Aeroportos de Lisboa, Porto e Faro – passageiros em 2017


Este post é sobre situar o número de passageiros no Aeroporto de Lisboa, Porto e Faro em 2017 na evolução entre 2002/17. Apenas consideramos a Variação Anual do número de passageiros e da taxa de crescimento. A ANA limitou ainda mais a divulgação de dados e está no seu direito. O erro reside em Turismo de Portugal e ANAC não divulgarem rapidamente os números que têm a obrigação de divulgar – voltaremos ao assunto no início de Junho próximo.
Três notas sobre os profetas da desgraça:

-a procura pela oferta de turismo em Portugal é resiliente, mas quando há uma crise também a sente e isto é claro nos anos de 2008/10, segundo os casos – nada exclui uma próxima crise e cá estaremos,

-a procura não está imune a variações estruturais negativas, como a que tem lugar a partir dos anos cinquenta do século XX, quando a procura por estadias balneares nos mares do Norte se desloca para o Mediterrâneo, graças ao modelo de negócio do package holiday que democratiza o transporte aéreo para as Áreas Turísticas que então se formam – é o caso do Algarve,

-a procura também ganha com variações estruturais positivas, como a que tem lugar com o Mercado Único do Transporte Aéreo em 1993, que democratiza o transporte aéreo entre cidades da Europa – é o caso de Lisboa e Porto.



Limitamo-nos apenas a sublinhar o que tem a ver com o tema do post. No aeroporto de Lisboa:

-o crescimento em 2017 é excecional em relação ao patamar iniciado em 2014 (com grande influência da Ryanair), que marca salto qualitativo em relação ao patamar anterior – em 2017, a variação é idêntica à da Receita de Viagens e Turismo,

-o crescimento no futuro próximo parece mais condicionado pela limitação do aeroporto do que pelo mercado.

No aeroporto do Porto,

-recordamos a miséria do crescimento em 2002 e 2003, antes das companhias low cost,

-em 2015 e um ano depois de Lisboa (o efeito Ryanair começa antes no Porto), começa um ciclo de crescimento sustentado e acelerado (a variação anual cresce em cada ano, ou a segunda derivada é positiva).

No aeroporto de Faro,

-recordamos a miséria do crescimento do tráfego no início da década, quando apenas voa para Faro uma pacata companhia Low Cost, a GO Airways da British Airways, depois consolidada pela Easyjet,

-o ano atípico de 2016 acontece depois de anos de relativa estagnação que parece terem sido esquecidos, e em 2017 o número de passageiros diminui.

No caso de Porto e Faro, não nos pronunciamos sobre o futuro.

Gráfico 1 – Passageiros do aeroporto Lisboa - variação anual (milhões)




Fonte – Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos


Gráfico 2 – Passageiros do aeroporto Porto - variação anual (milhões)



Fonte – Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos


Gráfico 3 – Passageiros do aeroporto Faro - variação anual (milhões)


Fonte – Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos



2.Variação da taxa de crescimento

As variações da taxa de crescimento anual dão outra perspetiva da realidade que descrevemos antes.  

Gráfico 4 – Passageiros aeroporto Lisboa - variação anual em percentagem


Fonte – Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos


Gráfico 5 – Passageiros aeroporto Porto - variação anual em percentagem


Fonte – Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos


Gráfico 6 – Passageiros aeroporto Faro - variação anual em percentagem


Fonte – Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos



A Bem da Nação

Lisboa 30 de Abril de 2018

Sérgio Palma Brito

Crescimento excecional da Receita de Viagens e Turismo em 2017


Todo este post gira em torno do crescimento atípico da Receita de Viagens e Turismo em 2017: €2.473milhões ou 19.5%. A análise que segue pretende reforçar a mensagem que procuramos comunicar desde há anos: conhecer melhor a realidade e criar um discurso sobre turismo baseado em números que sejam base para informação, debate e decisão. Sugerimos a leitura prévia das Notas finais (ponto 4).

Os valores extraordinários do crescimento da Receita de Viagens e Turismo em 2017 deveriam ter levado Banco de Portugal, Turismo de Portugal ou uma universidade a responder a duas perguntas pertinentes:

-a que se deve o crescimento de 19.5%, numa série que tem crescimento sustentado desde 2010 mas a ritmo menor?

