Do Centro de Congressos que falece à cidade de Lisboa – contexto da sua promoção


A promoção de um novo Centro de Congressos em Lisboa vem a público nas piores condições:

-o governo opõe-se e integra o assunto na campanha eleitoral em curso,

-a Associação da Hotelaria de Portugal, sem estudo prévio, exclui um novo Centro de Congressos em Lisboa.

O debate sobre o novo Centro de Congressos em Lisboa justifica dois posts:

-Do Centro de Congressos que falece à cidade de Lisboa – contexto da sua promoção,

-Do Centro de Congressos que falece à cidade de Lisboa – pontos prévios e críticos da sua promoção (aqui).

O título comum aos dois posts é inspirado por Francisco de Holanda com a sua Da fábrica que falece à cidade de Lisboa (wiki).

Intervimos como outsider atento, interessado e preocupado. Não somos ‘a favor/contra’, não escondemos o apoio à promoção do novo CdeC, mas aguardamos o estudo prévio que confirme a sua viabilidade.

Os dois posts são a nossa contribuição para o escrutínio dessa viabilidade.

 

Post publicado em 18 de Novembro, revisto a 20 e republicado a 29.

 

Introdução aos dois posts

*As exigências do sucesso do turismo em Lisboa
O recente surto de turismo em Lisboa começa por volta de 2003/2004 e está a ser um sucesso, que gera problemas e interrogações.

A continuidade do sucesso ao longo dos próximos anos exige qualificar a conjugação de governança nacional e municipal, iniciativa privada e opinião pública. 

O Centro de Congressos que falece à cidade de Lisboa é decisivo para esta ser competitiva no exigente mercado da Meetings Industry. O sucesso neste mercado condiciona a criação de valor pela economia do turismo em Lisboa.

A promoção do novo Centro de Congressos é um teste à capacidade de conjugação de esforços pelas quatro forças envolvidas.

*Ultrapassar o tempo da politics e de interesses conservadores
A construção do novo Centro de Congressos de Lisboa está na ordem do dia pelas piores razões: entrou na espiral destrutiva do que há de pior na politics da política, de interesses associativos conservadores.

Por seu lado, esta desastrada ordem do dia está prejudicada pela campanha eleitoral em curso e pelo ressuscitar do pior que há na relação entre política de turismo e indústria da hotelaria.

A opinião de quem conhece Portugal e do conselho que nos foi dado, é a deste contexto excluir a viabilidade de qualquer tentativa de debate objectivo sobre a promoção do Centro de Congressos. Sem ignorar este sábio aviso, é nossa opinião ser este o terreno fecundo para intervenção independente e para além de politics e interesses conservadores.

Esta é a origem dos dois posts sobre o Centro de Congressos.

 

1.Contexto da promoção do novo Centro de Congressos em Lisboa

*Janeiro de 2014 – informação da Associação Turismo de Lisboa
Em Janeiro de 2014 (1), o director-geral da Associação de Turismo de Lisboa aborda a Meetings Industry, lembra que "Lisboa atingiu o limite de crescimento neste segmento" e destaca a falta um centro de congressos com capacidade para até seis mil pessoas, o que elevará a cidade ao top 10 europeu dos grandes eventos.” Citamos Vítor Costa:

-"Só há nove cidades europeias com capacidade para captar alguns dos 140 eventos com mais de 3.500 pessoas que se realizam, anualmente, na Europa. Se tivéssemos a estrutura que falta, seriamos capazes de receber, de forma muito competitiva, alguns desses congressos".

-"É uma oportunidade importante, é preciso é que o Governo se decida a fazer investimentos nesta conjuntura de austeridade".

*Iniciativa municipal entre Janeiro e início de Outubro de 2014
Entre Janeiro e Outubro de 2014, a CML prepara duas iniciativas:

-criar Taxas Turísticas Municipais com receita a consignar num Fundo de Desenvolvimento Turístico destinado a financiar investimentos estruturantes, com o Centro de Congressos à cabeça,

-estudo prévio de difusão restrita sobre programa e financiamento do CdeC.

