Nota pontual sobre apoio do Turismo de Portugal a rotas aéreas

O título do Publico é bombástico: “Turismo de Portugal já apoiou novas rotas com oito milhões de euros” (1). Na verdade, são €8 milhões em cinco anos, o que dará €1.6 milhões por ano. Este é um de entre vários temas do turismo em Portugal que deve ser analisado numa perspectiva que vai para além da política de turismo tal como a conhecemos e acima da guerrilha politica em cu ou de protagonismos estéreis.

*Capacidade do destino atrair turistas e apoio público 

A tradição de dar subsídios contribui para esquecermos dois factos:

-a capacidade de atracção do destino turístico é o factor decisivo para que turistas o desejem visitar e comprem uma estadia à distribuição – o transporte aéreo é parte integrante da estadia desejada.

-a prioridade das instituições públicas é contribuir para que o destino reforce a sua capacidade de atracção – em condições normais, o mercado faz o resto,

A recente operação da Ryanair em Lisboa ilustra esta realidade:

-em 2014, sem qualquer apoio público e apenas no âmbito do marketing aeroportuário da ANA, a Ryanair começa a operar para Lisboa e atinge 2.6 milhões de passageiros em 2016.

Se Porto e Faro são destinos que ainda carecem de apoio público para atrair turistas,

-o apoio não pode ser uma droga que cria dependência e tem rendimento decrescente, mas sim instrumento para suprir disfunção temporária na capacidade de atrair turistas por estes destinos.

Captar companhias aéreas o Terminal Montijo ilustra realidade nova:

-Lisboa, Porto e Faro dependem de companhias low cost para crescer, mas estas também precisam de voar para Porto e Faro para atingir os objectivos que se fixam em mercado cada vez mais competitivo.

Em qualquer dos casos, o apoio público a companhias aéreas em Porto e Faro deve ser dado

-no âmbito de incentivos ao crescimento do tráfego com objectivos plurianuais e não em apoio a fundo perdido a criação/reforço de rotas,

-e avaliação profissional do grau de dependência das companhias aéreas em relação a Porto e Faro.

*Turismo transporte aéreo e distribuição

A negociação de rotas aéreas é função do marketing aeroportuário da empresa concessionária da exploração dos aeroportos, porque é quem tem profissionais, informação e instrumentos para lidar com grandes companhias aéreas contractos de milhões de passageiros por ano.

Nesta negociação, a ANA trabalha em rede com Turismo de Portugal e ambos com a Iniciativa Privada da oferta e distribuição para

-apoiar criação ou reforço de rotas com programas de marketing & vendas em ligação com a distribuição na área de influência do aeroporto de partida,

-nas áreas de influência dos aeroportos de partida (macro segmentação geográfica).ter o marketing & vendas apoiado pelo branding do destino, em função do que o mercado exija e possa remunerar.

É responsabilidade do Turismo de Portugal dispor de recursos humanos profissionais que, em concertação estratégica e contratualização operacional com Iniciativa Privada e destinos regionais,

*Flexibilidade gestão de rotas de companhias low cost

De entre características estruturantes das companhias low cost destacamos duas que nos interessam directamente:

-rede pan-europeia de bases operacionais e flexibilidade na gestão das rotas, em função de avaliação de riscos e resultados.

O gráfico 1 ilustra o número de rotas criadas por companhias aéreas na Europa em 2015 e 2016. No caso de Ryanair e Easyjet, o número de rotas suprimidas não é explicitado mas é importante.

Destacamos os números em causa e a sua correlação com o dinamismo das companhias low cost já referido em outros posts:

-Ryanair em 2016, o que está na base do crescimento esperado de 11.8 milhões de passageiros a 31 de Março de 2017,

-em 2016, Transavia tem aumento atípico de passageiros,

-Jet2.com salta dos aeroportos do centro de Inglaterra e instala base em Stanstead, covil da Ryanair,

-crescimento da WIZZ e alguma calma na Vueling que não evita os problemas do Verão de 2016,

-expansão da Jet2.com que deixa de operar apenas no centro de Inglaterra e instala base em Stanstead, base forte da Ryanair e presença significativa da Easyjet.

Gráfico 1 – Rotas criadas por companhias aéreas 2015-2016 (unidades)


Fonte: Elaboração própria com base em anna.aero – ver Nota (2)

*Apoio a criação/reforço de rotas pelo Turismo de Portugal

Se bem percebemos, o Turismo de Portugal opera um programa de apoio a rotas de companhias aéreas low cost e full service. No item anterior mostramos os motivos que devem levar o TdeP a deixar de apoiar rotas intra-europeias de companhias low cost.

