Indicadores da performance de companhias aéreas e más práticas da TAP

Em Portugal somos levados a pensar que nas companhias aéreas não há indicadores  de performance para além do número de passageiros. No presente post

-apresentamos estes indicadores de maneira acessível e que minimize o impacte inicial de iniciais algo estranhas,

-damos exemplo de boas práticas de informação mensal, semestre e anual por várias companhias aéreas.

Depois, mostramos como a TAP não implementa nenhuma destas boas práticas e, no caso do relatório anual, até piora. Contribuímos para a resposta que a empresa tem de dar a duas perguntas:

-qual é a justificação deste secretismo em empresa onde o Estado detém 50% do capital e qual a explicação para tratar os portugueses como atrasados mentais?

-quando começa a TAP a divulgar resultados anuais, semestrais e mensais equivalentes aos que aqui damos como exemplo?

A TAP só ganha em implementar as boas práticas que aqui propomos e que accionistas e gestores privados conhecem melhor do que nós.


a)Apresentação dos principais indicadores

Para facilitar, seguimos a informação da figura 1 que ilustra, para o ano 2016, a “financial performance at airline level” das companhias que integram o International Airlines Group (IAG).

Figura 1 – IAG 2016 - Financial performance at airline level


*Aer Lingus lease adjusted margin includes an adjustment for the ownership element of wet leases. Fonte: IAG results presentation, Quarter Four 2016, 24thFebruary 2017 slide 14.

*Receitas e custos operacionais, resultado e margem operacional
Assumimos ‘Operating result’ ser o EBIT - Earnings Before Interest and Taxes (Resultados Antes de Juros e Impostos) e a partir daqui temos o Revenue e Cost. Isto assente, o que segue é óbvio:

-operating result é receita operacional menos despesa operacional,

-operating margin é o operating result em percentagem da receita operacional,

-lease adjusted margin não tem em conta os custos de leasing e é superior à operating margin.

*ASK, RPK e Load factor
A avaliação e comparação de companhias aéreas parte da unidade de criação de valor: ‘Seat/Kilometer’ – um lugar que se desloca um quilómetro. Na hotelaria é uma noite num quarto de hotel. Assim temos

-Available Seat/Kilometer – um avião de 150 lugares num voo de 1.000km representa oferta de 150.000 ASK,

-Revenue Passenger/Kilometer – no mesmo avião só voam 120 passageiros pagantes (que geram ‘revenue’) e temos 120.000 RPK,

-Load factor é a percentagem de RPK no ASK, o equivalente da taxa de ocupação da hotelaria.

A figura 1 não indica o Load factor, mas … é só fazer as contas.

*Segment length
Segment é a distância percorrida por um avião entre levantar voo e pousar. O valor médio do Segment é influenciado pela importância da actividade de longo curso. Assim o segment médio é

-mais baixo na Vueling que é LCC do ponto-a-ponto intra-europeu,

-superior no caso da AerLingus porque a empresa combina actividade de FSC no longo-curso a partir do hub de Dublin (para América do Norte) e actividade intra-europeia de LCC,

-maior no caso da BA e Ibéria, dado o peso da actividade de longo-curso destas companhias.

As companhias aéreas contam passageiros embarcados. Um voo entre Europa e Brasil pelo hub da TAP representa dois passageiros TAP à ida (embarque na Europa e em Lisboa) e dois à volta (embarque no Brasil e em Lisboa), quatro no total. Um portuense que visita Lisboa e regressa representa dois passageiros.

*RASK e CASK
Os conceitos são evidentes:

-Revenue per Available Seat/Kilometer (RASK) é o Revenue (receita operacional) dividido pelo ASK – na hotelaria é Revenue per Available Room Available,

-Cost per Available Seat/Kilometer (CASK), também designado por Unit Cost, é o Cost (custo operacional) dividido pelo ASK,

-CASK ex fuel – neste caso o Cost (custo operacional) não tem em conta o custo do fuel,

-Employee per ASK resulta da divisão do custo de pessoal pelo ASK e ajuda a gerir o custo com o pessoal.

Duas notas,

-controlar e reduzir o CASK é obrigação (e não opção) estratégica na gestão de uma companhia aérea,

-CASK ex fuel evita que gestão, accionistas, trabalhadores e público em geral se iludam com uma baixa do CASK que assenta apenas ou em grande parte na baixa do fuel.


b)Boas práticas

*Informação mensal em indicadores operacionais  - boas práticas
Utilizamos a apresentação mensal dos resultados do Lufthansa Group como padrão. Ver a informação referente a Outubro 2017 em investor-relations. As figuras 2 e 3 são recortadas a partir desta informação.

Os valores do Lufthansa Group são detalhados por

-cada uma das Network Airlines (Lufthansa German Airlines, SWISS e Austrian Airlines) e total destas,

-Point-to-Point Airlines (Eurowings e Brussels Airlines),

-o total das Network Airlines é detalhado por Europa, América (Norte e Sul), Asia/Pacífico e Médio Oriente/Africa.