Com a informação de que dispomos, a CML comete três erros

-falta de abertura em dois processos fatalmente objecto de muito escrutínio público – só em Outubro a Associação de Hotelaria de Portugal é informada,

-anúncio das Taxas Turísticas Municipais no timing do Orçamento para 2015 e dessincronizado do timing da relação com a iniciativa privada,

-privilegiar o contacto com a AHP, fatalmente influenciada por problemas a nível nacional, e não com a industria da hotelaria de Lisboa directamente interessada no CdeC e em função desse interesse. 

*AHP – da negociação (7 de Outubro) à ruptura (10 de Novembro)
Sabemos que em 7 de Outubro (2) o vice-presidente Fernando Medina informa a AHP sobre a intenção do Município criar as taxas turísticas – aparentemente não menciona o novo CC. Segundo o Expresso, este email “levou a associação a criar um ‘grupo de trabalho’ para estudar o assunto”.

Ainda segundo o Expresso,

-“Os hotéis sempre foram contra as taxas, mas a AHP foi encostada à parede pela câmara e a ideia foi: já que vêm aí as taxas, ao menos que isto reverta a favor do turismo” e “nada ficou acordado nem houve qualquer acordo”, como uma “fonte ligada ao processo” informa o Expresso.

-“a direcção da AHP colaborou com a autarquia sem ouvir previamente os associados, e contrariando posições anteriores”.

A 5 de Novembro, a AHP escreve à CML. Segundo o Expresso “ficou expresso que a proposta teria de ser aprovada no conselho geral da associação, agendado para 10 de Novembro”.

O Diário de Notícias (3) dá informação adicional sobre a negociação entre CML e AHP. O Presidente afirma: "A primeira proposta do Fernando Medina era que fosse uma taxa diferenciada, como existe em Barcelona, mas nós defendemos que tinha de ser uma taxa plana, igual para toda a cadeia de turismo". A AHP esclarece que não queria apenas uma taxa "cobrada aos hotéis", mas "sendo paga por toda a gente, desde os tuk tuk até a um grande hotel". A AHP consegue que a CML desista da taxa diferenciada.

Aqui surge a “fonte governamental” citada pelo Expresso:

-“Como é possível que alguém que processou a Câmara de Aveiro quando lançou a taxa turística, agora aceitasse esta taxa como inevitável, só porque era António Costa, apoiado apenas por dois ou três hoteleiros?”.

O Governo vai encarregar-se de corrigir o que considera ser uma contradição nas posições da AHP.

*“Pires de Lima mobilizou os hotéis contra Costa”
O Expresso de 14 de Novembro informa-nos como “Pires de Lima mobilizou os hotéis contra Costa” durante os dias que antecedem a reunião do conselho geral da AHP, na Segunda-Feira 10 da parte da tarde:

-“Esta semana circulavam rumores, em meios ligados ao turismo, sobre pressões que teriam sido exercidas pelo Ministro da Economia sobre os hoteleiros, no sentido de os alinhar contra a iniciativa da CML”.

O Expresso cita o Ministro:

-“Não fiz pressão absolutamente nenhuma”,

-“num certo sentido, zelei pela consistência da posição dos hoteleiros, que sempre foram contra estas taxas e não viam necessidade de um novo centro de congressos em Lisboa”,

-“Limitei-me a alertar algumas pessoas que fazem parte da AHP para o que se estava a passar, e elas depois tomaram as decisões que tomaram”.

Não gostamos desta personalização. Pires de Lima é Ministro da Economia e quando diz “alertar” é o Governo que alerta, seja lá o que isto quer dizer.

Em quase cinquenta anos de turismo em Portugal, assistimos a muita intervenção excessiva e abusiva de Governo e Administração na actividade associativa e junto de empresários. Nunca vimos este assumir de uma intervenção que diz muito sobre o que há de errado na relação entre política e administração de turismo e iniciativa privada.

*Manhã de 10 de Novembro de 2014 – a taxa municipal
Na manhã de 10 de Novembro a Câmara Municipal apresenta o orçamento para 2015 (4). Sobre “Investir no Turismo do Futuro” destaca que “Mais e melhor turismo exige novos investimentos” e o primeiro destes é o “Novo Centro de Congressos no Centro da Cidade”. Seguem duas propostas:

-“No âmbito do diálogo com a Associação de Hotelaria de Portugal (AHP), propomos ao sector do Turismo criar o Fundo de Desenvolvimento Turístico de Lisboa

-Financiar estes projectos através de uma taxa turística de €1 sobre as dormidas e €1 sobre as chegadas de turistas ao aeroporto e ao porto de Lisboa.”.