Dada a escala da operação e o valor do subsidio, não faz sentido que o TdeP subsidie criação de rotas por companhias full service, como a da TAP para Moscovo e da Emirates para o Dubai (3). O projecto da HNA pode justificar programa de incentivo mas não subsídio a fundo perdido.

Em nossa opinião, o Turismo de Portugal, desperdiça recursos quando subsidia a fundo perdido rotas, de companhias low cost ou outras, em contante variação.

*Cinco perguntas sem resposta

Por fim, o artigo do Publico suscita perguntas importantes sobre o apoio a rotas aéreas pelo Turismo de Portugal:

-os €8 milhões apenas apoiam rotas aéreas ou apoiam também os incentivos concedidos a companhias aéreas em função de objectivos de tráfego,

-se são só para apoiar rotas, qual o montante para financiar os incentivos,

-estes €8 milhões são o total dos fundos públicos a apoiar rotas e ou incentivos ou há ainda verba equivalente das Agências Regionais de Promoção Turística?

-qual a participação da ANA no apoio a rotas e ou incentivos e qual é o trabalho em rede entre ANA, Turismo de Portugal e Iniciativa Privada?

-no caso em apreço do apoio a rotas aéreas, como são fixados objectivos, como é verificado se são atingidos e como é avaliado o programa no seu conjunto?

Defendemos desde há largos anos que

-deve haver maior difusão da informação, de modo a podermos avaliar programas de acção e desempenho das equipas,

-por princípio e salvo raras excepções, todos os subsídios e ajudas públicas, directas ou indirectas, devem ser publicitadas em portal especializado.


A Bem da Nação

Lisboa 6 de Março de 2017

Sérgio Palma Brito


Anexo – Arqueologia do actual sistema de incentivos/rotas

O pioneirismo é da ANA. Entre 2003 um relatório interno à ANA informa sobre a importância e potencial das LCC. Em 2003, é organizado o Marketing Aviação na ANA que, está na base de “um sistema de apoios de Marketing que pretende apoiar as companhias aéreas no lançamento de novas rotas e no reforço das ligações já existentes.” (4).

Em 2004, há um acordo com a Ryanair no Porto e no final do ano são “preparados novos modelos de sistemas de incentivos para os Aeroportos de Lisboa e Faro”. Em 2005, a EasyJet opera em Lisboa, Porto e Faro.

Em 2005, Instituto de Turismo de Portugal e a ANA concebem o Fundo de Desenvolvimento de Rotas.

Em 2007, “Fruto da consolidação da parceria denominada IDRAIT (Iniciativa de Desenvolvimento de Rotas Aéreas de Interesse Turístico) entre o Grupo ANA e o Instituto de Turismo de Portugal (ITP), alcançámos resultados que nos estimulam […].”.

Em 2008, na mensagem do Presidente da ANA, “Uma nota também para o programa Iniciative.pt, exemplo da bem-sucedida parceria com o Turismo de Portugal e com as Associações Regionais de promoção turística para o desenvolvimento de rotas e para a promoção dos nossos destinos turísticos nos mercados internacionais.”.

No virar de 2008/2009, o Governo decide implementar um conjunto de medidas extraordinárias para minimizar efeitos da Crise de 2008/2009. Duas destas medidas são a Captação e desenvolvimento de rotas aéreas e Acções de Promoção Externa. Estas medidas são paralelas ao Initiative.pt.

A instalação/expansão de companhias low cost em Portugal foram apoiadas por contractos de incentivos que se revelaram muito positivos. Em 1 Março 2012, o programa Initiative.PT 2.0 é apresentado na BTL:

-“São 15 milhões de euros para três anos de contratação, cujo protocolo é estendido para os sete anos no que respeita a vigência para acompanhamento das rotas. Deste valor, 50% advém dos cofres do Turismo, sendo 60% do Turismo de Portugal e 40% das Regiões de Turismo; e 50% dos aeroportos. São estes os números da nova versão do Iniciativa.pt 2.0, que tem em vista apoiar 50 rotas aéreas, das quais metade no âmbito da criação e o restante no aumento de capacidade em linhas já existentes. No final deste período é esperado um apoio a mais 1,5 milhões de passageiros desembarcados nos aeroportos portugueses.” (5).

Em Agosto de 2012, o Turismo de Portugal é autorizado a assumir “encargos decorrentes do protocolo a celebrar com a ANA-Aeroportos de Portugal SA e ANAM-Aeroportos e Navegação Aérea da Madeira até ao montante máximo de €4.5 milhões” (6). Esta verba é repartida entre 2013 (€ 1.5 milhões) e 2018 (€250 mil).

