço e distribuição mais branding dos destino regionais a apoiar o Marketing & Venda da oferta no mercado pela iniciativa privada. A cena dos ‘Ps’ está a ficar mais sofisticada mas o essencial é que tudo começa por depender de NÓS!

O transporte aéreo integra o produto, influencia o preço e distribuição e não deve ser visto separadamente dos ‘Ps’ anteriores. Nas actuais condições de mercado, as cinco grandes companhias low cost pan-europeias (Ryanair, Easyjet, Norwegian, Vueling e WIZZ Air … mais a Eurowings) também dependem da capacidade da oferta portuguesa para cumprir com os planos de expansão com que se comprometeram em bolsa e ganhar na concorrência que já se instalou entre elas. O primeiro sinal desta nova relação foi a instalação da base da Ryanair em Lisboa, sem qualquer incentivo público e que gera dois milhões de passageiros em 2014.

O mercado do transporte aéreo é livre e a concorrência não perdoa. Suba o petróleo para níveis já atingidos e haverá companhia para Alitalia, Air Berlin e Monarch. Se não reduzir custos unitários de produção, a TAP corre o risco de ser parte desta companhia.


5.“o nosso fundo soberano detivesse uma posição accionista nestas empresas”

Com ‘esta tirada’ chego a pensar que JD escreve crónica a gozar com a malta. Quem escreve isto imagina que Portugal é a Noruega o que não é pequena ilusão. Não é, não fundo, soberano ou não, porque o Estado vive da dívida para servir as suas clientelas. Investir em bolsa em acções de companhias low cost?

Muito pior, JD alimenta outra ilusão. 

A de um accionista destas companhias as poder influenciar para operarem rotas e frequências não rentáveis, de maneira a não compensar a falta de competitividade da nossa oferta de turismo. O autor recua à TAP ‘transportadora aérea nacional’ que ‘garante’ e o Estado paga porque saca ao contribuinte. Desde a liberalização de 1993 que tal não é possível.

Nesta matéria há uma regra de ouro:

-nenhuma low cost deixa de operar rota rentável e nenhuma opera rota que deixe de o ser.

O resto é conversa.


A Bem da Nação

Lisboa 2 Dezembro 2017

Sérgio Palma Brito


*A seca dos turistas em http://leitor.expresso.pt/#library/expresso/semanario2353/economia/opiniao/a-seca-dos-turistas

Manutenção Brasil salva TAP da falência e direito a saber mais

*Abril 2016 - Diogo Lacerda Machado na Assembleia da Republica

Diogo Lacerda Machado tem vaipes do tipo antecipar que

-a HNA "pode trazer capacidade financeira acrescida e pode fazer de Lisboa um ‘hub’ alternativo a Heathrow [Londres] ou Schiphol [Amesterdão] ", (1).

Tomadas as devidas precauções sobre excessos deste tipo, as declarações de DLM dão informação fundamental sobre o negócio TAP Brasil.

Segundo o Jornal de Negócio de 27 Abril 2016, «o "investimento que a TAP fez a comprar a Varig alavancou o melhor da história da TAP dos últimos anos" com a operação no Brasil. A penetração nesse mercado só foi possível porque a transportadora "se envolveu na tentativa de salvar a Varig" e porque "passou a ter uma posição e um reconhecimento absolutamente distintos do que tinha até então".» (2).

*O post de 10 Abril 2016

Demos destaque a estas declarações no post ‘TAP, Manutenção Brasil e direitos de tráfego – a explicação do negócio?’ (3).

Este post é publicado poucos dias antes, o contexto e vale a pena ser lido. Citamos o Correio da Manhã de hoje (10 Fevereiro 2016) no qual DLM afirma: 

-“a estratégia que em 2005 levou a TAP a investir na VEM foi decisiva para permitir à TAP posicionar-se como a maior companhia aérea estrangeira no Brasil”.

E concluímos que “Estas palavras e actualidade da TAP já justificam publicar este post.”.

*“a TAP evitou ser mais um a cair no “cemitério de projectos bancários e industriais portugueses”

No congresso da APAVT em Macau, Diogo Lacerda Machado é entrevistado pelo presidente da APAVT, a associação empresarial cujos associados mais negócio fazem com a TAP. Segundo o Publico, DLM declara [o sublinhado é nosso]:

-“a compra da VEM foi “a decisão mais estratégica tomada por Fernando Pinto” no tempo em que esteve sozinho ao leme da empresa. Não houve, garante, ganhos financeiros para a Geocapital, e só a compra da empresa de manutenção — a segunda do hemisfério sul, sublinhou —, ligada a uma tentativa de salvar a Varig, é que permitiu à TAP expandir-se depois para o Brasil (com novas rotas) como se expandiu.