-qual a parte destes €2.473milhões no crescimento do Consumo Privado no PIB de 2017.

No último ponto, recusamos aceitar, sem mais análise, explicação imediata, mas não descabida, sugerida pelo gráfico 9. A divergência entre o crescimento da Receita, quando comparado com o dos Passageiros em Lisboa, Porto e Faro e Dormidas na Hotelaria resulta do feito conjugado de:

-perda das Dormidas na Hotelaria compensada pela conjugação de Alojamento Local e de emigrantes portugueses que se deslocam em automóvel e alojam em casa própria ou de Familiares e Amigos,

-estadias longas de vistos Gold e ‘reformados fiscais’ em suas casas.


1.Receita de Viagens e Turismo - evolução 2003/2017

Os três gráficos seguintes contextualizam as perguntas mencionadas antes na evolução da Receita de Viagens e Turismo e da sua variação anual em quantidade e percentagem. Estes gráficos ilustram a já reconhecida retoma do crescimento da Receita a partir de 2010 e seu excecional valor em 2017.

Gráfico 1 – Evolução da Receita de Viagens e Turismo





Gráfico 2 – Evolução da variação anual da Receita em €milhões



Fonte: Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos.


Gráfico 3 – Evolução da variação anual da Receita em percentagem



Fonte: Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos.




*Sete países e ligar diversificação de mercados à Receita

Se considerarmos valor em 2017 e crescimento entre 2016/17 e 2009/17, há sete países que se destacam. Encontramos na Receita de Viagens e Turismo situação idêntica à do Transporte Aéreo: há estabilidade de um número reduzido de mercados mais importantes e com potencial de crescimento mais nuns do que noutros.

A insistência na ‘diversificação de mercados’ deve ser temperada pelo

-aprofundar da penetração em mercados onde Portugal e os seus Destinos Regionais já têm algum posicionamento,

-pelo relacionar a diversificação em hóspedes e dormidas com a Receita de Viagens e Turismo.

*Ranking da Receita de Viagens e Turismo em 2017

Escolhemos os países que, em 2017, geram mais de €200milhões de Receita e representam 89.2% do valor total de 2017 (Gráfico 4). Destacamos:

-a importância que os emigrantes têm no caso da França e, muito menos, nos casos do Reino Unido, Espanha e Alemanha,

-o quarto lugar da Alemanha, o mais importante mercado emissor da Europa e mis uma confirmação de que há algo de errado como os destinos regionais nele se posicionam.

Gráfico 4 - Ranking da Receita de Viagens e Turismo em 2017




*Ranking do Crescimento da Receita de Viagens e Turismo em 2017

O gráfico 5 ilustra os Países que mais contribuem para o crescimento em 2017. Retemos os países que crescem pelo menos €50milhões, com tolerância mínima para a Polónia e que geram 82.4% do crescimento total em 2017. Os seis primeiros países representam 62% do crescimento em 2017.


Gráfico 5 – Ranking Crescimento da Receita de Viagens e Turismo em 2017



Fonte: Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos.


*Ranking Crescimento Receita Viagens e Turismo entre 2009/17

O gráfico 6 ilustra os 17 países que mais contribuem para o crescimento da Receita entre 2009/2017, com cada um a crescer pelo menos €100milhões, e que geram 91.5% do crescimento total durante este período e os sete primeiros representam 70%.

Gráfico 6 – Ranking Crescimento Receita Viagens e Turismo entre 2009/17



Fonte: Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos.


3.Receita de Viagens e Turismo e dinâmica de crescimento

Os gráficos 7 e 8 ilustram o crescimento da Receita de Viagens e Turismo entre 2009/2017 em percentagem. Sem surpresa, os países mais maduros e importantes tendem a crescer menos. Entre os países que mais crescem (gráfico 7) e fora o caso atípico da China, destacamos:

-EUA e Brasil por estarem também entre os maiores crescimentos em quantidade,

-Federação Russa, Polónia e Canadá pelo potencial de crescimento em quantidade.

