O erro que destrói a credibilidade do Relatório da Comissão Técnica Independente

 

Este é um dos posts curtos destinados a sanear o debate do Relatório da ANA sobre o Novo Aeroporto de Lisboa.

Neste post, denunciamos um erro crucial que

-invalida, de uma assentada, o Relatório da Comissão Técnica Independente (CTI),

-desvaloriza as criticas que a Presidente da Comissão já começou a fazer ao Relatório da ANA.

1.No Podcast de Daniel Oliveira “Perguntar não ofende”, a iniciativa é de Daniel Oliveira :

-“Portugal terá condições pela sua localização para ser porta de entrada das Américas para a Europa?” (Expresso 2023.12.19).

A resposta da Presidente (CTI) ilustra o erro de base em que assenta a análise da Comissão:

-“Toda a análise económica que fizemos está fortemente apoiada neste pressuposto”.

Por outras palavras,

-“Toda a análise económica que fizemos está fortemente apoiada num Pressuposto errado e, logo, está fortemente errada”.

Na Universidade assistimos ao momento em que um erro do aluno mostra desconhecer elementos fundamentais da matéria e o professor diz:

-“O seu exame acaba aqui”.

Aplica-se aqui, porque

-não há ‘porta de entrada das Américas na Europa’. Há Lisboa porta de entrada do Brasil na Europa e Madrid porta da América Latina (ver gráfico) - ainda assim, nas rotas mais rentáveis de Rio e São Paulo a posição da TAP não é dominante.

Contamos publicar uma síntese muito critica dos argumentos do Relatório da CTI, mas este erro, só por si, destrói o documento.

2.A pergunta induz em erro por não haver uma porta de entrada das Américas para a Europa, mas sim várias portas, a maioria das quais mais importante do que o aeroporto de Lisboa, Novo ou Velho.

É megalomania excessiva pensar que o tráfego ‘das Americas’ para Heathrow, Charles de Gaule, Schipol, Francofrte e tantos outros hubs pode ser deslocado para o Novo Aeroporto de Lisboa.

A figura 61 do Relatório da ANA ilustra a Capacidade total de lugares dos aeroportos em voos não europeus para os aeroportos concorrentes ou similares a Lisboa.

Apesar de não ilustrar esta informação de outros hubs, podemos comparar o tráfego a verde e amarelo de Madrid com o de Lisboa, que ninguém imagina ver transferido para Lisboa.

 


Figura 61: Capacidade total de lugares dos aeroportos em voos não europeus (Fonte: OAG}.

 3.Há portugueses que não sabem ou não aprendem.

A abertura do Canal do Panamá em 1914 provoca delírios que é útil recordar. Em 2015, é a vez do porto de Lisboa ser “Caes da Europa, da África, da América e do Oriente”.

Nem mais, Europa, Africa, América e Oriente,

Entre várias fontes, citamos o Relatório de 2015 da modesta Repartição de Turismo:

– “Caes da Europa, da África, da América e do Oriente, é este famoso porto de Lisboa, que os poetas cantaram e que é o nosso orgulho, a nossa esperança e a nossa força, sel-o-ha do mundo, com o corte do istmo do centro-americana, que em ferente dele fica e mais próximo está que aquele outro do velho do continente, pois dista de Colon (Panamá) 4110 milhas, menos 460 que o Havre.”.

O sonho faz sonhar. O Relatório da Repartição de Turismo conclui:

– “Temos assim demonstrado que Portugal é a ponte natural que há-de servir os outros países nas suas relações internacionais.”.

Lisboa 20 de janeiro de 2013

Post da serie Atualidade

Políticas Públicas na privatização da ANA (1996 a 2012) e algumas surpresas

 

António Gutteres, José Sócrates Pedro Passos Coelho animaram políticas publicas diferentes sobre a privatização da ANA.

*Uma empresa a privatizar… mesmo antes de existir –

No Outono de 1995, António Guterres sucede a Aníbal Cavaco Silva como primeiro-ministro. A ANA SA, tal como a conhecemos, ainda não existe, mas já figura nos dois Programas de Privatizações do governo socialista.

-em março de 1996, o de 1996/97 prevê “iniciar os trabalhos tendentes à privatização ANA, E. P., mantendo o Estado o controlo maioritário.”.

-em abril de 1997, o de 1998/99 é perentório: “Em 1998 realizar-se-á a primeira fase de privatização da ANA”..

Quando é criada, em 1998, a ANA já tem a sina traçada.



