ANA e aeroporto de Lisboa – quando um País é vítima do ruminar de desgraças

O artigo de Nicolau Santos, Editor de Economia do Expresso, no Expresso Diário de 18 de Novembro* exige ser contextualizado ou corrigido.

1)No caso concreto da infra-estrutura aeroportuária, a decisão de privatizar a ANA em ligação com o Novo Aeroporto de Lisboa data do governo Sócrates e a ideia remonta a 1998. Em 2011 passa a ser uma exigência do resgate, em acordo assinado pelo primeiro-ministro Sócrates.

2)O governo PSD/CDS apenas executa a privatização, porventura com prazer ideológico. Erra quando faz do encaixe o critério prioritário e erra dramaticamente quando acelera a privatização para a receita contar para o deficit de 2012.

3)No blogue e sem meios acompanhei a privatização da ANA a par e passo. Apesar de esforços meus, não vi oposição PS, jornalismo de referência ou universidades a exercer vigilância democrática. Para mim, partilham a responsabilidade do governo.

4)A pressa da privatização tem consequências nefastas de que destacamos: i)o violar das recomendações internacionais em geral e no caso particular de ‘mealheiro único’ para receitas aviação e não aviação e, sobretudo, de um Service Level Agreement decente e não a treta acordada; ii)o haver subsidiação cruzada entre aeroportos (Lisboa e Açores) um instrumento de politica regional privatizado no molho. Em síntese, o erro não foi a privatização foi este duplo erro do governo /encaixe e deficit 2012) e a ausência lorpa de oposição política,  da opinião publica e academia.

5)Não sei se o governo “por razões ligadas ao combate politico” travou o aeroporto de Benavente – desde 2011 estava claro que ninguém financiaria o aeroporto. A avaliação de Nicolau Santos não cola com a realidade.

6)Desde o início da OTA, praticamente toda a indústria do turismo e muita gente defendia que a competitividade do destino Lisboa sofreria com a perda da Portela.

7)Entre 2006/07, o secretário de Estado do Turismo Bernardo Trindade defende Portela mais Montijo. Esta passa a ser a proposta do turismo de Lisboa e da Confederação do Turismo Português.

8)Ignoro o gosto musical da Vinci, sei que a defesa da opção Portela mais Montijo visa defender a competitividade do destino turístico centrado em Lisboa e é bem anterior à Vinci.

9)A obra de expansão (então provisória) da Portela é uma velha ideia, que Mário Lino decide implementar e Sérgio Monteiro inaugura em Julho de 2013. Nessa ocasião, a ideia dominante e discreta era que a Portela aguentaria até haver Portela+Montijo. Sei de duas ou três pessoas que conhecem o transporte aéreo em Portugal. Todas têm a honestidade intelectual de reconhecer que não previram o que aí viria … a partir de 2014.

10)No Outono de 2013 e depois de um processo em maturação desde meses, a Ryanair conhece uma reconversão estratégica profunda. Em três anos faz quatro previsões de crescimento de tráfego – no exercício que termina a 31 de Março de 2017 transporta 119 milhões de passageiros, um aumento de 12.6 milhões de passageiros em relação ao exercício anterior. A primeira previsão de tráfego dava 81.7 milhões para 2014. É só fazer as contas.


11)A Ryanair começa a operar em Lisboa em 2014 - no final de 2016, a nossa previsão é que transporta 2.700 milhões de passageiros (um milhão em 2014 e dois milhões em 2015). E faz isto sem apoio publico. Faz porque a capacidade de atracção do destino Lisboa e a pressão do mercado (a Ryanair é cotada numa bolsa a sério) alteram a relação de forças – Ryanair precisa de Lisboa e vai crescer se tiver um aeroporto competitivo no Montijo.

12)Peso que foi esta nova realidade que leva Pires de Lima a relançar o projecto Montijo. E é a esta realidade que o governo do PS tem de responder. A ideologia? A ideologia está onde, neste tipo de decisões deve estar – na gaveta, onde encontrará o socialismo, e no caixote do lixo da politica económica.

13)Se a informação que tenho é boa, e penso que é, a pista diagonal da Portela só será encerrada após a abertura do Montijo e, vejam lá, para dar lugar a uma operação eficiente do hub da TAP.

14)Quanto a “se passar a haver apenas uma pista, parece evidente que haverá um maior constrangimento para o número de aviões que, por hora, podem aterrar” – é a cena parva das ‘iludências aparudem’ e aconselhamos Nicolau Santos a informar-se sobre a percentagem de tráfego nesta pista (cito de cor, cerca de 3%) e sobre a possibilidade de operação conjunta das duas pistas.

15)Passo sobre o parágrafo em que NS explica o que os portugueses deviam ter feito. Passo sobre a cena do “lucro e bem comum”. 

Não passo sobre a TAP transportar “80% dos passageiros que aterram na Portela”. Desde 2001, parte da TAP no aeroporto de Lisboa atinge o pico de 59,1% em 2013, depois com o efeito Ryamair desce para 56,2 em 2015, 51% em 2015 e prevejo 48,2% em 2016. Como é possivel, Nicolau?

Last but not the least. Estou farto da tirada em que NS e outros insistem de “um País de cócoras perante um privado”. Portugal não está nem estará de cócoras. De cócoras perante o futuro está o espírito que sustenta todo este texto e outros como este. Nele não há uma única ideia para o futuro. Só ruminar desgraças e lamentos.


A Bem da Nação

Lisboa 19 de Novembro de 2016

Sérgio Palma Brito

*2016.10.18.Expresso

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