-no caso das Point-to-Point Airlines, há detalhe por short-haul e long-haul.

Figura 2 – Lufthansa Group Network Airlines October 2017

Fonte: Figura recortada a partir da informação mensal.

Figura 3 – Lufthansa Point-to-Point Airlines October 2017

Fonte: Figura recortada a partir da informação mensal.

A inclusão da Brussels Airlines nas Point-to-Point Airlines é explicada em post futuro sobre o Lufthansa Group.

*Informação semestral e anual – boas práticas
No actual estado de falta de informação sobre a actividade da TAP, não nos parece necessário apresentar informação por trimestre, mas todas as companhias cotadas em bolsa o fazem. Também não apresentamos as apresentações que companhias cotadas fazem em Investors days & similares.

No que toca a informação semestral e a título de exemplo, o leitor pode ceder à corporate information da Easyjet e consultar apresentações sobre 1º semestre 2017 e ano 2017 (exercício a 30 Setembro 2017):

-2017 half year results analyst presentation em 16 Maio 2017

-2017 full year results analyst presentation em 21 Novembro 2017 

A full year results analyst presentation é complemento aos relatórios anuais.

Ver toda a informação em http://corporate.easyjet.com/


c)Informação Semestre e Ano – más práticas da TAP

*Resultados semestrais – como empresa cotada em bolsa
No actual estado de falta de informação sobre a actividade da TAP, não nos parece necessário apresentar informação por trimestre.

Já a informação semestral e anual sobre a TAP deve ser obrigatória e, no mínimo, equivalente à que as empresas cotadas em bolsa divulgam.

Os portugueses não merecem menos consideração pela TAP do que as empresas cotadas têm pelos seus accionitas e publico em geral.

*Informação anual da TAP – de mau a pior
No caso da informação anual sobre a TAP, passámos de mau a pior

A figura 4 dá uma ideia do desastre que é a informação empresarial (corporate information) da TAP, que

-não publica resultas mensais profissionais, como os do Lufthansa Group, e inunda-nos de informação parcelar, que nada permite avaliar e sempre positiva,

-não publica informação semestral,

-em 2016, diminui a informação anual como a figura 4 ilustra.

Figura 4 – Relatórios anuais do Grupo TAP em 2016 e antes de 2016




*A inaceitável cena dos resultados do primeiro semestre 2017
Em Outubro 2017 há grande reboliço comunicacional sobre a triste cena dos €444milhões de prejuízo no primeiro semestre de 2017, referidos no Relatório Semestral da Parpublica – reconhecemos não ter encontrado esta informação mas por erro nosso.

Segundo o Público ‘fonte oficial da TAP’ afirma o agravamento ser “absolutamente imaterial na proporção dos valores movimentados pelo grupo”. 

Em simultâneo, a mesma fonte diz que os indicadores operacionais e financeiros “têm sido até à data bastante favoráveis”, e que “o facto de os resultados do primeiro semestre se encontrarem em linha com os do ano passado é particularmente encorajador para a expectativa de resultados do ano, atendendo ao previsto para o semestre”.

O pior vem depois. Ainda segundo o Publico,
-“Questionada pelo PÚBLICO sobre os resultados operacionais e explicação para os prejuízos (a informação não consta do relatório da Parpública), a TAP não respondeu.” (1).

d)Companhias aéreas - segmentar para analisar

*Comparar/segmentar empresas “unit cost and average sector length
Para comparar e segmentar as indústrias europeias do transporte aéreo seguimos o padrão de análise mais corrente, ilustrado aqui pela figura 5. O CASK é no eixo vertical e average sector length no horizontal. Os números são de cerca de 2012 e devem ser lidos com prudência

A título de exemplo, uma primeira observação mostra:

-as LCC com CASK e average sector length baixos e as FSC com CASK e average sector length elevados.

-os custos unitários da Germanwings que explicam o não ter sido a LCC do Lufthansa Group e da air berlin, que explicam em parte a insolvência,

-os ultrabaixos custos unitários de Ryanair e WIZZ Air, mesmo em relação às outras LCC.

A TAP apresenta custos unitários abaixo de outras FSC mas muito acima das LCC com as quais concorre em muitas das rotas intra-europeias.

Figura 5 – Unit costs and average sector length for selected European legacy and low-cost carriers 2012*


Fonte: CAPA analysis of company accounts and traffic data, CAPA, Germanwings: can a premium strategy sustain an LCC? Lufthansa would like to think so, Outubro 2013.


A Bem da Nação

Lisboa 16 Janeiro 2018

Sérgio Palma Brito


Se acede ao blogue pela primeira vez, sugerimos que percorra os Princípios Gerais do Blogue a Nota Biográfica em http://sergiopalmabrito.blogspot.pt/p/apresentacao.html


Nota

(1)2017.10.03 Publico, TAP regista prejuízo de 52 milhões no primeiro semestre  - Valor representa um ligeiro agravamento de 3,2% face a idêntico período de 2016, com os proveitos a subirem 11,3% para 1254 milhões.