TAP – Regulação europeia, transformação do mercado e realidade

Com o fim da guerra colonial e a abertura da Europa, a TAP deixa de ser companhia de bandeira e instrumento de soberania do Estado, criados pela regulação da Convenção de Chicago em 1944.

Entre a nacionalização e 1992, a TAP é ‘transportadora aérea nacional’ porque o Estado financia prejuízos e paga despesas específicas.

Em 1993, com a liberalização do mercado aéreo no espaço comunitário, a TAP passa ser uma transportadora aérea europeia obrigada a operar em mercado concorrencial, sem ajuda do estado e com obrigações de serviço público definidas e escrutinadas por Bruxelas. O mundo da TAP muda.

A partir da década de 1990, o mercado europeu do transporte aéreo conhece uma transformação estrutural que obriga as empresas do turismo a também estrutural adaptação. O mercado mais importante da TAP muda.

Da mesma maneira que regulação e Europa das décadas de 1940 e seguintes ‘geravam’ empresas estatizadas, a liberalização de 1993 ‘gera’ empresas privadas. Em Portugal o pensamento dominante ignora isto.

Apesar desta inversão de circunstâncias condicionantes, governo, municípios (com grande destaque para o do Porto), iniciativa privada e opinião pública, cada um à sua maneira, continuam a viver na ilusão que o Estado ou um accionista privado podem impor à TAP actividades estruturalmente deficitárias. Não podem porque comprometem a sustentabilidade da TAP.

Depois da ajuda do Estado em 1994, a TAP volta a estar à beira da falência em 2000/2001. Desde essa altura e até 2015, a única gestão profissional que a TAP tem desde a nacionalização consegue escamotear os efeitos da descapitalização da empresa, que se agrava desde o prejuízo de 2008 (€-208m) e bate contra a parede em 2015.

Para não ir mais longe, desde 2001:

-a TAP é vítima do ‘accionista estado português político partidário’ que não a sabe capitalizar não a consegue privatizar e faz fraca o que era a forte gestão profissional.

É este o ‘accionista’ que quer reverter a privatização e recuperar a maioria do capital da TAP.
Fim da síntese do post

*Uma série de quatro posts
O processo em curso de reversão da privatização da TAP tem implicações profundas no futuro da empresa e impacte no País. Para ajudar o cidadão a formar opinião, publicamos quatro posts (primeiro, segundo, terceiro, quarto)interligados:

-TAP – Regulação europeia, transformação do mercado e realidade
Post no qual descrevemos o contexto regulatório e de mercado em que a privatização da TAP e a sua reversão se inserem,

-TAP – Que importância para o turismo em Portugal?
Post no qual mostramos a real dimensão da importância da TAP para o turismo em Portugal,

-TAP – Indicadores de performance e produtividade do trabalho
Post no qual se mostra os indicadores que desconhecemos e explicamos alguns a que temos acesso – uma companhia de aviação não se avalia só com número de passageiros e ocupação dos aviões,

- TAP – Reversão da privatização e a TAP no futuro
Post no qual sintetizamos o que se conhece da reversão da privatização e tentamos mostrar o que esta representa.

Boa leitura e previa consulta dos Princípios Gerais do Blogue em:


1.Regulação internacional do transporte aéreo (1944/1993)

*Regulação internacional do transporte aéreo 
A regulação internacional do transporte aéreo de 1944/1946 (Convenção de Chicago e Acordo das Bermudas) assenta em três pilares:

-acordos bilaterais entre estados que decidem e definem rotas, para cuja operação cada parte contratante designa uma companhia aérea,

-acordos entre companhias aéreas designadas sobre repartição de receitas por rota,

-companhias aéreas acordam preços no âmbito da IATA, com ratificação governamental (1).

Este modelo de regulação e o tempo em que é estabelecido pressupõem companhias que

-são instrumento da função de soberania do estado, com destaque para estados com impérios coloniais,

-dependem da designação pelo estado para operar rotas que este acorda com outros estados,

-têm capital detido pelo estado que as apoia política e financeiramente, com o subsidio estatal e compensações por tarefas especificas,

-são símbolo nacional, quase ao nível do hino e bandeira dos países.