Qual apoio público? As verbas afectas a contractos de incentivos e as afectas a subsídios a rotas não são devidamente descriminadas e apoios públicos a companhias aéreas devem ser divulgados por sistema user friendly.

Notas

(1)Ver 2017.03.04 Publico, Turismo de Portugal já apoiou novas rotas com oito milhões de euros


(3)No final de 2008, no Congresso da APAVT em Macau um administrador da TAP provocou risada ao falar sobre ter recebido um sunsidio por criar uma rota.

(4)Informação e citações têm como fonte os relatórios anuais da ANA.

(5)2012.03.01 Publituris


(6)Turismo de Portugal, IP, Despacho nº 11207/2012, Diário da Republica 2ª série, nº 159 de 17 Agosto 2012. 

Companhias low cost no sucesso do Terminal Montijo

Neste post e com os parcos meios de que dispomos, mostramos o possível interesse das companhias low cost em operar no Terminal Montijo. Em Nota Final estimamos a quota de mercado de companhias no aeroporto Humberto Delgado que podem passar a operar no Terminal Montijo.

Consideramos três grupos de companhias aéreas:

-as ‘cinco grandes LCC’: Ryanair, Easyjet, Norwegian, Vueling e WIZZ,

-Transavia, do Air France/KLM Group e Eurowings do Lufthansa Group,

-três companhias aéreas atípicas: Aigle Azur, Monarch e Jet2.com.

Destacamos quatro pontos:

-salvo muito poucas excepções, LCC operam rotas intra-europeias ponto a ponto, nas quais o baixo preço ainda é factor competitivo decisivo,

-esta característica e possibilidade de crescer em horas de ponta ocupadas na Portela, fazem do Terminal Montijo escolha óbvia para operar em Lisboa,

-contrariamente a ideia corrente de comentadores que falam de maneira assertiva sobre assuntos que desconhecem, governo ou ANA não podem obrigar companhias aéreas a operar no Terminal Montijo, porque estariam a violar grosseiramente disposições europeias sobre concorrência,

-ainda menos podem sequer imaginar fazê-lo para “proteger a TAP da concorrência das low cost”, como tantas vezes ouvimos a comentadores ditos de referência.

O leitor mais curioso deve percorrer o nosso Relatório sobre Turismo e Transporte Aéreo em Portugal (aqui) e, em especial o Volume II – Indústrias europeias do transporte aéreo (aqui).

Este post deve ser lido em conjunto com

-Turismo, TAP e companhias low cost no(s) aeroporto(s) de Lisboa, de 5 Dezembro 2016, no qual antecipamos o tema dos posts de hoje (aqui),

-Terminal Montijo na expansão do aeroporto de Lisboa – adenda (aqui), publicado hoje.

-Terminal Montijo dependente de companhias low cost – seis erros

-Companhias low cost no sucesso do Terminal Montijo


1.Introdução às companhias low cost no Terminal Montijo

*Companhias low cost quer mesmo dizer low costs na operação

A figura 1 ilustra custos unitários de seis companhias low cost e três full service. Os custos unitários da SAS são

-superiores em 162% aos de Ryanair e WIZZ, 85% aos da Norwegian, 49% aos da Vueling e 38% aos da Easyjet,

-inferiores em 7% aos da Eurowings, prova evidente dos problemas que o Lufthansa Group enfrenta na sua companhia low cost.

Figura 1 – Unit cost comparison based on the latest full-year results


Fonte: Elaboração própria com base em Norwegian Air Shuttle ASA. Q4 2016 Presentation, 16 February 2017, slide 14 – ver Nota (1).

Os valores são em coroas norueguesas, mas o importante é comparar:

-as cinco companhias de custos mais baixos são as mais importantes e têm todas génese entrepreneurial [mesmo a Vueling, integrada em 2013 no IAG],

-a Eurowings é a companhia low cost do Lufthansa Group e a Transavia do Air France/KLM Group nem sequer figura na comparação (ver figura 2).

*As ‘cinco grandes companhias low cost’ em 2016

O gráfico 1 ilustra número de passageiros das ‘cinco grandes companhias low cost’ e dá uma ideia dos parceiros com os quais a ANA negoceia.