Ao contar com o apoio do Governo brasileiro, num mercado “hostil para estrangeiros”, a TAP evitou ser mais um a cair no “cemitério de projectos bancários e industriais portugueses(4).

Esta informação é importante porque confirma o que realmente foi o investimento na Manutenção Brasil. Falta referir o papel que o presidente Lula e primeiro-ministro José Sócrates têm na decisão politica que assenta nesta decisão empresarial – ver parte da explicação no referido post.

*O vaipe de Diogo Lacerda Machado

Depois, dá um vaipe a Diogo Lacerda Machado. Citamos o Publico:

-“No acerto de contas que fez perante centenas de profissionais que estavam na plateia, ontem de manhã em Macau, Lacerda Machado deu dois números: a TAP aplicou 450 milhões na VEM e arrecadou 13 mil milhões em proveitos por via do Brasil. Mensagem passada através do palco, num dia em que Diogo Lacerda Machado tomou a iniciativa de não ser discreto.”.

Comparar €450milhões de resultado liquido negativo acumulado com €13 mil milhões em proveitos não faz sentido.

Corrigimos o erro e passamos adiante! Manutenção Brasil salva TAP da falência e nós temos direito a saber mais, isto é saber tudo porque o negócio da TAP tem de ser transparente. Mesmo mais de dez anos depois.


A Bem da Nação

Lisboa 26 Novembro 2017

Sérgio Palma Brito


Notas

(1)2016.04.27 Jornal de Negócios Chineses da HNA podem fazer Lisboa concorrer com Heathrow ou Schiphol

(2)2016.04.27 Jornal de Negócios VEM foi vendida à TAP a um preço “escandalosamente baixo”



(4)2017.11.26 Publico O que diz Lacerda Machado sobre amizade com António Costa, a China e a TAP

Factores que diferenciam as companhias Low Cost pan-europeias

Em 2016, as cinco companhias low cost pan-europeias (Ryanair, Easyjet, Vueling, Norwegian e WIZZ) transportam 270 milhões de passageiros (gráfico 1) e representam o essencial do transporte aéreo low cost na Europa (1).
Neste post identificamos vantagens comparativas destas cinco companhias e mostramos como constroem vantagens competitivas que as diferenciam e reforçam ao longo de anos.

Gráfico 1- Passageiros de companhias low cost em 2016

Fonte: Relatórios anuais das companhias aéreas
O gráfico inclui ainda a Eurowings do Lufthansa Group e a Transavia do Air France/KLM Group que, por enquanto se limitam a operar nos países das FSC’s que integram o grupo. Base multinacional limitada e génese/formação diferentes das ‘cinco grandes’ excluem-nas do âmbito do presente post.

Sugerimos consulta prévia do post ‘Indicadores correntes da performance de companhias aéreas' em http://sergiopalmabrito.blogspot.pt/2017/11/tap-e-indicadores-correntes-da.html


1.Vantagens comparativas das cinco LCCs pan-europeias

*Possibilidade de criar corporate culture própria e diferente

Peter Drucker terá dito que “Corporate culture eats strategy for breakfast” (2). O leitor pode aprofundar o tema, mas para os mais pragmáticos, Corporate Culture é o que realmente diferencia o Grupo SONAE do Grupo Espírito Santo – as estratégias empresariais vêm depois. É esta corporate culture do passado que leva a então CEO da EasyJet Caroline McCall, a declarar em Fevereiro de 2016:

-“They [legacy carriers] can never have the low-cost culture, the low-cost mentality, and they can never have the same kind of cost efficiency.” (3).

As atribulações por que passam Eurowings e Transavia confirmam esta afirmação. A possibilidade de criar a corporate culture a partir de zero é vantagem comparativa das LCCs.

*Ausência de custos económicos e financeiros ligados à legacy

Contrariamente às FSCs, as LCCs não têm os custos económicos e financeiros resultantes da herança em matéria de

-fundo de pensões da empresa,

-estatuto do pessoal e peso da intervenção sindical,

-custos excessivos de estrutura,

-accionista público que dificulta/impede a adaptação às exigências do mercado.