*TAP – função de soberania e companhia de bandeira (1944/1975)
É neste contexto de companhia de bandeira que transporta passageiros e é instrumento da soberania nacional que devemos compreender o processo iniciado em 1944 e que leva à criação da TAP SA em 19cc (2).
Desde a década de quarenta e o 25 de Abril, os serviços que a antecedem e a TAP

-são, desde a criação, instrumento da soberania do Estado pela ligação ao Imperio, e por ser a ‘transportadora aérea da guerra colonial’ desde 1962,

-nestes termos e no espírito da regulação da década de 1940, a TAP SA é uma companhia de bandeira.

*TAP – ‘transportadora aérea nacional’ (1975/1993)
O 25 de Abril tem lugar numa Europa sem impérios coloniais, com a Comunidade Económica Europeia em marcha e com as companhias de aviação ainda estatais em concorrência, permitida pela evolução da IATA e pela criatividade das companhias em tornear as regras do oligopólio.

O fim da guerra colonial e a transformação da Europa tornam obsoleta a companhia de bandeira e a função de soberania que a TAP exerce. A nacionalização evita a falência da TAP e cria a rigidez na gestão que vai impedir a sua inadaptação ao mercado.

É neste quadro que se constrói o conceito de TAP ‘transportadora aérea nacional’, que

-substitui a da ‘companhia de bandeira’ e dura até à liberalização de 1993,

-perdura no espírito de portugueses que teimam em ignorar a realidade: desde 1993 o conceito está obsoleto.  

Com efeito, a ‘transportadora aérea nacional’ tem duas faces:

-o modelo de negócio de ‘o Estado paga’ permite à empresa receber mais fundos públicos, acumular prejuízos sistemáticos e não ser objecto da transformação profunda de que carece,

-a narrativa que sublima esta realidade, com a TAP ‘garantir’ (para utilizar palavra da actualidade) “estabelecer ligações permanentes com as comunidades portuguesas mais significativas” e “com os países de expressão oficial portuguesa”, assegurar “transporte para as regiões autónomas” e ser “dinamizador da actividade turística nacional”. (3).

A ‘transportadora aérea nacional’ é coerente com a regulação internacional da década de 1940 e ainda em vigor, e com a tradição nacional em burocracia, centralismo e decisões português suave. A título de exemplo, a administração da aviação civil de Portugal e França, em acordo com TAP e Air France, utilizam o acordo bilateral entre Portugal e França da década de 1940 para limitar a oferta de lugares e permitir que as empresas pratiquem tarifas mais altas do que seria normal, porque a clientela cativa da emigração as tem de pagar. (4).

Por esta altura já é clara a nova realidade de acordos bilaterais entre estados e ‘companhias de bandeira’ em Angola, Moçambique e Cabo Verde, com a sua dinâmica empresarial e interesses nacionais próprios. As relações entre Portugal e ‘a lusofonia’ ganham uma dignidade nova.


2.Liberalização do mercado europeu do transporte aéreo (1993)

*A liberalização de 1993
Anunciado desde a segunda metade da década de 1980, decidido em Junho de 1992 e a aplicar em Janeiro de 1993, o chamado ‘terceiro pacote’ de decisões comunitárias

-culmina o processo da liberalização gradual do mercado do transporte aéreo na Comunidade,

-impõe de facto a liberalização por as suas medidas serem de aplicação imediata, sem necessidade de transposição para legislações nacionais.

O pacote integra regulamentos relativos

-a licenças às transportadoras aéreas comunitárias, eliminando a diferença entre companhias de voos regulares e companhias charter,

-ao livre acesso das transportadoras aéreas comunitárias às rotas aéreas intracomunitárias,
-à liberdade de fixação de tarifas aéreas de passageiros e de carga.

Em Janeiro de 1993 nasce o novo mundo das transportadoras aéreas comunitárias. Nunca é demais insistirem que no Portugal de hoje ainda há muita gente que tal ignora.