Gráfico 1 – Passageiros de cinco LCC mais Transavia e Eurowings 2016 (milhões)


Notas: Ryanair: prevsão a 31 Março 2017, Easyjet a 30 Setembro 2016, Vueling estimativa mercado a partir de 2014 Fonte: Elaboração própria com base em informação corporativa das companhias

*LCC dos três grandes grupos de FSC

Figura 2 – Top seven European airline groups and their subsidiary airlines by passenger 
numbers: calendar 2016


*Indicates CAPA estimate; passenger numbers not yet reported.  
**Figures for 12 months to Sep-2016.  
Source: CAPA - Centre for Aviation, airline company traffic reports 17-Jan-2017. Ryanair's 117million pax in 2016 tops European airline groups. The first time an LCC topped rankings

A figura 2 ilustra o número de passageiros no ano calendário de 2016 entre Ryanair, Easyjet e as companhias aéreas dos três grupos consolidados: Lufthansa Group, International Airlines Group e Air France/KLM Group – nesta comparação ignoramos Turkish Airlines e Aeroflot. Destacamos:

-o número de passageiros das três compamhias low cost é reduzido, com destaque para a Vueling que é o mais elevado.

Dito isto, a análise CAPA mostra que

-num tempo em que o número de passageiros das Full Services Carriers estabiliza, em 2016 o da Eurowings cresce 8.8%, o da Vueling 9% e o da Transavia 2.7% (2).

*Mercado e pressão competitiva das companhias low cost

O posicionamento do Terminal Montijo no mercado das companhias low cost deve ter em consideração duas realidades:

-as companhias low cost continuam a concorrer com as de full service nas rotas intra-europeias, mas este ganho de quota de mercado está na fase de rendimento decrescente,

-a concorrência é cada vez mais entre companhias low cost, em bases e pares de rotas.


2.Breve análise por companhia aérea low cost

*Ryanair obrigada a crescer e importância de Portugal

O gráfico 2 ilustra a evolução do número de passageiros da Ryanair (3). O valor a 31 Março 2017 é previsão, mas representa um crescimento de 12.1 milhões em relação a 31 Março 2016. Para termo de comparação, em 2016 a TAP transporta 11.3 milhões de passageiros, menos 800k do que o crescimento da Ryanair. A partir do ano que termina a 31 de Março de 2015 (inclui o Verão IATA do ano anterior), a Ryanair passa a novo ritmo de crescimento e a base de Lisboa é parte desta dinâmica. 

O exercício da Ryanair a 31 de Março de 2016 confirma o sucesso da reconversão estratégica que a empresa inicia em 2013, e que o exercício de 2017 vai reconfirmar. Há uma revolução no custommer service, no sacrossanto respeito pelos custos unitários mais baixos da Europa e em “levels of profitability not seen for a decade”.

A partir de 2013, a Ryanair faz três previsões de tráfego de ambição crescente. Em Novembro de 2016, faz quarta previsão (gráfico 3). Estas previsões geram enorme pressão de accionistas e mercado sobre a gestão da empresa que é obrigada a atingir estes objectivos.

Gráfico 2 – Passageiros Ryanair milhões


Fonte: Elaboração própria com base em Ryanair, informação corporativa, valores a 31 de Março do ano indicado que incluem o Verão IATA do ano anterior

Gráfico 3 – Previsões de tráfego da Ryanair no horizonte 2024
(milhões passageiros)


Fonte: Elaboração própria com base em Ryanair Holdings plc, Annual Reports e informação corporativa

Estimamos que em 2016, o tráfego da Ryanair no total de Lisboa, Porto e Faro represente cerca 4% no tráfego da Ryanair, valor importante e que tende a crescer – não esquecer que aeroportos contam passageiros embarcados e desembarcados e companhias aéreas contam apenas passageiros embarcados.
Importante é a Ryanair precisar de crescer em Lisboa, onde em 2014 instala uma base sem qualquer incentivo público. Assim,

-em 2016, a quota da Ryanair em Lisboa é ligeiramente superior a 11% e não 27% ou 41% como afirma o Publico (com dois erros grosseiros e sem sabermos em que ficamos),

-estimamos que, quando o Terminal Montijo abra, a quota da Ryanair em Lisboa possa crescer até 15% e ser de facto decisiva para o sucesso do Terminal Montijo.

Segundo a notícia do Publico sobre o relatório ANAC/Roland Berger,

-“Já a Ryanair revelou ser a companhia de referência que assume o motor de desenvolvimento dos aeroportos secundários, e é neste ponto do relatório que surge o alerta que sublinha «ser essencial evitar uma dependência excessiva»”.

A importância da Ryanair para Lisboa e de Lisboa para a Ryanair é exemplo máximo da “gestão da relação comercial conduzida em termos profissionais entre ANA e Ryanair” referida no post anterior.
Insistimos neste ponto por termos divergência estratégica com a ideia subjacente à palavra “dependência”.

