Transporte Aéreo e Acessibilidade Internacional
à
Oferta de Turismo do Algarve

A proposta dos agentes da economia do turismo
O Diário Económico [2011.07.15] informa que “Os maiores grupos hoteleiros do País” propõem ao Governo apoio financeiro para “levar as companhias aéreas de bandeira, de volta a Faro, como Tap, Ibéria, British Airways, Air France e Lufthansa”. Na prática, trata-se de ligar o Aeroporto de Faro aos hubs europeus destas companhias, para atrair residentes na Europa e em outros Continentes.
A “proposta tem de ser maturada” e ainda não há a “noção de quanto se terá de investir para levar as grandes companhias a Faro”.
O destaque da notícia e o editorial do DE remetem-nos para duas realidades pouco gloriosas. Por um lado, o velho principio de “com governo novo, deixa abanar a ver se cai”. Por outro, em plena silly season, é fácil a imprensa destacar uma “proposta [que] tem de ser maturada e perceber quais os recursos que a ela se têm de alocar”.
Com Manuel Pinho e euros nos cofres, esta informalidade era possível, teríamos festa e até uma cena tipo prós e prós, na “mina de sal de Loulé”.

A formalização da proposta, no quadro da Concertação Estratégica entre Governo e Confederação do Turismo Português
Por mais pragmáticos que queiramos ser, este é um teste à nossa capacidade de formalizar uma genuína Concertação Estratégica entre o Governo e a Confederação do Turismo Português. No seu âmbito e a nível regional, terá lugar a colaboração entre a representação formal dos agentes privados e o Governo/Administração.
Importa insistir em algo de esquecido: a Informalidade é a primeira Barreira à Produtividade e as boas práticas obrigam-nos a que a minimizemos. Seria desastroso que o número de telemóvel do Álvaro substituísse o de Manuel Pinho, para ultrapassar estrangulamentos ou organizar acções concretas e justificadas pelo pragmatismo.
Neste caso, a natureza dos parceiros estrangeiros implica um alto grau de formalização e de rigor no plano de negócios. Os poucos e emprestados euros que estão nos cofres do País não permitem derramar euros sobre problemas, como em 2008/2009. O apoio público tem de ser justificado e avaliado, em rigor e moldes diferentes do dos anos recentes.

A proposta no contexto da acessibilidade aérea à oferta do turismo do Algarve
O transporte aéreo para uma Área Turística, como o Algarve (formada, do zero, em torno do aeroporto de chegada), começa por assentar nas cadeias de voos fretados dos operadores de holiday package e nunca nas Full Service Carriers – em 1983, a percentagem do Táfego Não Regular, no Aeroporto de Faro, é de 83%.
A partir da segunda metade da década de 1990, com a desregulamentação dos direitos de tráfego no espaço aéreo da União Europeia, o transporte aéreo para uma Área Turística passa a assentar em Companhias Inovadoras, – em 2010, estas Companhias representam 75% do Tráfego Comercial do Aeroporto de Faro, as Companhias Charter representam 15% e as Full Sevice Carriers, 10%.
À Falta de melhor designamos por Companhias Inovadoras, de que as low cost são as mais conhecidas, todas as que se adaptam às alterações do mercado turístico e criam uma nova procura.
Em qualquer dos casos, as Full Service Carriers (no modelo inicial de ponto a ponto ou no mais recente de hub and spoke) têm custos incompatíveis com o tráfego leisure, do modelo de negócio de áreas turísticas, como o Algarve. Actualmente, as ligações e frequências que mantêm são poucas e não se vislumbra que esta situação se altere profundamente.
Seria um erro criar ilusões sobre os resultados da proposta dos “maiores grupos hoteleiros do País” e não intensificar os esforços para assegurar a competitividade do modelo de transporte aéreo que temos. Dependemos dele e ele não depende de nós, o que nunca é agradável. Vejamos os méritos, antes de situar os perigos.

O mérito da proposta
As actuais rotas e frequências das Companhias Inovadoras não respondem às exigência de clientes que ainda recusam voar em low cost e não estão ligadas a voos intercontinentais.
Em volume que desconhecemos, as ligações por Full Service Carriers podem alargar a procura a quem recusa viajar em companhias low cost e similares e se dispõe a pagar preço mais elevado. Pode, ainda, contribuir para o posicionamento do golfe do Algarve em países como os EUA.
A ligação a voos intercontinentais alarga a procura de eventos da Meet Industry, a realizar no Algarve – encontros, conferências e incentivos, em geral, na época baixa.
A proposta dos “grandes grupos” não é nova. O que pode ser novo é fazer algo de concreto. A oferta existente é apenas Lisboa. A ligação mais evidente é a de Madrid, de que se fala há anos. Depois, é o sonho: Heathrow, Charles de Gaule, Frankfurt e Munique.
A proposta a elaborar é nova e diferente do modelo que tem vindo a ser utilizado, no caso das Companhias Inovadoras, com contrato com ANA – TdP – ATA. Este é problema que visão larga e bom apoio técnico resolverão. Quanto ao sucesso da iniciativa, quem viver, verá. 

O perigo da proposta
Tal como anunciada pelo Diário Económico, a proposta pode levar os agentes da Economia do Turismo e da Intervenção Pública a desviar a sua preciosa atenção do que é essencial e alimentar uma ilusão sobre a procura para a oferta de turismo do Algarve.
Em nossa opinião, entre o que é essencial, temos:
  • a acessibilidade internacional ao Algarve começa por depender do posicionamento da marca e da oferta da área turística nos mecanismo de informação / sedução / distribuição on line – estamos muito longe disso e, cada dia, aumentamos o atraso;
  • estamos a insistir num erro comprovado (o velho conceito de Promoção Turística), a iniciar outro (o Estado a intervir na Distribuição);
  • o mínimo exigível não está a ser feito – basta medir o atraso dos timmings das acções de Promoção Turística nas catchment areas dos aeroportos de partida das rotas apoiadas, em relação aos dos voos;
  • a recuperação do mercado de língua alemã e a renovação de gerações da procura no mercado do Reino Unido (apenas dois exemplos) exigem programas trienais de Marketing Estratégico e Operacional e não o repetir da esgotada Promoção Turística;
  • não há notícias de Governo e Confederação do Turismo Português, minimizarem a informalidade das relações entre “os grandes grupos” e o Estado, pela urgente recuperação da agora desacreditada Contratualização, a nível central, entre o Governo e a CTP;
  • assim sendo, não pode haver boas notícias da operacionalização, a nível dos destinos regionais (de que o Algarve é exemplo atípico), extinguindo os Pólos, reconvertendo dramaticamente as Entidades Regionais, a fundir com as Agências Regionais de Promoção Turística, de modo a reforçar marcas já presentes no mercado.
O sucesso a obter e o perigo a evitar
Só circunstâncias excepcionais porão Full Servive Carriers a voar para Faro, tal como descrito pelo DE. Poderão voar e vir a ter importância qualitativa.
Seria mau que esta cena reforçasse a informalidade na relação Privados/Estado e, pior, distraísse as atenções dos agentes da Economia do Turismo e da Intervenção Pública do que é verdadeiramente importante para o Algarve e País.

Albufeira 22 de Julho de 2011
Sérgio Palma Brito

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