Gráfico 7 – Receita Viagens e Turismo, países que mais crescem 2009/17



Fonte: Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos.

Entre os países que menos crescem (gráfico 8), destacamos:

-entre os Quatro Grandes, a fraca performance de França, Reino Unido e Espanha, e o crescimento da Alemanha,

-entre os Nórdicos, a boa performance da Suécia e a má de Dinamarca, Noruega e Finlândia, nos três últimos lugares.

Gráfico 8 – Receita Viagens e Turismo, países que menos crescem 2009/17


Fonte: Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos.


4.Receita de Viagens e Turismo, Passageiros três aeroportos e Dormidas na Hotelaria

O gráfico 9 compara as taxas de crescimento anual de Receitas de Viagens e Turismo, do total de Passageiros em Lisboa, Porto e Faro, e das Dormidas na Hotelaria. Destacamos uma evolução muito próxima dos três indicadores, com divergências recentes:

-o já muito conhecido surto de crescimento do número de Passageiros a partir desde 2015,

-o crescimento sem anos atípicos de Dormidas na Hotelaria, mas com baixa em 2017,

-o crescimento atípico da Receita de Viagens e Turismo em 2017, superior ao da Receita e quando a taxa de crescimento das Dormidas diminui.

Gráfico 9 – Receita, Passageiros e Dormidas – variação anual em %



Fonte: Elaboração própria com base em Banco de Portugal, Balança de Pagamentos, ANA Aeroportos e Destaques da 
Hotelaria, INE.


5.Notas finais

*Realidade a ter em conta

A Receita de Viagens e Turismo da Balança de Pagamentos é gerada por despesa corrente de não residentes aquando da deslocação a Portugal:

-não residentes inclui emigrantes,

-despesa corrente não inclui investimento em habitação própria e (a verificar) na sua manutenção, desde condomínio a IMI.

Admitimos que a despesa dos ‘reformados fiscais’ e vistos gold não residentes conte também para esta Receita. Ignoro até que ponto as mais recentes normas do FMI sobre Balança de Pagamentos e a informação de que dispõe o BdP [ver a seguir] podem influenciar a estimativa deste indicador.

Seria bom que Banco de Portugal e Turismo de Portugal informassem até que ponto estão satisfeitos com os dados dos Inquéritos às Deslocações de Não Residentes e ao seu Consumo durante a deslocação.


A Bem da Nação

Lisboa 30 de Abril de 2018

Sérgio Palma Brito


Que se passa com Ryanair? O modelo precisa de ser revisto?


O título do Expresso em 4 de Outubro 2017 de interroga: “Afinal, o que se passa com as low cost?”. O lead é peremptório: “A Monarch faliu, a Air Berlin declarou insolvência e a Ryanair continua a suspender voos (1). O modelo de negócio das companhias aéreas de baixo custo precisa de ser revisto”. A afirmação é genérica, mas é a Ryanair que está em causa. Vamos esmiuçar o caso da Ryanair.

a)Cancelamento de voos/rotas pela Ryanair - incidente menor de consequências maiores

*Incidente que poderia ser classificado de menor

Em 15 Setembro 2017 a Ryanair anuncia o cancelamento de rotas e voos que afectam 315.000 passageiros em curso e 400.000 que viajam entre Novembro/Março (2). Estes 715.000 passageiros representam 0,6% do tráfego previsto a 31 Março 2018, já com a revisão provocada pelos cancelamentos. De facto, estes são incidente operacional com impacte menor numa companhia que então prevê transportar 131 milhões de passageiros no exercício a 31 Março 2018, mais 11 milhões do que no ano a 31 Março 2017 (gráfico 2).

A Ryanair é obrigada a rever a sua previsão de tráfego (gráfico 2): 

-perde dois milhões de passageiros em 2018, de 131m para 129m e quatro milhões em 2019, de 142m para 138m, respectivamente 1,5% e 2,8% da previsão inicial (3).

O efeito imediato do incidente não impede que o tráfego cresça entre Setembro e Novembro 2017:

-em Setembro 2017, o tráfego cresce 10% em relação a 2016 para 11.8 milhões de passageiros, e o load factor cresce 2% para 97%,

-em Outubro o tráfego cresce 8% em relação a 2016 para 11.8 milhões, e o load factor sobe 1% para 95%,

-em Novembro o tráfego cresce 6% em relação a 2016 para 9.3 milhões, e o load factor sobe 1% para 96% (4).