*António Gutteres e um PS muito diferente do de hoje

Em fevereiro de 1996, uma Resolução do Conselho de Ministros aprova o Programa de privatizações — 1996/1997. Do preâmbulo citamos:

-“É hoje opinião consensual que, pelo menos em determinados domínios da atividade empresarial, a gestão privada é preferível à gestão pública, pelo que haverá que, nesses domínios, operar a transferência dos centros de decisão económica para a esfera do sector privado e garantir a formação de adequados níveis de concorrência indutores de uma eficiente afetação de recursos.”.

*A privatização da ANA passa a ser indissociável do financiamento do Novo Aeroporto de Lisboa… na Ota

Em abril de 1998 é criada a Cria a NAER - Novo Aeroporto, S. A., e são aprovados os respetivos estatutos. O governo considera que

-“a condução dos trabalhos necessários à preparação e execução das decisões referentes ao planeamento e construção de um novo aeroporto seria mais eficaz, flexível e celeremente conduzida por uma estrutura de natureza empresarial distinta da empresa operadora dos aeroportos do continente”.

Em abril de 2000, o governo destaca os objetivos e orientações para o desenvolvimento do aeroporto na Ota:

– “Estabelecimento de uma parceria público-privada que articule a contratação da conceção, construção, financiamento e exploração da nova infraestrutura com a entrada de acionista privado de referência no capital da ANA, mediante aumento de capital;

Escolha de parceiros privados através de um procedimento concursal, a estabelecer em regime jurídico específico;”.

Está em causa o financiamento por PPP e fica no ar qual o controlo do capital da ANA.

*Privatização da ANA com “percentagem de controlo do capital” para o NAL na Ota e, depois, em Alcochete

Em fevereiro de 2007, o governo de José Sócrates “Estabelece o modelo de transação, do novo aeroporto de Lisboa, determinando que a privatização da ANA, S. A., e a contratação da conceção, construção, financiamento e exploração do novo aeroporto de Lisboa, a localizar na Ota, serão efetuadas através de uma operação única que conjugue aquelas duas componentes”.

Esta decisão prevê a “Alienação de uma percentagem de controlo do capital da ANA - Aeroportos de Portugal, S. A.”.

Só posteriormente surge o NAL em Alcochete.



*Maio 2011: Memorandum of Understanding on Specific Economic Policy Conditionality

Cabe ao governo de Pedro Passos Coelho aplicar o Memorando assinado pelo governo de José Sócrates e a Troika. Na altura está em causa recuperar o crédito na República nos mercados financeiros.

A privatização da ANA deixa de ser instrumento para financiar a construção do NAL e passa a ser meio para realizar três objetivos, “no contexto do programa de ajustamento económico para Portugal”

“i) Maximização das receitas provenientes da privatização.

ii)Reforço do crescimento e da eficiência da ANA, aumentando desta forma a sua posição competitiva e o valor a longo prazo dos aeroportos.

iii)Minimização da exposição do Estado português aos riscos de execução relacionados com o processo de privatização, assegurando que o enquadramento deste processo protege cabalmente os interesses nacionais e maximiza as receitas.”.

Estes objetivos estão plasmados no Plano Estratégico de Transportes 2011/15 (ponto 8).



*Quando a política publica é fruto do confronto partidário

Dezassete anos demorou a ANA a ser privatizada e durante esse tempo ficou à vista o que de partidário há no exercício da função acionista pelo Estado.

A critica mais evidente ao excesso de ‘partido’ é a dirigida à privatização em bloco de todos os aeroportos do País,

– em 2000 e 2007, o governo PS era a favor e o PSD criticava fortemente,

– em 2012, o governo PSD/CDS era a favor e o PS criticava e continua a criticar fortemente.

Este confronto meramente partidário pode vir a ser dominante na atualidade.

*A critica mais pertinente à privatização da ANA

A critica mais pertinente à privatização da ANA é a da ausência de uma Regulação forte e independente. Os documentos do ICAO que citamos estabelecem as boas práticas sobre a privatização da gestão aeroportuária que deve sempre ser acompanhada por regulação forte e independente.

O problema de fundo duplo e será descrito no próximo post:

-Portugal não nem tradição nem pratica de Regulação ou Supervisão fortes e independentes,

-a transformação do INAC em Entidade Reguladora sofrer deste mal e da cultura que vem do passado.

A gestão publica pela ANA não era enquadrada por um Contrato de Concessão, elaborado quase à pressa para efeito da privatização. O modelo de Regulação que estava a ser desenhado pelo governo Sócrates é abandonado. Haverá apenas disposições sobre taxas aeroportuárias reguladas em sistema que remunera o crescimento do tráfego.