*Companhias low cost nos três grupos da consolidação de FSCs

Cada um de acordo com a sua corporate culture, os três grupos da consolidação de FSCs começam por negar a existência de mercado e hostilizam as LCCs. Depois reconhecem a importância do mercado que as procura (parte dele à sua custa) e acabam por criar uma LCC sempre com o objectivo de competir com Ryanair e Easyjet. Assim, a partir de 2013

-o IAG adquire a Vueling que passa a ter importância estratégica no grupo e cria a Iberia Express ligada à Iberia,

-o Air France/KLM Group prevê criar a Transavia Europe em complemento da Transavia Holland e Transavia France, o sindicato dos pilotos da Air France força o abandono da ambição pan-europeia e impõe uma Transavia limitada aos dois países das empresas mãe,

-o Lufthansa Group, depois do passo em falso com a Germanwings, acaba por converter a Eurowings em ambiciosa plataforma low cost do grupo e a poder ter bases em outros países, mas o processo ainda está em curso.

Com excepção do IAG [ver na Figura 4 o número de bases de cada companhia do grupo], a criação das LCCs dos outros dois grupos enfrenta problemas de legacy e de corporate culture que impedem ou dificultam a criação da base pan-europeia da LCC (4).

Em qualquer dos casos, a criação de uma LCC no seio do grupo de FSCs não pode ser escapismo ao essencial: redução dos custos operacionais da operação médio curso e longo curso das FSCs que as torne competitivas face à concorrência de LCCs e FSCs do Golfo, respectivamente no médio curso europeu e longo curso para Índico, Médio e Extremo Oriente. 


2.Criação de vantagens competitivas das LCCs

*Três características comuns e únicas mais o pioneirismo

Dispor de vantagens comparativas à partida é bom, mas o mérito reside na gestão que cria vantagens competitivas. Para começar, constatamos que as cinco LCCs apresentam três características comuns e únicas:

-génese entrepreneurial, crescimento ligado a leader carismático e rigor imposto pela cotação em bolsa, directa ou indirectamente (caso da Vueling integrada no IAG plc),

-formação de nova corporate culture aberta à competitividade do mercado do transporte aéreo,

-relação entre accionistas, gestores e trabalhadores focada no sucesso da empresa e em ultrapassar as inevitáveis tensões (5).

É a conjugação destas três características que está na base de pioneirismo de Ryanair e easyJet em

-duas técnicas de segmentação por “price discrimination: unbundling e dynamic pricing”, que permite oferecer a cada cliente “a combination of product/service features and time availability, so to maximise the total price that each customer is prepared to pay.” (6),

-bases pan-europeias, com aposta em aeroportos sub-utilizados, eficiência na gestão de recursos (pessoal e aviões) em rotas e intensidade nas rotas, que constantemente avaliadas, mais market awareness na origem e destino que facilita as vendas.

*Unbundling

As LCCs são decisivas em dois níveis de unbundling. O primeiro nível dá ao cliente a possibilidade de adquirir transporte e alojamento sem ser em package holiday ou excursão de inclusive tour. O sucesso da Booking.com é filho desta liberdade: o turista deixa de ser obrigado a comprar transporte aéreo e alojamento em conjunto e passa a escolher o fornecedor de cada um dos serviços. Por sua vez o sucesso de Booking.com e congéneres alimenta o sucesso deste primeiro unbundling das LCCs.

Neste ponto ocupamo-nos do segundo nível de unbundling:

-“unbundling of the airline offer into its component product and service features, each priced separately. Starting with the simple seat from A to B, separate prices are on offer for additional features such as seat reservation, priority boarding, onboard catering, hold baggage check-in and ticket rebooking flexibility.”.

O Financial Times lembra como o unbundling vem a ser copiado por FSCs:
-“This led to a fundamental change in the market, with full service carriers aping many of the practices successfully introduced by low-cost carriers. This has seen most carriers offer seat-only fares and charge for baggage and other services.” (7).

Hoje ainda é intellectual-chic criticar o unbundling a partir do preço baixo que cresce – há anedotas sobre o tema. A experiência mostra que a facilidade dada ao viajante ultrapassa este e outros epifenómenos. O unbundling gera importante ancillary revenue (gráfico 2).

Gráfico 2 – Ancillary revenue as a percentage of total revenue for selected LCCs 2014

Fonte: IdeaWorks and Dr F O'Connell, "Ancillary Revenues" Cranfield University

Segundo o carismático professor Rigas Doganis na mesma análise do CAPA,

-“Ancillary revenues can be extremely profitable. […] Ryanair profit margin from ancillaries is 96%. For many FSCs a large part of ancillary revenue is the result of unbundling, and therefore not from new revenue sources. Where genuinely new revenues can be generated (or where unbundling leads either to a higher overall price or increased passenger traffic volume), ancillaries are an important means for growing both revenue and profit.”.