*Consequências importantes de incidente menor

O incidente é menor mas ganha dimensão muito para além destes números. Como veremos a seguir, é a própria Civil Aviation Authority que reconhece: “The mistakes that caused the cancellations are minor”. As cancelations poderão ser minor mas põem em evidência

-problemas muito sérios na gestão de pilotos e regime laboral da Ryanair,

-violação dos direitos dos passageiros e demora em a corrigir,

-ressuscitar corporate culture anterior à nova estratégia de 2013,

-perda de oportunidade de negócio na falência da air berlin.

Estas são as consequências verdadeiramente importantes para a Ryanair, a partir de incidente que poderia ser menor mas que de facto não é.

*Problemas muito sérios na gestão de pilotos e regime laboral

Como vimos em outro post, ser pan-europeia é dos mais importantes factores-que-diferenciam as LCC. A 31 Março 2017, a Ryanair opera frota de 430 Boeing737 em 87 bases dispersas por muitos países. Conciliar direitos dos trabalhadores e exigência de operação low cost implica recurso a regime legal específico, já questionado em países como Dinamarca e França.

A Ryanair tem cerca de 2.500 pilotos. Entre Janeiro/Outubro 2017, a contrata 867 pilotos (5). Este número está em linha com a saída de 700 pilotos, anunciada na comunicação social. Segundo o Irish Air Line Pilots’ Association (Ialpa), “Over 700 pilots left Ryanair in last financial year”. O numero está em linha mas esta rotação de pilotos exige ser melhor conhecida, mas tal está fora do âmbito deste post.

O incidente na origem dos cancelamentos traz à actualidade o estatuto dos pilotos da Ryanair e a capacidade da companhia os reter. A 14 Setembro, um dia antes dos cancelamentos, “Ryanair was dealt a blow in its legal battle to force employees across Europe to take disputes to the Irish courts after European Court of Justice ruled that cabin crew based in other countries could pursue legal claims locally.” (6).

Numa primeira fase, a Ryanair tenta pacificar os pilotos com aumento de salário e benefícios. Os pilotos recusam porque querem reforçar a sua posição negocial. Em 20 Outubro 2017, “Ryanair’s Stanstead pilots have overwhelmingly rejected a higher pay offer from the low-cost carrier’s outspoken founder,  Michael O’Leary […] It follows a similar rejection at Ryanair´s Madrid base earlier this week.”. E conseguem, em 15 Dezembro 2015 e sob ameaça de greves em Itália, Irlanda, Reino Unido, Espanha e Portugal,

-“Ryanair has reversed decades of policy to recognize pilot unions for the first time, in a significant concession aimed at averting strikes next week by cokpit crew at the start of the busy Christmas season.” (7). 

Em 18 Dezembro 2017, a síntese pelo Financial Times:

-“Ryanair’s mess-up over pilot rostering this autumn taught Mr O’Leary the price of a PR disaster, if he didn’t know it before. The bill for cancelling 700,000 bookings, reimbursing passengers and improving pilot’s packages to draw them back to the cockpit will be €125m-plus. That did not shift forecasts of €1.45bn in pre-tax profits this year. Even so Ryanair’s market value fell by more than €1bn in the autumn as well.” (8).

Reconhecer os sindicatos nacionais de pilotos altera as relações de trabalho na empresa e pode vir a acontecer também com pessoal de cabine e de terra. A gestão das relações sociais neste novo contexto vai ser importante no futuro da companhia.

Esta é a realidade que desmente o já referido artigo do Expresso, quando fala em “A única solução para a Ryanair é pagar mais aos pilotos e reflectir isso nos preços dos bilhetes”.

*Violação dos direitos dos passageiros e demora em a corrigir

A partir de 15 Setembro 2017, a leitura dos comunicados oficiais da Ryanair mostra preocupação em encontrar soluções para os passageiros afectados pelos cancelamentos (9). Esta preocupação não é suficiente para informar os passageiros sobre direitos legais que a companhia não está a respeitar e mostrar vontade em os respeitar. O regulador do Reino Unido é obrigado a intervir nos termos que descrevemos a seguir. Destacamos os pontos principais com base no Financial Times online.