*Companhias aéreas rentáveis, mercado aberto e ajuda do Estado
A liberalização de 1993 só é plena no espaço aéreo comunitário. Nas rotas exteriores, sobretudo as intercontinentais, continua a haver acordos bilaterais entre estados e uma concorrência muito regulada (Brasil). Nesta regulação dual,

-as transportadoras aéreas europeias estão sujeitas a regulação, o que as desfavorece na concorrência com companhias apoiadas pelos estados (de África/América Latina ao Médio Oriente e Ásia) ou com envolvente legal mais favorável (nos EUA o recurso ao Chapter 11 alivia encargos vários).

Na realidade, as transportadoras aéreas europeias

-estão obrigadas a ser rentáveis em mercado aberto e sem ajuda do estado, não podem receber indeminizações compensatórias por serviços não rentáveis e, em caso de problemas financeiros, a ajuda do estado é muito condicionada,

-operam numa liberalização concebida para empresas privadas, como a regulação da década de 1940 estava concebida para empresas estatais.
Insistimos. Em Portugal, muita da política e opinião público teima em ignorar esta realidade.

*Queda (teimosamente ignorada) da transportadora aérea nacional
O terceiro pacote

-torna obsoletas as noções de ‘companhia de bandeira’ ou ‘transportadora aérea nacional’, substituídas pela de transportadora aérea comunitária,

-destrói a narrativa de ‘a TAP garante’ porque o Estado deixa de poder pagar e, rapidamente, deixa de ter meios para o fazer.

Com efeito,

-a partir de Dezembro de 1994, as orientações sobre ajuda de estado a transportadora aérea europeia impedem o Estado português de pagar o prejuízo resultante da TAP garantir ou de subsidiar rotas que a empresa opera,

-a “obrigação de serviço público” tem definição legal a nível da União Europeia e não do estado português, o que elimina a fantasia politica (4).

*A regulação da aviação civil que falta ao País
O observador mediamente atento ao que se passa na então Comunidade Económica Europeia (CEE) percebe, aí pela segunda metade da década de 1980, que

-as regras de concorrência no transporte aéreo, fora do âmbito do Tratado de Roma (1956), vão passar a estar abrangidas pela politica comunitária e que tal terá consequências profundas em Portugal.

Uma destas consequências é a implementação de regulação independente da aviação civil. Em Portugal o processo é lento. Só em 1998 a regulação é separada de funções empresariais (criação das empresas ANA e NAVE, antes integradas na Direcção Geral da Aviação Civil, e do INAC para regular a sua actividade) e só alguns anos depois esta separação é completada.

Para encurtar uma longa e triste história chegamos à actualidade com:

-uma ANAC que está longe do que economia e sociedade modernas exigem, com a agravante da privatização da ANA ter restringido o domínio da regulação,

-políticos responsáveis que ainda identificam defesa do interesse público com propriedade pública das empresas que deveriam ser reguladas de maneira eficiente e não entendem que a regulação forte e independente é a garantia da defesa do interesse público.

Neste quadro, o recente aumento dos salários de gestores (e, supomos, corpo técnico) da ANAC é a cereja no topo da irresponsabilidade.


3.Transformação estrutural no mercado europeu do turismo

A liberalização de 1993 coincide e reforça a transformação estrutural do mercado europeu do turismo a partir da década de 1940. Se nos situarmos no tempo que vem da década de 1950

-a procura por package holiday que emerge na década de 1950 é ultrapassada pela de independent travel, que já se manifesta desde o início da década de 1980, e à qual tem de se adaptar.

Em Portugal ainda não há um entendimento completo sobre consequências desta conjugação de ‘liberalização de 1993’ com ‘transformação dos anos noventa’.

*Factores da transformação
A partir do início da década de 1990, o mercado do turismo na Europa passa por uma transformação estrutural com consequências profundas e ainda não completamente assimiladas em Portugal. A transformação atinge as deslocações turísticas em todos os meios de transporte mas é mais forte nas que utilizam o transporte aéreo.

A transformação assenta na conjugação de quatro factores independentes entre si e cada um com dinâmica e timing próprios. Os dois primeiros têm a ver com economia, sociedade e cultura:

-mudanças na sociedade, pela interligação da personalização massificada, procura de experiências e de autenticidade,

-alterações na demografia, pela crescente influência das gerações X e Y e fatal declínio da dos baby boomers, e alterações no seio de cada uma delas.