*Dynamic pricing

O dynamic pricing “typically involves prices rising as the departure date approaches, but also increasingly involves a more subtle adaptation of prices according to demand.”. Esta técnica, combinada com o unbundling exige serviço de Revenue Management que liberta lugares e fixa preços em função de informação sobre a procura e visa um alto load factor.

Duas observações:

-esta é a explicação das promoções a €1 ou viagens a €10 ou €20, o que ainda não é compreendido por muito boa gente,

-ainda aqui Ryanair e Easyjet são mais uma vez pioneiras e hoje todas as FSCs utilizam este instrumento – o problema é saber com que resultados.

Na Ryanair, a companhia que lança mais promoções, e no exercício a 31 Março 2017, a average fare é €41, 13% abaixo da de 2016 – ver o post sobre a Ryanair.

*Dimensão pan-europeia e seus benefícios

Segundo o CAPA, “one of the keys to LCC success is to have pan-European operations” que “allows purchasing efficiencies with suppliers and buying power with airports.”. Fora estas duas vantagens e da flexibilidade na gestão de rotas e da frota [ver a seguir],

-“In addition, a multi-base, multi-country strategy leads to brands that enjoy recognition by passengers at both ends of the routes (since they are not skewed to one country for their originating passengers). Having a presence across a number of countries also allows access to local pools of labour on a more cost efficient basis than is possible for airlines that are primarily based in one country.” (8).

Em termos concretos:

-a dimensão pan-europeia é ganha por Ryanair e easyJet e cria barreira à entrada de novos concorrentes,

-Norwegian e Wizz Air acedem ao mercado por mérito e por disporem de base regional própria (países nórdicos e Leste da Europa),

-a Vueling anuncia a base de Roma no final de 2012, mas só decide investir massivamente no final de 2013, já integrada no IAG, e aí começa a ser verdadeiramente pan-europeia.

O item “Eficiência na utilização de recursos – grande número de bases” ilustra a utilidade da base pan-europeia [ver a seguir].

*Market attractiveness” do destino e selecção de rotas e incentivos

A figura 1 ilustra o processo de selecção de rotas na Easyjet. Destacamos dois pontos:

-o processo começa pela market attractiveness [do destino], responsabilidade nossa e da qual tudo depende,

-Airport negociations da Easyjet não incluem relação da companhia com oferta, distribuição e apoio público ao marketing & vendas. Esta parte é responsabilidade do destino, com aeroporto, Turismo de Portugal e oferta a cooperar em rede e ligação à companhia aérea.

A título de exemplo, o lançamento de nova rota devia ser acompanhado de acção coerente de marketing & vendas na área de atracção do aeroporto de origem do tráfego alvo. A necessidade desta boa prática é reconhecida desde pelo menos 2009, mas ainda hoje não é implementada com a intensidade exigida.

Figura 1 – Easyjet New route selection process


Fonte: Europe by easyJet, Driving returns and profitable growth in European aviation, 10 September 2013, slide 51


*Quando incentivos potenciam a market attractiveness do destino

Tudo depende da capacidade de atracção do destino. Quando esta não é suficiente para atrair companhias aéreas, a flexibilidade das LCCs permite-lhes negociar sistemas de incentivos com o destino (aeroporto e oferta de turismo), que não possam ser identificados como Ajudas de Estado e terem de ser reembolsados pelas LCCs. E podem porque só as LCCs são capazes de gerar o volume que justifique o incentivo.

Em Portugal, desconhecimento da nova realidade e falta de informação sobe os incentivos criam dois mitos: as LCCs deixariam de voar para Portugal uma vez acabado o incentivo e o lucro das LCCs depende deste incentivo. Ainda recentemente voz relevante opina no Expresso:

-“Este modelo low cost só funcionou nos últimos anos porque era altamente subsidiado (por autoridades de turismo e aeroportos), apoios que vão diminuindo no tempo” (9).

A realidade desmente esta afirmação,

-os incentivos são importantes para arrancar com a operação das LCCs em Porto, Lisboa e Faro, mas o seu montante é hoje quase nulo (Lisboa) ou muito reduzido (Porto e Faro) e as LCCs continuam a operar porque a capacidade de atracção do destino faz as rotas serem rentáveis,

-os incentivos diminuem mas o Profit after tax da Ryanair aumenta 332% entre 2010 e 2017 (Gráfico 3).

