No Seminário que a CCDR do Algarve
organizou (4 Abril 2017), levantei um aspecto da Economia turístico residencial do Algarve sobre
o qual ninguém fala ou apenas fala pejorativamente:
-a dualidade de estabelecimentos na indústria
da Hotelaria no Algarve (corresponde ao Alojamento turístico classificado) onde
coexistem estabelecimentos competitivos e outros obsoletos, estes com impacte
negativo no potencial de criação de valor pela indústria da Hotelaria da Região.
Antes de continuarmos, importa dar uma
ideia sobre a evolução e realidade actual dos estabelecimentos da indústria da
Hotelaria.
*Industria Hotelaria Algarve – 115k camas e 369
estabelecimentos
Entre 1970/2015
a indústria da Hotelaria do Algarve cresce de maneira sustentada. Desde 2001
ganha 12 estabelecimentos. Em 2015, a industria
compreende cerca de 370 estabelecimentos e 115.000 camas (gráfico 1). Com base na informação de que
dispomos, há estabelecimentos importantes que não figuram neste total.
Gráfico 1 – Camas
dos estabelecimentos da indústria da Hotelaria do Algarve
(milhares)
Fonte: Elaboração própria com base em INE – Estatísticas de Turismo
Estes estabelecimentos repartem-se pelos
tipos de Empreendimentos Turísticos definidos pelo Regime Jurídico da
Instalação, Exploração e Funcionamento dos Empreendimentos Turísticos de 2008
(gráfico 2): 129 Hotéis, 69 Hotéis Apartamentos, 138 Apartamentos Turísticos e
33 Aldeamentos Turísticos. Constatamos que os Hotéis propriamente ditos
representam apenas 33% das camas da indústria da Hotelaria do Algarve em 2015.
Gráfico 2 – Camas
por tipo estabelecimento industria Hotelaria Algarve 2015
(milhares)
Fonte: Elaboração própria com base em INE – Estatísticas de Turismo
*Dois grupos de estabelecimentos da indústria da
hotelaria
Com base na nossa observação e muita
informação recolhida, no terreno ou por pesquiza, identificamos dois grandes
grupos de estabelecimentos:
-o que integra estabelecimentos
competitivos, que acompanham as exigências do mercado qualificado, têm sido bem
mantidos e renovados e parecem remunerar o capital investido a uma taxa
superior à do seu custo,
-outro é de estabelecimentos em
estagnação/declínio, procurados por segmentos menos exigentes da procura, não
foram mantidos e renovados e estão obsoletos, e as empresas não dispõem de
capital humano para os renovar.
Os estabelecimentos obsoletos raramente
fecham, arrastam a sua decadência e são procurados peãs franjas menos exigentes
do mercado. Salários em atraso, pessoal pago por fora, dívidas a fisco,
Segurança Social e fornecedores completam o quadro.
Em alguns casos de empresas familiares esta
decadência está ligada a não ter havido uma transferência de gerações na
propriedade e exploração. Entre outros factores, são empresas familiares em que
a transição de gerações não foi acautelada.
No caso de fábricas das mais diversas
indústrias (têxtil, calçado, química, etc.) os estabelecimentos obsoletos
fecham rapidamente, são abandonados e, com bastante frequência, os terrenos que
ocupam ganham valor com a urbanização.
No caso da indústria da hotelaria, os
estabelecimentos obsoletos têm de ser renovados in situ, e com operação de capital intensivo fora do alcance dos
proprietários. A negociação entre proprietários que não conseguem renovar o
estabelecimento e interessados em investir atrasa ou compromete a sua renovação.
*Intervenção Pública e do mercado
O mercado não elimina os estabelecimentos
obsoletos ou fá-lo tarde e a más horas, porque há sempre uma procura menos
exigente que aceita aí alojar. A Intervenção Pública no Turismo está consciente
da situação, mas não tem sido capaz de intervir.
Esta conjugação de impotências prejudica o
País, porque estabelecimentos obsoletos, alguns na primeira linha de praia, não
geram o valor que deviam gerar e prejudicam o posicionamento do Algarve no seu
todo.