Os outros dois são obra imediata do Homem e o seu efeito combinado é tremendo:

-liberalização do mercado europeu do transporte aéreo em 1993, que facilita as deslocações e formação de nova oferta que gera nova procura,

-progresso explosivo da tecnologia de informação e comunicação as such e conjugação deste progresso com o da internet.

*Actores da transformação
Há três actores da transformação:

-o actor mais importante é o consumidor, cada vez mais aberto à aventura, melhor informado, cost conscious e conhecedor da internet.

-o mais evidente são as companhias low cost, na origem da democratização do transporte aéreo em toda a Europa e bem mais importante do que a dos charters do package holiday limitada às delocações de estadia para o Mediterrâneo,

-a internet que permite afirmação rápida de hotel bedbanks (Booking é exemplo maior), outras travel companies e portais de meta procura que alteram profundamente a maneira de fazer negócio no turismo.

*Substância da transformação
A substância da transformação começa por integrar três elementos:

-uma extraordinária transferência de poder, dos operadores turísticos para as companhias aéreas e destas e de outros agentes de viagem para o consumidor,

-crescimento acentuado das deslocações do tour urbano (Lisboa e Porto) mais adequadas às novas características da procura,   

-aparente estagnação da deslocação de estadia, caso do Algarve onde a oferta é lenta a adaptar-se e lesta a culpar ‘as low cost’.

O quarto elemento combina

-desintermediação por venda directa por parte da oferta (companhias aéreas, alojamento, rent a car e outros serviços) ou limitada a agentes espacializados como as hotel bedbanks de que a,

-unbundling na escolha da oferta pelo turista ou no seio da própria oferta, desde companhias aéreas low cost à hotelaria, passando pelas Full Service Carriers.


4.TAP – alimentar a ilusão e choque com a realidade (1994/2015)

A opinião dominante sobre a TAP é uma ilusão que ignora as exigências do mercado europeu do turismo e transporte aéreo, que são fruto

-da liberalização europeia e da nova realidade dos acordos bilaterais entre Portugal e países terceiros,

-da transformação estrutural do mercado, iniciada na década de 1990.

A privatização atamancada e sob stress da TAP em 2015 é muito fruto do choque com a realidade por já não ser possível alimentar a ilusão.

*A TAP no pós liberalização de 1993
Em 1994 e ainda sem o sistema europeu completamente formalizado, a Comissão autoriza a TAP a beneficiar de importante ajuda do estado, mediante condições severas e o compromisso da sua privatização (5).

Depois desta ajuda e até 2001, a TAP falha

-a competitividade no mercado intra-europeu,

-a patética aposta na expansão do longo curso Lisboa/Macau, com a criação da Air Macau como feeder da rota,

-a privatização, por ter errado na escolha do parceiro – a Swissair, mas com a saída a tempo de ser arrastada para a falência.

Estes desastres têm um preço:

-por volta de 1999/2000 a TAP está deficitária, descapitalizada e em ameaça de falência, porque o acordo de 1994 impõe pelo menos dez anos sem nova ajuda do Estado.

*A gestão profissional em 2001
Em 2000, o ministro Jorge Coelho escolhe e instala a primeira equipa de gestores profissionais que a empresa tem desde a nacionalização e que evita a ruína da empresa. Com efeito, no virar de 2000/2001 a TAP já tinha esgotado a ajuda recebida em 1994, e os relatórios anuais da empresa já referem a incapacidade do estado capitalizar a TAP, a privatização assumir “elevado grau de urgência”, pois “é a via para a reestruturação e a consolidação financeira da TAP.” (6). Fernando Pinto recorda que em 2000 já “havia duas grandes questões, uma era o volume de perdas e a outra era a falta de capital próprio” (7).

Em nossa opinião,

-a partir de 2000, é esta gestão profissional da TAP que evita a falência da empresa com medidas eficientes na operação da frota, nas vendas e, sobretudo, com a criação do hub intercontinental de Lisboa ligado ao Brasil.

