Uma pergunta sobre a greve da vigilância e segurança privada dos aeroportos nacionais

O Sindicato dos Trabalhadores da Aviação Civil (SITAVA) anuncia uma greve “parcial dos trabalhadores de empresas de vigilância e segurança privada dos aeroportos nacionais” para os dias quentes das férias da Páscoa (1).

Para compreender o que está em causa, recuamos à greve que o Sitava anunciou para os dias quentes de Natal e Ano Novo de 2016.

*Setembro 2016: redução de custos até 2020 (€150/200milhões)

Antes, temos de recuar a Outubro 2016, quando a TAP apresenta oProject RISE: Transforming TAP into a more efficient and agile flag airline carrier”. 
Citamos duas orientações:

-“para ser sustentável a longo prazo, a companhia aérea terá de cortar custos em 150 a 200 milhões de euros até 2020.”,

-"Não há uma agenda escondida. Não há despedimentos ou cortes salariais, o que há é crescimento.” (2).

Em 2016 a TAP tem lucro líquido de €33,5milhões, mas economiza 200,5 milhões em combustível (3). Pior, David Neeleman reconhece que a companhia aérea aguenta enquanto o barril de combustível estiver “abaixo de €50”. A TAP está à mercê da subida do preço do petróleo, o que evidencia a importância de diminuir custos (4).

Entre os custos a reduzir estão os de Assistência em Terra, serviços prestados pela Groundforce, desde há anos detida a 50,1% por privados e 49,9% pela TAP. Esta empresa nasce da autonomização de um departamento da TAP, tem historial atribulado, ainda mantém algum do regime de trabalho da TAP, depois de cortes significativos sem os quais não seria viável.

*Natal 2006 – a greve do SITAVA

O Sitava anuncia greve para Natal/Ano Novo de 2016. Segundo o Expresso, “depois de contactos entre o gabinete do primeiro-ministro e a direcção da CGTP, onde está integrado o Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos”.

O sindicato quer que “o contrato que a TAP tem com os serviços de handling prestados pela Groundforce seja renovado em Junho”. Segundo um sindicalista “Assim que assuma o seu lugar como accionista maioritário da TAP poderá faze-lo, e assim dar as garantias de que a empresa continuará com a sua estrutura e com os postos de trabalho” (5). E a greve é desconvocada.

Por outras palavras, uma interferência politica do accionista estado português politico partidário a travar a redução de custos proposto pela Comissão Executiva a agir no quadro do acordo accionista [ver a seguir].

*Informação (possível) sobre o acordo accionista Estado/Atlantic Gateway

É claro que o Sitava já obteve o que queria para proteger a Groundforce da fatal redução de custos e agora volta à carga com a vigilância e segurança privada dos aeroportos nacionais.

Isto até seria normal dentro da anormalidade de greves que fazem reféns os utilizadores de serviços públicos ou equiparados, como é o caso. Acontece que pode haver algo de grave nos bastidores.

Em entrevista recente ao Publituris (6), David Neeleman afirma o que já adivinhávamos:

-”se me perguntar se era o que eu sonhava quando, em conjunto com o meu sócio HP, vencemos a privatização da TAP, a minha resposta sincera é que nunca poderia imaginar tal alteração e não a desejava.
Mas a vida é o que é e temos de nos saber ajustar às suas mudanças” […]

-“Aceitámos negociar e estabelecer um novo modelo com este Governo e, hoje, estamos confortáveis com o acordo a que chegámos”,

-“Na negociação, estabelecemos três pressupostos sem os quais não pretendíamos continuar, mas felizmente foi possível serem satisfeitos.”,

-“Concordámos que o Estado reforçasse a sua participação social desde que a Atlantic Gateway pudesse gerir a TAP sem interferências políticas – a comissão executiva ser exclusivamente privada.”,

-“o plano estratégico definido por nós, e com o qual vencemos a privatização fosse aceite pelo novo Governo”,

-“Os nossos direitos económicos [superiores à percentagem de capital] ficassem salvaguardados.”,

-“o Governo nos ajudasse na melhoria das condições financeiras existentes para a TAP”.

-“Com estes pressupostos garantidos e assentes num acordo de accionistas com o Governo que nos protege de alterações e interferências nestes domínios, foi possível continuar este projecto tão aliciante para nós e sobretudo para Portugal.”.

*Perante a falta de informação, a pergunta legítima

Perante a incapacidade do regulador ANAC, a nova estrutura accionista da TAP mantém a política de informação pública parcelar e eufórica do ‘povo’ (sobre rotas, records mensais de passageiros e similares) e de não divulgação sistemática da informação institucional que se exige a uma grande empresa.

O único Relatório 2016 que a TAP publica até agora refere tudo o que há de importante, mas omite o “Project RISE: Transforming TAP into a more efficient and agile flag airline carrier” –

Este é um projecto da Comissão Executiva, a tal que David Neeleman refere como trabalhando sem “interferências políticas” e “ser exclusivamente privada”.

A pergunta legítima é:
-depois do acordo accionista resistir à pressão política de Rui Moreira sobre as rotas que a TAP cancela, está ou não o governo a ir longe demais com as garantias que há meses deu ao Sitava?

Vozes de burro não chegam ao céu, pelo que não teremos resposta a esta pergunta.


A Bem da Nação

Lisboa 12 Abril 2017

Sérgio Palma Brito


Notas

(1)Ver 2017.04.12 Jornal de Negócios Greve de segurança nos aeroportos começou hoje

(2) Ver
-2016.10.04 Fernando Pinto anuncia plano de redução de custos da TAP em 150 milhões de euros
-2016.10.04 Afinal, não era imaginação. TAP quer mesmo cortar 150 milhões em custos

(3)Ver Grupo TAP, TAP – Transportes Aéreos Portugueses, SGPS, S.A., RELATÓRIO DE GESTÃO (PRINCIPAIS FACTOS) E CONTAS DO EXERCÍCIO (Consolidação)

(4)Ver 2016.09.27 TAP quer cortar custos pela eficiência sem despedimentos 27.09.2016 22h46

(5)Ver 2016.12.26 Intervenção do Governo faz cancelar greve nos aeroportos


(6)Publituris (17 Março 2017)

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