Gráfico 3 – Ryanair profit after tax (€milhões)

Fonte: Elaboração própria com base nos relatórios anuais da Ryanair
No caso de Portugal, temos de recuar a Maio 2003, quando dois técnicos da ANA detectam o essencial:

-“A análise a mercados onde já ocorreu a entrada de companhias low cost permite constatar que este segmento de oferta motiva, não tanto uma reafectação de passageiros de outras companhias, mas fundamentalmente uma indução de novos passageiros, o que resulta num aumento da dimensão global do mercado.” (10).

Depois à um longo caminho: IDRAIT, Initiative.pt 2009/11, Initiative.PT 2.0 2012/14 (11).

*Sucesso na gestão de compromissos

A corporate culture e a génese entrepreneurial das LCC são postas à prova na gestão de três compromissos:

-serviço adicional e seu custo com revenue, lucro e disciplina financeira,

-estrutura ligeira, com eventual maior complexidade devida a serviço mais diversificado ao cliente, mas sempre a minimizar os unit costs,

-serviços bundled com unbundled, como vimos antes.

São conhecidos ocorrências do mesmo erro: a companhia promete um produto premium, aumenta o preço, descura o controlo do custo unitário e acontece o desastre. Falha a gestão do compromisso [Ver a seguir].

*Adaptação à sofisticação da concorrência interna e externa

A figura 2 mostra como em Novembro de 2014 o IAG vê a sofisticação crescente da oferta de Ryanair, Easyjet e Norwegian.

Figura 2 – IAG Competitors are becoming more “sophisticated”

Fonte: IAG, Capital Markets Day, 7th November 2014, slide # 121

*Serviço premium que não comprometa o custo unitário (CASK)

A oferta da Vueling é sempre diferenciadora e parece liderar o mercado do premium service. A figura 3 ilustra a sua visão da concorrência por Easyjet e Ryanair, e a conclusão: “Vueling will remain ahead of competition”.

Figura 3 – Premium service: Vueling continues holding an advantage

Fonte: IAG, Capital Markets Day, 7th November 2014, slide # 130

A estratégia de serviço premium supõe gerar o revenue adicional que compense os custos. Neste campo, sucesso da Vueling contrasta com o fracasso da Germanwings como LCC. Os custos de serviço premium da Germanwings mais custos com pessoal equiparados aos da Lufthansa excluíam à partida esta empresa do grupo das LCC. A posterior opção pela Eurowings assenta, entre outros, num custo de pessoal inferior ao de Germanwings e Lufthansa.

*Eficiência na utilização de recursos – grande número de bases

A figura 4 ilustra o modelo da frota de Airbus 320 das companhias do IAG no final de 2014 – o IAG cria no seu seio uma grande LCC. Destacamos

-Iberia (Barajas) e British Airways (Heathrow e Gatwick) com uma e duas bases, respectivamente,

-a LCC Iberia Express apenas com uma base por ser hub feeder da Iberia em Barajas,

-a LCC Vueling com 89 aviões e 22 bases, a companhia que mais partido pode tirar da flexibilidade na gestão de rotas e frota.

Figura 4 – IAG’s A320 Fleet

Fonte: Elaboração própria com base em IAG, Capital Markets Day, 7th November 2014, slide 49

A figura 5 ilustra exemplo recente da flexibilidade da gestão de rotas pela easyJet com o alocar a um aeroporto aviões que ‘pertenceriam’ a uma base em outro país. Registamos que na ocorrência, o aeroporto de Lisboa ‘ganha’ ao de Madrid.

Figura 5 – We make rational capital allocation decisions

Fonte: Elaboração própria com base em 2015 Full year results, analyst and investor presentation, 17 November 2015, slide 25

*Eficiência na utilização de recursos – gestão de rotas e frequências

A gestão de rotas compreende a criação/supressão e o aumento/diminuição de frequências na rota. Dispomos de informação sobre o número de rotas criadas em 2015 e 2016 pelas cinco LCCs pan-europeias, mas não das rotas suprimidas (gráfico 4). Regra geral são menos, mas em número igualmente considerável (12). Não dispomos de informação sobre a variação de frequências.