*Easyjet

A Easyjet, em si e sobretudo na comparação com a Ryanair, é uma companhia pacata (gráfico 4). No exercício que termina a 30 Setembro 2016, o número de passageiros apenas cresce 6.6%, de 68.6 milhões para 73.1. Pacata, mas com excepções – em Lisboa e no mesmo período cresce na margem inferior a dois dígitos, mas a dois dígitos.

Gráfico 4 – Passageiros Easyjet


Fonte: Elaboração própria com base em Easyjet plc, Annual Reports

A figura 3 ilustra o crescimento da Ryanair entre  2016/21, com 3.2% em Portugal e Espanha.

Figura 3 – Strong underlying demand in our markets


*Passenger forecasting undertaken at city level and aggregated up to countries Fonte: Elaboração própria com base em Easyjet, FY 2016 Analyst & investor presentation, 15 November 2016, slide 15.

Figura 4 – Strong positions in slot constrained airports


Notas 1, 2, - ver Nota (7). Fonte: Elaboração própria com base em Easyjet,FY 2016 Analyst & investor presentation, 15 November 2016, slide 19. Ver Nota (4).

A figura 4 ilustra a “Strong positions in slot constrained airports” na “current morning peak utilization”. Esta politica da Easyjet pode levar a que não saia da Portela, ou que não saia logo ou que saia parcialmente.
Portugal não figura no slide 21 sobre “Investment in the network in 2017 to capture market opportunities”.Não é dramático mas não é bom sinal.

*Vueling

Gráfico 5 – Passageiros da Vueling milhões


Fonte: Elaboração própria com base em site da Vueling e informação do mercado

Como vimos, o CAPA estima que o número de passageiros da Vueling cresce 9% em 2016. A informação corporativa do IAG confirma a Vueling com crescimento de 11.2% em ASKs e de 13.2% em RPKs, e aumento do load fractor em 1.5%.

Em Lisboa, a Vueling está na fase de forte crescimento (uns muito bons dois dígitos) e tem potencial para crescer. A decisão entre Portela/Montijo vai depender de slots, pressão competitiva e exigência do serviço premium que a Vueling disponibiliza aos passageiros.

*WIZZ

Em Novembro 2016, o CAPA – Center for Aviation escolhe a WIZZ como ‘2016 Value Airline of the Year’ – é um galardão sério dado por instituição de referência no mundo do transporte aéreo. A WIZZ é leader de mercado na Hungria, Roménia e Macedónia e tem presença forte na Europa Central e de Leste, com destaque para Polónia, Bulgária, Lituânia e Letónia.

Com o tempo, a Europa Central e de Leste será sempre um mercado de crescimento para Lisboa. Neste mercado, a WIZZ será sempre um parceiro importante, provavelmente em concorrência com Ryanair.

Figura 5 – WIZZ Air base cities and destinations cities



Fonte: Elaboração própria com base em WIZZ Air Holdings plc, Annual Report and Accounts, 2016

Gráfico 6 – Passageiros WIZZ a 31 de Março (milhões)


Fonte: Elaboração própria com base em WIZZ Air Holdings plc, Annual Report and Accounts, 2016

Devemos reter o nome József Váradi, CEO da WIZZ, sem o charme do O’Leary mas que aprendeu rápido com a reconversão estratégica da Ryanair em 2013.

A WIZZ tem todas as características da companhia aérea que escolhe o Terminal Montijo para ter slots para crescer e taxas mais baixas.

*Norwegian

O gráfico 7 ilustra a evolução dos passageiros da Norwegian. Não podemos destrinçar os passageiros da actividade de Long Haul Low Cost Carrier.

Gráfico 7 – Passageiros da Norwegian milhões


Fonte: Elaboração própria com base em Norwegian Air Shuttle ASA e informação corporativa

No final de 2016, a Norwegian opera 471 rotas para 130 destinos e transporta 29.3 milhões de passageiros (gráfico 7). Tem bases na Noruega, outros países nórdicos, Espanha e Reino Unido – é uma verdadeira companhia aérea pan-europeia.

Em 2017 vai operar 50 rotas intercontinentais e espera te 32 Dreamliners até 2018. A rede intercontinental tem dominado a expansão mais recente da empresa e tem consequências: aumento da dívida com reflexo nos custos unitários e na estrutura financeira da empresa.

O crescimento do tráfego da Norwegian em Lisboa parte de base modesta. Tem potencial para crescer, mas terá de entrar na prioridade da empresa e surge quase como por analogia com Espanha, mas em condições diferentes. Em Espanha o acordo entre Norwegian e AENA também foi diversificação da AENA em relação a Ryanair e Easyjet.

