Porque razão faz sentido o Grupo Lufthansa adquirir a TAP e quais as implicações para a TAP?

 

Apresentamos factos com indicação de fonte e limitamos o comentário ao mínimo, mas temos opinião.

A possível integração da TAP no Grupo Lufthansa

-exige que a Deutsche Lufthansa AG, cotada na bolsa de Francoforte, detenha uma maioria qualificada do capital da TAP,

-implica reestruturação a sério da TAP, nomeadamente mas não só, alteração profunda do Acordo de Empresa, com quase certo conflito laboral intenso,

-salva a TAP da insolvência a que está destinada se continuar a ser companhia ‘independente’, no sentido de não integrada no seio de um dos três Grupos da consolidação de Full Service Carriers na Europa,

-é benéfica para o País.

 

1.Contexto competitivo na Europa

Na Europa há três grandes grupos da consolidação de Full Service Carriers

-International Airlines Group (British Airways, Iberia, Vueling, AerLingus e Air Europa pendente).

-Lufthansa Group (Lufthansa German Airlines), SWISS, Austrian Airlines, Brussels Airlines e Euro Wings) – a seguir também referido como Grupo,

-Groupe Air France/KLM.

IAG e Lufthansa Group são os grupos mais importantes, dinâmicos e competitivos. No caso da TAP é isto que está em causa.

 

2.Qual a razão do Grupo Lufthansa querer adquirir a TAP?

*Efeito da aquisição da Air Europa pelo IAG – novembro 2019

No início de novembro de 2019, o IAG anuncia a aquisição da Air Europa, uma companhia privada espanhola com forte ligação à América Latina.

Esta aquisição insere-se na estratégia do IAG fazer de Madrid um hub capaz de rivalizar com Londres, Paris, Amesterdão e Frankfurt (ver Fonte da Figura 1 e IAG – Annual Report and Accounts 2020, p. 6)

A figura 1 ilustra a parte de mercado dos três grupos mais LATAM e TAP nas rotas entre Europa e América Latina. Constatamos:

-o Grupo Lufthansa com parte de mercado inferior às dos concorrentes, e ainda menor após a aquisição da Air Europa pelo IAG,

-o contributo que a aquisição da TAP pelo Grupo para a atual parte de mercado.

Por esta altura David Neeleman procura comprador para a sua posição no Consórcio a que se poderia associar Humberto Pedrosa.

Pelo que consta, o Grupo Lufthansa manifesta interesse e está então disposto a pagar um preço de oportunidade para vir a adquirir a TAP.

Figura 1 – Mercado Europa-América Latina


 Fonte: https://www.ft.com/content/6c28f107-8156-4a97-a2ba-2662104f6871 Financial Times cuja assinatura recomendamos.

*Efeito da aquisição da Air Europa pelo IAG na atualidade

Entre o final de 2019 e o de 2021, este contexto evoluiu:

-perante o investimento que a Air Europa exige e a alternativa do IAG começar de novo, mais as exigências da Comissão Europeia em defesa da concorrência no aeroporto de Madrid, o IAG desistiu da aquisição,

-o custo de oportunidade para o Grupo Lufthansa é menor, mas a TAP capitalizada e com redução de custos é mais interessante do que a de 2019.

Há aqui duas questões cuja resposta não pode ser ignorada:

-o mercado da TAP é o Brasil e não a América Latina, vai o Grupo expandir as rotas da TAP?

-o hub Lisboa no Europa/América do Norte interessa ou não ao Grupo para vender destinos a oeste de Francoforte?

*América Latina – continente ausente na estratégia global do Grupo

A figura 2 mostra como a América Latina não conta para o recuperar do longo curso do Grupo no após Pandemia

Figura 2 – Rede Global do Grupo Lufthansa e recuperação do tráfego longo-curso

 

Fonte: Luftahnsa Group, Accelerating our Transformation, apresentação em junho de 2021, slide 13.

*América Latina – continente ausente na recuperação do Grupo

A figura 3 mostra como só a Asia conta para a recuperação futura do tráfego inter-continental do Grupo. A América Latina não é refrida.

Figura 3 – Ausência da América Latina na recuperação do tráfego intercontinental do Grupo

 

Fonte: Luftahnsa Group, Accelerating our Transformation, apresentação em junho de 2021, slide 12.

 

*Em síntese

-o hub de Lisboa e TAP podem responder a estes pontos fracos do Grupo Lufthansa?

-o Grupo está mesmo interessado pela TAP ou as noticias na comunicação social não têm fundamento?

-está o governo consciente da perda de influência politica sobre a TAP se esta for integrada no Grupo?

 

3.Como pode o hub de Lisboa integrar-se no Grupo

*Parece interessante adicionar o hub de Lisboa aos do Grupo

A figura 4 ilustra como a estratégia multi-hub do Grupo responde à procura do seu mercado doméstico.