Gráfico 4 – Rotas criadas por companhias aéreas em 2015 e 2016 

Fonte: anna.aero em 2016.01.07 e 2017.01.11 (12)
A 23 Maio 2017, “Ryanair and Air Europa announced a new commercial partnership allowing Ryanair customers to book Air Europa long haul flights through Ryanair's website. […]
Ryanair had long been in talks with other possible long haul partners about providing long haul feed to them under interlining arrangements. […] the Air Europa agreement gives it an opportunity to gain practical experience of what will be another new feature of its continuously evolving business model.” (14).
Por fim, o network no seio das rotas da Ryanair. Em 17 Maio 2017, a Ryanair “launched its first connecting flights through Rome Fiumicino Airport, providing Ryanair customers with an expanded route choice, and the opportunity to book and transfer directly onto connecting Ryanair flights for the first time.
This connecting flights service is the newest initiative […], with more connecting flights services to be rolled out across the entire Ryanair network later this year as long as the Rome Fiumicino trial proves to be a success.” (15).

*De fazer crescer o mercado à concorrência com FSC e entre LCCs

Em 13 Janeiro 2016, o site anna.aero sintetiza a evolução da competitividade das LCCs.

-“Initially these carriers were content on mostly finding new markets (often from secondary airports) or taking on incumbent legacy carriers. However, with their rapid pan-European expansion there is now growing evidence of these carriers increasingly taking on each other.” (16).

Segundo o CAPA,-“Wizz Air faces Ryanair competition on 14% of its city pairs, covering 30% of its seats. Moreover, Ryanair is expanding rapidly in CEE [Central and Easter Europe], with five new bases this winter, increasing this overlap to around one third of Wizz Air's capacity. For Ryanair, the overlap represents a higher proportion of its CEE capacity, but only a very small share of its total seat numbers.” (17).


A Bem da Nação

Lisboa 21 Novembro 2017

Sérgio Palma Brito


Se acede ao blogue pela primeira vez, sugerimos que percorra os Princípios Gerais do Blogue a Nota Biográfica em http://sergiopalmabrito.blogspot.pt/p/apresentacao.html


Notas

(1)Ryanair a 31 Março 2017, Easyjet a 30 Setembro 2016, as outras a 31 Dezembro 2016.

(2)Entre mil exemplos, ver 2015.12.05 Forbes, Drucker Said 'Culture Eats Strategy For Breakfast' And Enterprise Rent-A-Car Proves It
Para os mais curiosos, Edgar H. Schein, Organizational Culture and Leadership, 2004, Wiley.

(3)Ver 2016.02.01 Bloomberg, EasyJet CEO Says `Flailing' Air France, Lufthansa Are Easy Prey

(4)Ver Sérgio Palma Brito, Turismo e transporte aéreo em Portugal em http://www.ciitt.ualg.pt/
ou II Parte – Indústrias europeias do transporte aéreo

(5)O caso dos pilotos da Ryanair no Outono 2017 é uma das mais importantes tensões negativa que o mercado conhece e a que vamos assistir no próximo futuro (em 16 Novembro 2017). Na Easyjet há durante anos tensões com o fundador e accionista importante da empresa.

(6)Esta citação e as que seguem sobre unbundling e dynamic pricing são baseadas em 2016.03.24 CAPA,Airlines in Transition. How FSCs can regain short haul share from LCCs Part 1: at the coal face


(8)Ver 2015.06.03 CAPA, Who has the right model for European aviation? Pan-European airlines lead, but models vary

(9)2017.10.04 Expresso, Afinal, o que se passa com as low cost?

(10)Nuno Almeida Costa, Francisco Vieira Pita, As companhias low cost e os aeroportos, documento interno ANA, 2003.

(11)Ver Sérgio Palma Brito, Turismo e Transporte Aéreo em Portugal, V Parte – Procura/oferta de turismo e intervenção pública, V.4.Intervenção da ANA Aeroportos.

(12)2016.01.07 aana.aero, World’s airlines started over 3,100 new routes in 2015; easyJet, Ryanair, Vueling and Wizz Air take top four places for most new routes
-2017.01.11 aana Airlines started 3,000+ new routes in 2016; Ryanair back on top beating easyJet and Wizz Air as Euro and US (U)LCCs dominate


(14)2017.05.29 CAPA, Ryanair's next step to becoming a network airline: Air Europa long haul feed & Rome transfer product

(15)Connecting Flights Launched At Rome Fiumicino 17 May 2017
(16)2016.01.13 anna.aero Intensified PELOCO5 competition – easyJet, Norwegian, Ryanair, Vueling and Wizz Air – 231 routes operated by at least two of them PELOCO5 (Pan-European LOw-COst 5)

(17)2016.06.07 CAPA Wizz Air: city pair overlap with Ryanair on one third of seats. Opportunities for both; CASK crucial"