*Eurowings

Em meados de 2014, a ‘nova Eurowings’ é criada com uma ambição: ser a “Lufthansa's answer to low-cost carriers such as Ryanair and EasyJet”. Pasará a ser a terceira na Europa e primeira em cada um dos mercados do Lufthansa Group (Alemanha, Suíça, Áustria e Bélgica) e ter custos idênticos aos da concorrência (leia-se Ryanair e Easyjet) “on same routes with the same aircraft types”.

A instalação da Eurowings ainda decorre e integra projectos empresariais ainda em curso, com parte da frota da Airberlin e da Brussels que entretanto é completamente integrada no Lufthansa Group.

Nesta fase não faz sentido apresentar números. Uma coisa é certa:

-a Eurowings está ‘condenada a crescer’ e uma cidade como Lisboa será importante para o seu crescimento, no Terminal Portela ou Terminal Montijo.

Em teoria, a companhia low cost do Lufthansa Group vai operar no Terminal Portela.

*Transavia

A companhia aérea Transavia compreende duas empresas integradas no Air France/KLM Group: Transavia Holland criada em 1966 e Transavia France, criada em 2007 já depois da fusão da Air France e KLM em 2003. Dada alguma indefinição estratégica do Air France/KLM Group sobre o projecto Transavia, apenas retemos o total de passageiros das duas companhias, apesar das diferenças que existem (gráfico 8).

Depois de anos de estagnação, em 2016, o número de passageiros da Transavia cresce 22.7% para 13 milhões. A Transavia está sob pressão accionista por acumular prejuízos e apenas prever lucro para 2017. No caso de Lisboa, o driver de crescimento é a Transavia France.

A influência dos pilotos da Air France sobre a gestão da companhia mãe confina a Transavia France a bases em França. Dada a pressão da procura por Portugal, o crescimento da Transavia em Lisboa é, sem exagero, crucial para a sua sobrevivência.

Gráfico 8 – Passageiros Transavia (milhões)


Fonte: Elaboração própria com base em AF/KLM Group, Registration Reports, Manuels de référence

*Nota sobre companhias de aparente menos importância

1.Aigle Azur. No início do século e depois de dezenas de anos com rotas para África, a Aigle Azur é relançada por Arezki Idjerouidène, entrepreneur Kabyle franco-argelino, que ganha posição nos voos da diáspora para a Argélia. A maior parte das rotas da Aigle Azur ligam cidades de França com cidades de diásporas em França (Lisboa, Algarve e Funchal são a excepção turística). Em 2012, a HNA adquire 48% do capital da Aigle Azur, mas a rota Paris/China não se concretiza. Em 2014 Arezki passa o negócio ao filho e vem viver para Portugal. Morre de cancro em Abril de 2016. Admitimos que a Aigle Azur se mantém como companhia independente, o que não é certo.

2.Monarch. No final de 2014 o Monarch Group passa por redefinição estratégica com a conversão da Monarch de Leisure Low Cost Company (LLCC) na Low Cost Carrier que na realidade já era. Admitimos que a Monarch se mantém como companhia independente, o que não é certo.

3.Jet2.com. Começa como companhia charter, cedo ligada ao operador Jet2 Holidays e a operar a partir do centro de Inglaterra. Depois passa avoar para cidades no Continente e entra em ambicioso plano de expansão. Um cínico diria que, com esta expansão, a Jet2.com ou vai a insolvência ou tem sucesso e voará para Lisboa.


3.Nota final

Arriscamos uma previsão de companhias aéreas no primeiro ano de operação do Terminal Montijo, com base em contas on the back of an envelope, mas que ajudam a compreender o que está em causa:

-Ryanair começa com 14% do tráfego do aeroporto Humberto Delgado, com tendência a crescer rapidamente para 18% - a sua opção pelo Terminal Montijo é decisiva,

-Easyjet mantém o tráfego no Terminal Portela, com 12% de quota do total, e assim diferencia-se da Ryanair,

-Transavia, se ainda operar, terá 4% do tráfego do aeroporto Humberto Delgado e avaliará o beneficio das taxas mais baixas com o ser menos competitiva em relação a TAP, mas optará pelo Terminal Montijo,

-Vueling poderá ter 5% do tráfego do aeroporto Humberto Delgado e avaliará o beneficio das taxas mais baixas com prejuízo no posicionamento premium, e deixa-nos na dúvida,

-Eurowings terá 4% e terá o mesmo raciocínio da Vueling e deixa-nos na dúvida,

-WIZZ terá 3% de quota do tráfego do aeroporto Humberto Delgado e opta pelo Terminal Montijo,

-idem para Norwegian, Aigle Azur, Monarch e Jet2.com, com 3% de quota do tráfego do aeroporto Humberto Delgado e todas a optar pelo Terminal Montijo.