Em 27 de Setembro, título do FT: “UK regulator accuses Ryanair of misleading passengers after cancelling flights”. No texto,

-“In a letter to Ryanair, the CAA said chief executive Michael O’Leary had wrongly claims that the carrier was not obliged to find seats on alternative Airlines for passengers on cancelled flights. Despite a request last week to correct this inaccurate statement publicly Ryanair had so far not complied the CAA said.” (10).

Em 27 de Setembro e em longo comunicado da Ryanair, o CEO Michael O’Leary já declara: “We sincerely apologise to those customers who have been affected by last week’s flight cancellations” (11). Mas o gesto é tardio e insuficiente.
A 29 Setembro o FT informa sobre primeiro passo para possível acção legal pela CAA:

-“The civil aviation authority on Wednesday said it was expediting enforcement action against the low cost carrier, the first step towards court action if reaches of consumer protection persist.” (12).

Ainda em 29 Setembro, a FT Opinion insiste:

-“The mistakes that caused the cancellations are minor, though, next to the airline’s flagrant attempt to ignore its legal obligations to passengers. Mr O’Leary said openly at first that Ryanair would not pay to book people on to flights with other airlines where necessary, nor would it reimburse expenses incurred as a result of the cancellations. This was inexcusable. As the head of the Civil Aviation Authority put it: “People shouldn´t have to choose between low fares and legal rights.

Ryanair has now recanted, saying on Friday it had met regulators and agreed steps to fulfill its obligations and ensure passengers are aware of their rights. This will probably be enough to avert the CAA’s threat of legal action.” (13).

Nesse mesmo dia 29 o título do FT: “Ryanair bows to regulator pressure over customer rights”. Simples:

-“Ryanair has bowed to pressure from regulators to inform thousands of passengers of their full rights to compensation for cancelled flights.” (14).

A Ryanair demora duas semanas a dar a informação que era suposta ter dado logo dado a 15 Setembro. O dano na reputação da empresa é muito profundo.

*Ressuscitar corporate culture anterior à nova estratégia de 2013

O’Leary faz com que a opinião publica vá ao baú das recriminações de ‘antes da reconversão da Ryanair em 2013’ e passe a mensagem da corporate culture da empresa não ter mudado. A 29 Setembro 2017, uma opinião do FT:

-“Over the yers, its irascible chief executive Michael O’Leary has referred to passagengers as “morons”, insisting that “we don’t want to hear your sob stories.”.

E mais adiante, reconhece o sucesso mas exagera a ameaça sobre a rising trajectory:

-“And yet the carriers keeps growing – from 650.000 passengers in 1991 to a projected 130m this year […] But now that rising trajectory is under threat.”.

A FT Opinion reconhece a evolução da Ryanair desde 2013, mas é redutora da realidade do programa Always Getting Better ao escrever: “The aim was to pitch for more lucrative business passengers, who demand a modicum of comfort and set store by punctuality – and it paid off.”.

Esta opinião não é fair e em boa parte é excessiva – o Always Getting Better vai muito para além dos lucrative business passengers. A opinião alinha com a desconfiança que O’Leary e a Ryanair são tratados pelo FT quando iniciam a transformação do Outono 2013. Fair ou não, é motivo para a colunista terminar a situar o problema ao nível da corporate culture:

-“Yet Mr O’Leary instinctive contempt for customers and employees appears to be intact – and ingrained in Ryanair corporate culture. This ought to be a concern for regulators and shareholders.” (15).

A maneira como a Ryanair começa por tratar os passageiros e como só recua perante ameaça séria da CAA permite a opinião da ‘velha’ corporate culture não ter mudado.

*Perda de oportunidade de negócio na falência da air berlin

O mercado do transporte aéreo na Alemanha é o mais importante da Europa. A taxa de penetração das LCC ainda é baixa (24%, quando no Reino Unido é 44%) e a Ryanair é nº3 em parte de mercado, depois de Lufthansa e air berlin (16). O potencial de crescimento é considerável.