Por outras palavras,
-com um investimento de renovação, o
Algarve e o País ganham algumas dezenas de estabelecimentos competitivos onde
agora funcionam estabelecimentos obsoletos cuja oferta desqualifica a procura.
*Análise estratégica da indústria da Hotelaria e ímpeto
político
Dadas as limitações das Estatísticas de
Turismo, compete ao Turismo de Portugal
-promover o equivalente a Análise
Estratégica da Industria da hotelaria do Algarve que nos informe sobre sua
evolução e os dois (ou mais) grupos em que podemos integrar os cerca de 370
estabelecimentos que a compõem,
-apresentar um programa de acção que
permita ao mercado requalificar os estabelecimentos obsoletos.
Na realidade, a Turismo de Portugal só vai
intervir se houver determinação política na área de influência do
Primeiro-Ministro. Salvo raríssimas excepções, as decisões verdadeiramente
estratégicas da política para o turismo são tomadas pelo primeiro-ministro.
Chegados aqui, encontramos o
estrangulamento que denunciámos no seminário da CCDRA:
-“Estou feliz com resultados de 2016 e
perspectivas para o muito próximo futuro. Receio que euforia pelos resultados,
culto fácil do sucesso e falta de quantificação de indicadores fundamentais
causem perda de lucidez na análise dos verdadeiros problemas do Algarve.”.
Nenhum primeiro-ministro intervém a contra
corrente com a euforia e culto excessivo do sucesso que o turismo atravessa.
*Estatísticas Turismo INE – Hóspedes, Dormidas e
Proveitos
O INE quantifica Hóspedes e Dormidas (de
Residentes e Não Residentes) e Proveitos (de Alojamento e Não Alojamento), numa
série estatística que remonta a 1965.
Estes números são frequentemente
identificados como os números “do turismo” e turistas no Algarve reduzidos a
Hóspedes. Em outro post vamos quantificar os turistas que escolhem o Alojamento
turístico não classificado, as “camas paralelas” da linguagem corrente.
Estes indicadores dão apenas uma ideia
geral da performance da indústria da Hotelaria do Algarve. Forçosamente, e sem
que possam ser criticados por isso, escamoteiam a dualidade de estabelecimentos
que abordamos.
Dos gráficos 3 a 7, destacamos:
-crescimento
sustentado do número de hóspedes não residentes a partir de 2009, que em 2016
estão praticamente um milhão acima do número de antes da crise,
-número de
hóspedes residentes em Portugal atinge em 2016 o número de antes da crise,
-dormidas
com evolução similar à dos hóspedes, mas entre 2009/16 descida de 0.2 noites na
estadia média de hóspedes não residentes e estabilidade na dos residentes,
-a preços
correntes, os proveitos totais também crescem a partir de 2009, mas a receita
média só cresce verdadeiramente a partir de 2014,
-a receita
média por dormida é de €50.2 a preços correntes, mas de €32.2 a preços
constantes de 1995.
Gráfico 3 – Hospedes estabelecimentos indústria
Hotelaria Algarve
(milhares)
Fonte: Elaboração própria com base em INE – Estatísticas de Turismo
Gráfico 4 – Dormidas estabelecimentos
indústria Hotelaria Algarve
(milhares)
Fonte: Elaboração própria com base em INE – Estatísticas de Turismo
Gráfico 5 – Estadia média estabelecimentos
indústria Hotelaria Algarve
Fonte: Elaboração própria com base em INE – Estatísticas de Turismo
Gráfico 6 – Proveitos estabelecimentos
indústria Hotelaria Algarve
(€milhares)
Fonte: Elaboração própria com base em INE – Estatísticas de Turismo
Gráfico 7 – Proveito médio por dormida indústria
Hotelaria Algarve
(€unidades)
Fonte: Elaboração própria com base em INE – Estatísticas de Turismo
A Bem da
Nação
Lisboa 6
Abril 2017
Sérgio
Palma Brito
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