Em conclusão, o Terminal Montijo terá

-24% do tráfego do aeroporto Humberto Delgado (Ryanair, Transavia, WIZ e Outras), dos quais 14% da Ryanair, e com Easyjet, Hueling e Eurowings a ficar no Terminal Portela,

-10%, sem a Ryanair.

Se considerarmos que o aeroporto Humberto Delgado terá tráfego de 28 milhões, um Terminal Montijo competitivo

-começa com 2.8 milhões ou 6.7 milhões, sem ou com Ryanair,

-tem margem para ganhar quota ao Terminal Portela.


A Bem da Nação

Lisboa 6 Março 2017

Sérgio Palma Brito


Notas

(1) Sources: Based on official full-year 2015 annual report for Norwegian Air Shuttle, Finnair, Vueling, SAS Group (31.10.2015), Easyjet (30.09.2015), and full-year 2015 report for Ryanair and WizzAir (31.03.2016). Eurowings figures are from the “Eurowings Management Presentation” 10.06.2016. • Cost per available seat kilometer is an industry-wide cost level indicator often referred to as “CASK”. Usually represented as operating expenses before depreciation and amortization (EBITDA level) over produced seat kilometers (ASK). • Foreign exchange rates used are equivalent to the daily average rates corresponding to the reporting periods and as stated by the Central Bank of Norway • Note: For some carriers the available financial data represents Group level data which may include cost items from activities that are unrelated to airline operations. • Other losses / (gains) is not included in the CASK concept as it primarily contains hedge gains/losses offset under financial items* as well as other non-operational income and/or cost items such as gains on the sale of spare part inventory and unrealized foreign currency effects on receivables/payables and (hedges of operational expenses). *Norwegian hedges USD/NOK to counter foreign currency risk exposure on USD denominated borrowings translated to the prevailing currency rate at each balance sheet date. Hedge gains and losses are according to IFRS recognized under operating expenses (other losses/ (gains) while foreign currency gains and losses from translation of USD denominated borrowings are recognized under financial items.

(2)Ver 2017.01.17 CAPA, Ryanair's 117million pax in 2016 tops European airline groups. The first time an LCC topped rankings

(3)Sobre as Industrias europeias do transporte aéreo e todas as companhias aéreas referidas aqui ver o Relatório Transporte Aéreo e Turismo em Portugal com ss cinco volumes estão disponíveis em http: http://www.ciitt.ualg.pt/
E, em particular, o volume II
II Parte – Indústrias europeias do transporte aéreo


(4)-1, easyJet airports that are part of the top 30 European airports, where easyJet is present (therefore excludes Heathrow, Frankfurt, Istanbul and Dublin); 2) Based on theoretical max runway capacity at airport 3) Peak = first wave departures (before 8.30am) on weekdays in IATA Summer season or at other time of day. For leisure destinations may also include weekend peak demand periods e.g. Saturday in Geneva in ski season;


Terminal Montijo dependente de companhias low cost – sete factos

O governo precisou de estudo sobre “constrangimentos de capacidade aeroportuária da região de Lisboa: a opção por um aeroporto complementar ao aeroporto Humberto Delgado” (1). Encomendou o estudo à ANAC que por sua vez o encomendou à consultora estratégica Roland Berger. Em teoria, o estudo ajuda o governo a tomar a melhor decisão. Na realidade, cauciona a decisão do governo junto do que o governo sabe ser uma opinião pública pouco informada, muito passiva e viciada em indignações passageiras. A nós, esta decisão do governo aguça o espirito crítico.  

Não tivemos acesso ao conteúdo do estudo, mas dispomos de informação suficiente para questionar sete factos que o estudo parece ignorar, e não vislumbrámos o que possa haver de “estratégico” no que lemos. Em síntese,

-apoiamos a opção Portela+1 no Montijo desde há anos, estamos satisfeitos com a decisão, mas inquietos com a maneira como foi tomada e receosos com a maneira como vai ser implementada.

Este post deve ser lido em conjunto com

-Turismo, TAP e companhias low cost no(s) aeroporto(s) de Lisboa, de 5 Dezembro 2016, no qual antecipamos o tema dos posts de hoje (aqui),

-Terminal Montijo na expansão do aeroporto de Lisboa – adenda (aqui)

-Terminal Montijo dependente de companhias low cost – sete factos (aqui)

-Companhias low cost no sucesso do Terminal Montijo (aqui)


*Facto 1 – O estudo parece não dar o destaque devido a três dos factores decisivos para o sucesso do Terminal Montijo.