Durante a marcha da air berlin para a insolvência, há dois concorrentes fortes (Lufthansa e o operador TUI Travel) em concorrência para aumentar quota
mercado na Alemanha, mas juntos na luta contra maior penetração de Ryanair eEasyjet. Problemas internos afastam a TUI e a perspectiva é de Ryanair ser o grande concorrente da Lufthansa.


Na realidade, os problemas da Ryanair deixam a partilha para Lufthansa que ganha a maior parte dos activos da air berlin e Easyjet que de terceira companhia em Berlin Tegel passa a primeira (17). Este processo arrasta-se até ao final de 2017 com as exigências da Comissão em defesa da concorrência, mas a Ryanair parece estar definitivamente afastada. Não está, mas é tema para outro post.


b)Realidade empresarial impossível de ignorar

Apesar da reconversão estratégica iniciada em 2013 e do seu sucesso no mercado, muitas das intervenções sobre a Ryanair são negativas porque influenciadas pelo historial da empresa na sua relação com passageiros, distribuição e aeroportos. Neste ponto mostramos ser impossível não reconhecer a realidade empresarial da Ryanair e ultrapassar o que já foi ultrapassado. Apesar de, como vimos, ainda haver reacendimentos como em incêndio suposto extinto
 
b.1.Notas sobre o historial da Ryanair

*Número de passageiros e
O número de passageiros da Ryanair cresce de maneira sustentada (gráfico 1). Com exercícios a 31 Março, em 2016 atinge 106,4 milhões, mais 16 milhões do que em 2015. Em 2017 atinge 120 milhões, mais 13.6 milhões do que em 2016 o que é mais do que os 11,7 milhões de passageiros sa TAP em 2016 – comparação é elucidativa mas não é justa porque a TAP tem significativo tráfego de longo-curso.

Gráfico 1 – Passageiros Ryanair: crescimento 1995/2017
 (milhões)

Fonte: Elaboração própria com base em Raynair – Annual Reports e informação Ryanair

*Evolução recente do profit after tax

Gráfico 2 – Ryanair profit after tax (€milhões)


Fonte: Elaboração própria com base nos relatórios anuais da Ryanair

O gráfico 2 e lustra a evolução recente do profit after tax da Ryanair, que aumenta 332% entre 2010 e 2017. Os valores nos três anos (a 31 Março) de 2015 a 2017

-confirmam o sucesso da reconversão estratégica iniciada no Outono 2013, mas reflectem também a influência da baixa do preço do fuel,

-desmentem o simplismo do já referido artigo do Expresso com a teoria segundo a qual o modelo de negócio das LCC está comprometido pela redução dos incentivos pagos por alguns aeroportos.

b.2.Reconversão estratégica de 2013/14 e seu sucesso

*A reconversão estratégica no exercício a 31 Março 2014

No final de 2013, o poeta irlandês poderia cantar ‘cesse quase tudo o que a musa antiga canta que outro valor mais alto se levanta’. A Ryanair inicia uma reconversão estratégica de que o programa 'Always Getting Better é a expressão mais visível. Ao longo do exercício a 31 Março 2014 a actividade da Ryanair é marcada por duas dinâmicas em curso:

-a do modelo de negócio tradicional da Ryanair, no qual o baixo preço do bilhete gera o crescimento do tráfego e os passageiros até podem ser hostilizados,

-factos e decisões que antecipam o novo modelo de negócio do pós-AGM, no qual “Llower fares & Always Gettinng Better Programme drives growth”.

Do Chief Executive‟s Report no relatório anual a 31 Março 2014, citamos:
-“In September 2013, we announced plans to significantly improve our customer experience. For many years, success was defined by having the lowest costs and the lowest fares in every market, which ensured that we grew rapidly establishing enormous price (and cost) leadership over Europe‘s flag carriers, and so called low cost carriers, all of whom charge air fares that are at least 50% higher than Ryanair. As our business matures, and our growth rates slow somewhat, we are committed to improving our customer experience in addition to providing our guests with the lowest fares, the most on-time flights, the fewest lost bags, and the fewest cancellations.” [sublinhados são nossos].