*“A TAP-Air Portugal é uma companhia aérea internacional” (2001)
A estratégia empresarial para a TAP definida em 2001 rompe com a ‘transportadora aérea nacional’ das estratégias políticas desligadas do mercado e ainda é actual. Citamos o primeiro parágrafo:

-“A TAP-Air Portugal é uma companhia aérea internacional que opera, ligando a Europa a África e às Américas, a partir da sua base operacional em Lisboa, cidade que, devido ao posicionamento geográfico, constitui uma plataforma de acesso privilegiado aos mercados que a companhia serve.” (8).

*Escamotear a descapitalização
O sucesso da gestão profissional é imediato, a empresa recupera e são escamoteados os sintomas mais graves da descapitalização que perdura.

Em 2008 o resultado líquido da TAP SA é de €-208 milhões, cria um desequilíbrio no ‘escamotear’ e um receio nas pessoas mais conscientes da realidade: se um prejuízo parecido ocorrer, as consequências serão dramáticas. 
No relatório de 2009 a Parpublica refere a recapitalização “em articulação com a privatização” e sem a qual “a empresa ser arrastada para uma situação de ruptura financeira e de impossibilidade de, por si só, solver os seus compromissos.”.

Os sintomas da descapitalização vão e vêm, com crises pontuais como acontece em 2010, quando se pensa numa privatização sob stress. A falsa tranquilidade por vezes vem de onde menos se espera. Quando decorre a privatização falhada de 2012, o CEO da TAP declara:

-no início de Outubro, interrogado sobre “Mas manter-se a TAP como empresa pública não faria sentido. É isso?”, Fernando Pinto responde “Saber se a TAP sobrevive assim, claro que sim. Mas não é a situação ideal. O ideal é mesmo que receba capital para poder ter uma vida normal.” [o sublinhado é nosso].

-em 21 de Dezembro, afirma que “privatização da TAP é uma oportunidade, mas não uma necessidade”, acrescenta que “a privatização é uma oportunidade importante para [a empresa] ter acesso a capital, maior velocidade de crescimento e para se posicionar ainda melhor no mercado” e volta a sublinhar que a venda “não é uma necessidade de sobrevivência” (9).

Entre 2014/2015, a descapitalização da TAP começa a atingir a baia que levará a empresa a enfrentar o choque contra a parede da realidade, com ruptura de pagamentos e financiamento.

*O fraco ‘accionista estado português político partidário’
A privatização da TAP não se decide em choque de dois modelos teóricos de abstracto confronto ‘privado’ contra ‘estado’ . Decide-se no contexto de companhias aéreas com gestão profissional e sujeita a exigentes regras de mercado e do muito real ‘accionista estado português politico partidário’.

É um accionista instável nas pessoas (Mário Lino e Paulo Campos, Sérgio Monteiro e ministério das Finanças, e agora António Costa e Pedro Marques), na falta de preparação destas para o exercício da função accionista e na ausência de centro de conhecimento onde governo, administração, iniciativa privada, universidades e opinião pública sedimentem uma policie estruturante da intervenção pública.

O ‘accionista estado português político partidário’ é um accionista que,

-perante uma empresa descapitalizada, não a pode capitalizar sem um programa de um duro plano de reestruturação negociado com a Comissão.

-há mais de vinte anos se compromete em privatizar a TAP, tenta várias vezes e tudo o que consegue é a reversão de uma privatização feita sem competência nem transparência,

-desequilibra o tripé ‘accionista, gestor, trabalhador’ por via de condomínio entre o Estado e os sindicatos.

*Quantificação muito rudimentar de uma empresa fragilizada
O gráfico 1 ilustra a evolução do resultado líquido do exercício da TAP SA entre 2001/14 e dá-nos o fio condutor para avaliar o desempenho da empresa.

Gráfico 1 – TAP, resultado líquido do exercício (2001/2014)
(€ milhões)

Fonte: Elaboração própria com base nos relatórios anuais da TAP SA e do Grupo TAP  

Constatamos que

-depois da estabilização da empresa pela gestão profissional, a evolução positiva entre 2007/2010 é interrompida pelo resultado atípico de 2008, seguida de queda em 2011 e retoma em 2012 e 2013, interrompida em 2014,

-o resultado líquido acumulado entre 2001/2014 (€-47.5 milhões) indicia uma empresa ainda frágil (10).  

O terceiro post desta série mostra o que deve ser um painel público de indicadores de gestão.