O Acordo entre o Estado português e a ANA – Aeroportos de Portugal, S.A. de 8 de janeiro de 2019 inclui

-“A competitividade das taxas [reguladas] é assegurada através de um processo comparativo com as taxas praticadas em outros aeroportos europeus, o qual terá como resultado a definição de um cap/limite às taxas reguladas.”.

Este Acordo acaba por não ser aplicado.

*Nota sobre fontes

Recomendamos a leitura de ICAO’s Policies on Charges for Airports and Air Navigation Services, edições de 2008 e 2012.

O livro The Economic Regultion of Airports, edição de 2004 e 2017 [editado por Peter Forsyth e outros] define o que está em causa e aplicações em aeroportos de todo o mundo. A edição de 2017 é mais útil por já poder dar mais exemplos e de forma mais sintética – o caso da ANA não é citado.

 

Lisboa 9 de janeiro de 2015.

 

Post da série Análise critica de ideias e termos correntes

 

O Algarve vai perder o comboio?

 

Proposta para o Algarve não perder o comboio

i)É preciso esquecer uma patética ligação em Alta Velocidade Lisboa / Évora / Beja/ Faro que figura algures num Plano Ferroviário Nacional.

Não justificamos a nossa afirmação por ser a nulidade desta ligação ser intuitiva e basta observar o slide para compreender.


Fonte - Intervenção do eng.º Carlos Fernandes no Congresso da ADFERSIT

ii)É preciso tirar partido da atual ligação Lisboa / Faro em Alfa Pendular ou equivalente.

A Terceira Travessia Sobre o Tejo permite que

-Alfa e Intercidades passem pela ligação entre Pinhal Novo e Gare do Oriente, o que ganha 10 a 15 minutos e evita o arreliante e demorado atravessar da ponte 25 de Abril,

-ligar à futura linha entre Pinhal Novo e o Aeroporto Luis de Camões.

iii)É preciso realizar um investimento de monta, a corrigir o traçado entre Ermidas-Sado e Faro, sobretudo na parte da Serra.

Desconhecemos estimativas, mas as que nos chegaram varia entre €150 a €250 milhões.

Este investimento permite

-eliminar a rota aérea entre Lisboa e Faro,

-melhorar o acesso ao interior da Serra

-desviar tráfego da A2.

Em nossa opinião, as adormecidas forças vivas do Algarve deviam concentrar esforços neste traçado.

Sem este investimento a ligação ferroviária Lisboa/Algarve passa a figurar no museu da ferrovia do passado.

É esta a herança que queremos deixar aos nossos netos?

iv)Esta proposta abre alguma possibilidade à ligação entre Lisboa / Algarve e Sevilha.

A ligação ferroviária Algarve Sevilha permite

-enriquecer a oferta cultural de uma estadia no Algarve com excursões a Sevilha e Granada/Córdoba, cujo posicionamento mundial é conhecido,

-desenvolver o turismo entre Lisboa e Sevilha.

As críticas das Padeiras de Aljubarrota que dormitam em alguns espíritos não devem impedir um forte lóbi do Algarve (… onde está ele?) para esta solução.

v)Ignoramos se contribuímos para acordar as forças vivas do Algarve para este genuíno PIR – Projeto de Interesse Regional.

Quem viver verá.

 

Lisboa 8 de janeiro de 2025


Post da serie Análise critica de ideias e termos correntes

 

A premonição do ministro da Obras Publicas Joaquim Ferreira do Amaral (1990/1995)

 

Neste dia 1 de janeiro de 2025, deixo-vos a premonição do ministro da Obras Publicas Joaquim Ferreira do Amaral (1990/1995) em 1994:


“cheguei à conclusão que construir o NAL não era a prioridade das prioridades. A Portela estava longe de estar esgotada. Por isso, propus adaptar o Aeroporto do Montijo a receber tráfego civil com vista a garantir um backup do aeroporto de Lisboa. Era uma solução provisória bastante barata, e que nos tranquilizava no sentido de, caso acontecesse algo, Lisboa não ficaria sem aeroporto.

Depois deu-se a mudança de Governo e não se avançou.”.

“Para dizer a verdade, julgo que o que fez com que se abandonasse esta hipótese foi o fascínio de um Novo Aeroporto.”.

“havia o fascínio de construir um Novo Aeroporto. As pessoas não gostam de soluções remendadas. Mas não tenho dúvida que teria sido a melhor solução, a mais barata, a mais rápida e teríamos provisoriamente o problema resolvido.

Depois, um dia, quando fossemos ricos, faríamos um Novo Aeroporto”.

Adivinhou! Em 2025 somos ricos!

Enjoy!