No relatório a 31 Março 2015, o CEO reconhece: “We changed policies which were previously tablets of stone for over two decades.”.

*Sucesso da reconversão estratégica a 31 Março 2016

Com base no exercício que a 31 de Março de 2016, o CAPA afirma:

-“Ryanair's best margin since 2005 illustrates the success of 'Always Getting Better' programme”,

-This was achieved with only a 1% fall in average fares, demonstrating the success of the customer service and network improvements that Ryanair has introduced over the past two years under its 'Always Getting Better' programme.” (18).

O exercício a 31 Março 2016 confirma o sucesso da reconversão estratégica da Ryanair iniciada em 2013 e marcada por revolução no customer service, no sacrossanto respeito pelo CASK mais baixo da Europa e em “levels of profitability not seen for a decade”. O CAPA conclui:

-“The airline's passenger service improvements have reinvigorated the business model over the past two years and returned it to levels of profitability not seen for a decade.”.

Este sucesso não teria acontecido sem a reconversão estratégica da Ryanair iniciada em 2013 e esta não teria tido lugar sem a capacidade de adaptação do CEO Michael O’Leary.

*“Lower fares & Always Gettinng Better Programme drives growth”

Gráfico 3 – Average Fare European Airlines


Fonte: Ryanair, H1 Full Year 2018 Results, slide 3 que cita Latest Full Year results/Annual Reports

A Ryanair não fala em serviço premium que justifica preço de venda mais alto. A nova estratégia continua a assentar em baixar tarifas para ganhar clientes e lucro (gráfico 3), mas com igual foco na satisfação do cliente. Na mesma apresentação (slide 9) é reafirmada a estratégia: Lower fares & Always Gettinng Better Programme drives growth (129m).

A estratégia de “lower fares” é mais evidente na mensagem do CEO aos accionistas em sucessivos relatórios anuais:

-2013 “We continue to grow by delivering lower fares, better punctuality,”.

-2014 “As our business matures, and our growth rates slow somewhat, we are committed to improving our customer experience in addition to providing our guests with the lowest fares,”.

-2015 “Our budget next year assumes fares will fall by 2% to 4% as we pass on lower oil prices, and financing to deliver more value for customers”.

-2016 “Our customers can look forward to lower fares and even more experience improvements during year 3 of our AGB program.”.

-2017 “Over the last year we delivered traffic growth of 13%, by cutting fares 13%, and saving our customers over €700m. More importantly, we reduced unit costs by 11% so, even at these lower prices, profit after tax grew by 6% to a new record of €1.316bn, a net margin of 20%.”.

Mais uma vez a realidade desmente o artigo do Expresso quando afirma: “É preciso acabar com os bilhetes de avião a 10 euros. O negócio da aviação nunca foi um grande negócio. Tem custos fixos (tripulação e manutenção) muito elevados e um break even point (ponto de equilíbrio em que o total das receitas é igual ao total dos gastos) altíssimo”.

b.3.Sucesso que gera pressão sobre a gestão da empresa

*Previsões de crescimento de tráfego com ambição crescente

A partir de 2013, a Ryanair faz quatro previsões de crescimento de tráfego, com ambição crescente (gráfico 4). Em Julho 2013 e face ao aumento da procura, a Ryanair aumenta a previsão de 100 milhões de passageiros em 2019 para 110 milhões. É neste contexto que, em 19 Junho 2013, é anunciada a encomenda de 175 Next-Generation 737s (19). O crescimento da procura confirma o sucesso da reconversão estratégica e leva a Ryanair a anunciar mais três previsões de passageiros (gráfico 2), a última das quais é ligeiramente revista no seguimento dos cancelamentos de 15 Setembro 2017.

Gráfico 4 – Previsões de tráfego da Ryanair no horizonte 2024
(milhões)

Fonte: Elaboração própria com base em informação Ryanair

A alteração de objectivos para 2018 e 2019 deve ser situada neste contexto. Entre outros, são estes objectivos que põem enorme pressão sobre os gestores da empresa e fazem com que também precise de voar para aeroportos com potencial de crescimento de tráfego. Como acontece em Lisboa em 2014, está a acontecer no Porto mas não em Faro.