*Ilusão das garantias pelo accionista privado ou público
Governo, PS e opinião pública, cada um à sua maneira, ignoram ou escamoteiam a empresa estar sujeita à disciplina de rentabilidade em mercado aberto e sem ajuda do estado, ealimentam ilusões sobre

-o accionista publico ou privado ‘garantir’ o hub de Lisboa ou a importância da natural base da TAP na capital,

-só a competitividade da TAP poder garantir as suas actividades o que exclui actividades que comprometam estruturalmente a sua rentabilidade, mesmo se a tal se opõe o sistema político, como actualmente acontece no Porto – ver o segundo post.

Mais concretamente é o caso de actividades como:

-rotas, capacidades e frequências, hub intercontinental de Lisboa, base da TAP em Lisboa e Obrigações de Serviço Público, com definição formal pela União Europeia e legislação nacional e actualmente residuais.

A Bem da Nação

Lisboa 4 de Março de 2016

Sérgio Palma Brito

Notas

(1)Esta síntese escamoteia a evolução na interpretação e aplicação das regras da IATA ao longo dos anos. Há dois mecanismos: iflexibilização informal pelas próprias companhias aéreas que organizam esquemas para poderem concorrer, ii)governo e administração publica dos países mais liberais liberalizam pontualmente as regras ou mesmo acordos bilaterais (Irlanda, Reino Unido e Holanda em meados da década de 1980).

(2)A empresa Transportes Aéreos Portuguese, SARL é criada em 1953, mas o processo que leva à sua criação data de 1944. Ver o post
Privatização da TAP Air Portugal (1) - de Salazar à Actualidade
e o Documento de Trabalho
TAP Air Portugal – Notas Genealógicas (1944/2012)

(3)A Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/85, de 6 de Fevereiro “Aprova a celebração de um contrato-programa entre o Estado e a TAP - Air Portugal, E. P., e autoriza os Ministros das Finanças e do Plano e do Equipamento Social a intervir na celebração desse contrato em representação do Estado”.
Ver post
A ‘transportadora aérea nacional’ – de 1976 a 2000

(4)Não há investigação sobre este assunto, mas esta é a base do nosso trabalho profissional no mercado francês entre 1982 e 1985 – o percurso Paris/Atenas é mais longo do que o de Paris/Lisboa e é comercializado abaixo do preço de Lisboa.

(5)Em Portugal e com excepções insignificantes, já não há Obrigações de Serviço Publico. Em 2015, assistimos aos benefícios da abertura das rotas Açores/Continente à concorrência – preços baixam e procura aumenta.

(6)Ver o post
Formação de uma TAP diferente – a gestão profissional de 2001/2015

(7)Declarações a OJE, 8 de Fevereiro de 2010.

(8)Pelo seu interesse citamos toda a definição:
-“ Na disponibilização do serviço aos seus Clientes, a Empresa mantém a sua forte ligação a Portugal, atitude que corresponde ao nicho de mercado onde a sua posição competitiva é mais sustentada, operando em complementaridade com uma ampla interligação a uma rede global, através de uma boa articulação com as suas parcerias em code-share (voos em código repartido).
A TAP-Air Portugal tem como principal actividade o transporte de passageiros e carga, mediante a disponibilização de um serviço na linha da tradicional hospitalidade portuguesa, promovendo a fidelidade dos seus clientes. Paralelamente, contribuem para os resultados da Empresa, o desenvolvimento de actividades de serviço a terceiros, através da intervenção nos negócios de Manutenção e de Handling e, ainda, a participação em actividades complementares, visando o controlo da “cadeia de serviço.”
Ver Relatório da TAP SA referente a 2001. O texto da estratégia parece óbvio, mas vale pela implementação que a estratégia teve.

(9)Ver
- Dinheiro Vivo de 3 de Outubro de 2012. Ver

Público de 21 de Dezembro de 2012. Ver


(10)A evolução entre 2001/2014 do resultado líquido anual da TAP SA mostra a demagogia de argumentos como
-afirmar que desde 2009 a TAP SA dá lucro, omitindo que em 2008 o resultado líquido é de €-209 milhões e que o acumulado entre 2001/2014 é de €-47.5 milhões.


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