Figura 4 – Lisboa na rede de hubs do Grupo Lufthansa

 


Fonte: Luftahnsa Group, Accelerating our Transformation, apresentação em junho de 2021, slide 11.

A procura pelo hub de Lisboa é apoiada por mercado doméstico com muito menor poder de compra, mas justifica-se pela capacidade de atrair tráfego intercontinental.

 

4.Como pode a TAP integrar-se no Grupo Lufthansa

Nota - A recente proposta da Lufthansa e MSC adquirirem cerca de 85% da ITA é um precedente que abre uma hipótese de o acordo entre o Estado Português e a Lufthansa não seguir o modelo que descrevemos aqui (editado em 2022.02.03).

*Transformação em curso da estrutura do Grupo Lufthansa

A figura 5 ilustra a evolução da estrutura do Grupo Lufthansa para estrutura mais ligeira e flexível que tem sido vantagem competitiva do IAG.

Nesta nova estrutura

-a Lufthansa German Airlines passa a estar ao mesmo nível operacional das outras companhias do Grupo,

-uma organização em matriz nas áreas funcionais maximiza as sinergias geradas pelas companhias operacionais,

-a parte operacional e de Ganhos & Perdas está nas companhias operacionais,

-a Gestão do Grupo está acima e focada na estratégia, alocação de capital às companhias operacionais e gerar melhoria na remuneração do capital.

Figura 5 – Desenvolvimento da organização do Grupo

 


Fonte: Luftahnsa Group, Accelerating our Transformation, apresentação em junho de 2021, slide 21.

 

*A TAP é obrigada a acompanhar a margem operacional do Grupo

A figura 6 ilustra a evolução da margem operacional dos três grupos e compra com uma margem operacional da TAP que foi de -0,8% em 2018 e 1,4% em 2019.

Daqui resulta

-grande pressão do Grupo para a TAP aumentar a sua margem operacional de modo a não enfraquecer a do Grupo, sujeito a controle rigoroso por acionistas exigentes,

-problemas com a inevitável revisão do Acordo de Empresa, como nunca houve na TAP.

Figura 6 – Evolução da margem operacional dos três grupos

 


Fonte: https://www.ft.com/content/6c28f107-8156-4a97-a2ba-2662104f6871 Financial Times cuja assinatura recomendamos.

*A remuneração do capital investido na TAP

Nos primeiros anos da gestão de Fernando Pinto (2001 e seguintes) o Relatório Anual da TAP (ainda não havia Grupo TAP) mencionavam a obrigação remunerar o capital investido pelo Estado. Esta menção levou sumiço rapidamente e até hoje.

Ignoramos o que a Decisão da Comissão (ainda não divulgada!!!) exige a este propósito, mas sabemos que o Grupo fará esta exigência à TAP.

A figura 6 mostra como as companhias europeias só remuneram o capital a partir de 2015.

É mais uma fonte de pressão sobre a gestão da TAP integrada no Grupo.

Figura 6 – Evolução da rentabilidade das companhias aéreas

 


*A sonhada injeção de capital na TAP ou não há almoços grátis

A tão sonhada injeção de capital do Grupo Lufthansa na TAP implicará a curto ou médio prazo:

-a TAP/Portugal passar a ser mais uma companhia operacional do Grupo,

-poder do Grupo para definir estratégia, aumentar capital e melhorar a remuneração do capital, esta remuneração sendo até agora terreno virgem para a TAP.

O montante que o Grupo paga pelas ações que o governo português detém na TAP

-é pago em cash, em ações da Deutsche Lufthansa AG ou numa combinação dos dois?

*Nota sobre a organização em matriz do reestruturado Grupo  (texto editado em 28 de janeiro 11:35)

Desconhecemos com o modelo de matriz será implementado no Grupo.
Com base na ideia que temos deste modelo, de alguns anos a dirigir uma companhia operacional de multinacional a funcionar em Matriz e consselho de amigo que trabalha com este modelo, posso dar exemplos do que, muito provavelmente, virá a acontecer.
O presidente da TAP companhia operacional faria parte do group management da Lufthansa, com report directo ao CEO do grupo.
Em Portugal teria uma posição mais de General Manager da companhia, com uma postura muito mais operativa do que a atual estrutura de corporate governance da TAP SA.
Caber-lhe-ia
-a implementação de procedimentos e métodos de trabalho do grupo Lufthansa na TAP companhia operacional.,
-‘entregar’ à Deutsche Lufthansa AG os Profits & Losses (EBIDTAR) da companhia portuguesa,
O atual Chief Financial Officer da TAP SA
-passaria a Controller da TAP companhia operacional com report ao CFO do grupo,
-ao nível local e interno da TAP companhia operativa teria responsabilidades de direção financeira, uma vez que incluiria funções específicas do país como impostos, report financeiro e regulamentações locais etc
O mesmo acontecerá com marketing e vendas, recursos humanos etc


Lisboa 27 de janeiro de 2022

Sérgio Palma Brito

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