*Gestão obrigada a atingir objectivos ambiciosos

Estes objectivos ambiciosos em crescimento de passageiros e renovação da frota, mais o da remuneração dos accionistas põem o mercado das LCC sob dupla pressão,

- a da Ryanair sob ela própria porque tem de atingir os objectivos fixados,

- a que esta pressão induz sobre LCC habituadas a concorrer com o short-haul de FSC e que passam a enfrentar mais intensa concorrência entre elas.

É neste contexto que se posiciona a capacidade de atracção de rotas LCC pelos aeroportos de Lisboa, Porto e Faro. O sucesso da LCC passa cada vez mais pela sua capacidade de ganhar passageiros o que as põe também na dependência de voar para destinos que atraiam turistas e assim atingir os objectivos anunciados ao mercado do turismo e de capitais.

c)Ryanair e Portugal

Goste-se ou não, a Ryanair é importante para o turismo e para o País. O mínimo que temos de fazer é conhecer a sua história, corporate culture e ambição. Só assim o ‘interesse’ de Portugal pode negociar com a Ryanair e contribuir para o sucesso das duas partes.

Gráfico 5 – Passageiros Ryanair em Lisboa Porto e Faro (milhões)


Fonte: Elaboração própria com base em informação ANA (até 2013) e do mercado

Gráfico 6 – Passageiros Ryanair em percentagem do total de passageiros

Fonte: Elaboração própria com base em informação ANA (até 2013) e do mercado

A Ryanair é leader nos aeroportos do Porto e Faro nos quais desempenha papel histórico na sua afirmação. É número dois em Lisboa, depois da TAP e muito acima das outras companhias aéreas. Os gráficos 5 e 6 ilustram a presença da Ryanair nos três aeroportos do Continente. No Porto e em Faro, importância quantitativa e crescimento são evidentes, mas a partir de 2011 a parte de mercado da Ryanair conhece variações mínimas e estabiliza entre 2011/2017.


A Bem da Nação

Lisboa 26 de Abril de 2018

Sérgio Palma Brito


Notas

(1)2017.10.04 Expresso, Afinal o que se passa com as low cost? Erro factual. Todos os voos em causa foram suspensos em 15 Setembro 2017.

Ver análise detalhada deste artigo no ponto 7 do Relatório Turismo e Transporte Aéreo em Portugal.

(2)São canceladas as seguintes rotas: Duas domésticas na Polónia, sete de Trapani, três de Tessalónica, cinco de Sofia, três de Chania, três domésticas no Reino Unido, cinco de Hamburgo, uma de Edimburgo e outra de Glasgow, duas de Newcastle (a de Faro é a única em Portugal), três de Chania, uma de Bucareste e uma de Colonia.

(3)Ver Ryanair H1 FY Results, slide 10.

(4)Ver

(5)Ver

Não entramos na apresentação do regime laboral da Ryanair por haver múltiplas informações contraditórias e não dispormos de meios para o fazer. Parece certo a grande maioria dos contratos serem segunda as leis da Irlanda e haver recurso a subcontratação.










(16)Ver
-gráfico 5 em ‘Indústrias europeias do transporte aéreo – de 1993 à actualidade’ http://sergiopalmabrito.blogspot.pt/2017/11/industrias-europeias-do-transporte.html

(17)Ver
-2017.10.13 Contract for the purchase of parts of Air Berlin Group signed
-2017.10.28 Bloomberg EasyJet in Deal to Take Over Air Berlin A320 Plane Leases, Slots

(18)2016.05.24 CAPA Ryanair's best margin since 2005 illustrates the success of 'Always Getting Better' programme

(19)Ver 2013.06.19 Boeingmediaroom, Boeing, Ryanair Finalize Order for 175 Next-Generation 737s

(15)Ver
-‘Factores que diferenciam as companhias Low Cost pan-europeias’ em http://sergiopalmabrito.blogspot.pt/2017/11/factores-que-diferenciam-as-companhias.html
-2016.03.24 CAPA Airlines in Transition. How FSCs can regain short haul share from LCCs Part 1: at the coal face