Os três factores decisivos do sucesso do Terminal Montijo aos quais o estudo não dá o destaque devido são, por ordem lógica e de prioridade:

-a Cidade e o destino Lisboa manterem a capacidade de atrair turistas em número crescente,

-acesso fácil e barato ao Terminal Montijo por turistas residentes no estrangeiro ou em Portugal,

-Terminal Montijo convencer companhias aéreas a nele operar e aí desenvolver o seu negócio.

*Facto 2 – “Alertar para o risco do Terminal Montijo ficar dependente de LCC”

Passamos sobre o pleonasmo (um terminal vocacionado para companhias low cost ficar dependente de companhias low cost) e vamos ao essencial:

-a relação entre Terminal Montijo e LCC não é de mera dependência (3), mas sim de gestão da relação comercial conduzida em termos profissionais entre ANA e LCC, e com dimensão nacional pela importância das LCC no Porto e em Faro,

-na gestão desta relação, a ANA precisa de LCC no Terminal Montijo, mas as LCC precisam do Terminal Montijo para crescer o tráfego, num mercado cada vez mais concorrencial.

*Facto 3 – “Cabe agora à ANA conseguir mobilizar as companhias low cost a mudarem e a manterem a sua operação no Montijo”.

A intervenção do marketing aeroportuário da ANA é factor decisivo na captação e fixação de companhias aéreas, mas a gestão da relação profissional entre ANA e companhias low cost deve

-estar mais ligada à distribuição, em relação com o posicionamento da oferta e promoção do marketing & vendas da oferta,

-continuar a trabalhar em rede com a Associação Turismo Lisboa e também com Turismo de Portugal.

*Facto 4 – O estudo não identifica companhias aéreas com dinâmica de crescimento e que precisam do Terminal Montijo para crescer

Apesar de desde 2014 não dispormos de informação ANA sobre tráfego por companhia aérea, há informação de mercado suficiente para identificar o que nos interessa:

-a TAP não utiliza o Terminal Montijo porque a reconversão do Terminal Portela é concebida para a sua operação de hub,

-as sete Full Service Carriers (Iberia, Air France, KLM, British Airways, Lufthansa, SWISS e Brussels) ficam no Terminal Portela porque operam rotas de alimentação dos seus hubs, mas têm reduzida quota no total do aeroporto (12.8% em 2013 e a diminuir para cerca de 10% em 2016) e, sobretudo por terem crescimento patético entre 2001/16,

-as FSCs de países de outros continentes (Emirates, Turkish, TAAG, United) ficam no Terminal Portela, representam algum crescimento, mas não decisivo,

-o Terminal Montijo é vocacionado para companhias que operam rotas ponto-a-ponto intra-europeias, com quota importante no total do aeroporto Humberto Delgado – um conjunto de companhias com 17.5% de parte do total (2013), forte crescimento para quase 30% em 2016 e a subir.

Em outro post (aqui) apresentamos estas companhias.

*Facto 5 – Sabemos quais são as LCC, mas é preciso conhecer a sua estratégia, modelo de negócio e dinâmica, para identificar como cada uma precisa de voar para Lisboa e utilizar o Terminal Portela.

Nenhuma notícia sobre o estudo ANAC/Roland Berger refere o essencial:

-qual é o modelo de negócio de cada umas das companhias low cost em causa,

-como o destino Lisboa e o Terminal Montijo enquadram na sua estratégia e a sua estratégia implica voar para Lisboa?

Se este ponto não é detalhado no ‘estudo estratégico’, o estudo perde grande parte do interesse que poderia ter.

*Facto 6 – O estudo parece omitir o impacte do Terminal Montijo no território em que se integra e a urgência de Medidas Preventivas e instrumentos de gestão do território que qualifiquem esta integração.

Este e os outros seis Factos são explicados no post “Terminal Montijo na expansão do aeroporto de Lisboa – adenda” (aqui).

*Facto 7 – O governo precisa de estudo para caucionar a proposta Montijo, pede à ANAC que o encomende a consultora estratégica, e o governo não divulga o estudo.

Este é mais um exemplo de dois dramas que afectam a qualidade do Governo e Administração Pública em Portugal:

-falta de ‘centro de competência e conhecimento sobre aviação civil em Portugal’,

-falta de transparência dominante, pela ausência de estatísticas e divulgação de estudos pertinentes [ver ponto 2 aqui].


A Bem da Nação

Lisboa 6 Março 2017

Sérgio Palma Brito


Notas

(1)Ver 2017.02.21.Publico.DependenciaLCC

Montijo: estudo alerta para risco de dependência das low cost