Segundo o Expresso do dia 14, “a Câmara ‘saltou por cima dos hoteleiros’ ao aprovar o orçamento nesse dia [10 de Novembro], em esperar a decisão do conselho geral, que decorreu horas depois”.

Aqui, ou o Expresso está mal informado ou não compreendemos a atitude da CML, que rompe o acordado, na manhã do dia da reunião do Conselho Geral da AHP e quando certamente conhece o “alertar” do Governo.

*Taxa e não o Centro de Congressos domina a comunicação social
Imediatamente depois (11H48), o título do Publico online é “Câmara de Lisboa avança com taxa turística que Pires de Lima não queria” (5). Segundo documento a que o Publico tem acesso, a taxa “terá como destinatários os turistas da cidade, chamados assim para contribuir na manutenção e investimento público realizado/a realizar pelo município nesta área” e financia um “Fundo de Desenvolvimento Turístico”.

Por seu lado, o Presidente da Câmara afirma 

-"Não é uma receita municipal. É uma receita consignada ao fundo",

-"não será feita exclusivamente pela câmara", mas sim "em processo de co-decisão com os parceiros" do sector do turismo, que serão chamados a pronunciar-se sobre quais os investimentos que "reconhecem como mais-valias" para esta área.

*Tarde de 10 de Novembro – reunião do Conselho Geral da AHP
A apresentação da CML a violar o acordado com a AHP e o destaque pela comunicação social reforçam a intervenção do Governo em condicionar a reunião do Conselho Geral da AHP. Segundo o Expresso,

-“Nesta altura, já o lóbi de Pires de Lima junto dos hoteleiros teria surtido efeito, tendo levado ao conselho geral empresários que não costumam ir a estas reuniões”,

-“Os telefonemas de Pires de Lima aos hoteleiros foram decisivos para que conselho geral da AHP, na segunda-feira à tarde, resultasse num esmagador ‘não’ àquilo que Costa tinha anunciado poucas horas antes”.

A posição do Conselho não se limita ao recusar das taxas e vai mais longe:

-sem debate publico, sem estudo que sustente a sua posição e por unanimidade, os hoteleiros recusam e condenam liminarmente a promoção do novo Centro de Congressos.

Ficamos a conhecer os argumentos durante a conferência de imprensa que segue.

*Fim de dia de 10 de Novembro – conferência de imprensa da AHP
Na conferência de imprensa depois da reunião (6), o Presidente da AHP declara:

-"Não à taxa e não à construção de um centro de congressos. Nesta altura, é inoportuno avançar com um centro de congressos que vai custar 57 milhões de euros. Os hoteleiros não estão interessados, nem Lisboa está interessada neste investimento".

O Presidente

-discorda do dinheiro do fundo de desenvolvimento turístico estar “consignado claramente" para a construção do futuro centro de congressos, projecto considerado "âncora" pelo município, no âmbito do Plano Estratégico de Turismo definido para a cidade, com o objectivo de colocar Lisboa na rota do mercado internacional de congressos,

-defende que há espaços na capital que, depois de recuperados e requalificados, podem receber congressos, até porque apenas um terço se realiza em centros de congressos idênticos àquele projectado para Lisboa.

-disse ainda haver outras prioridades na cidade, como "tapar buracos, arranjar os passeios ou tratar do lixo", antes de se avançar com "megaempreendimentos".

-adverte que "Seria bom que a Câmara de Lisboa revisse esta posição, até pelo desgaste que ela pode trazer, tendo em conta o contexto político actual",

-frisa que os hoteleiros temem que, caso a Câmara de Lisboa avance com a Taxa Municipal Turística, o modelo possa ser seguido por outras autarquias do país e acrescenta que "Os hoteleiros não se revêem nesta proposta que torna Lisboa numa cidade mal vista e não amiga dos turistas".

*Esclarecimento sobre hoteleiros e centro de congressos
Na guerra das taxas turísticas de Lisboa, criticámos a posição dos hoteleiros de Lisboa em ir mais além da recusa das taxas para recusar liminarmente a promoção de um novo Centro de Congressos (aqui e aqui).

A nossa fonte de informação são estas declarações do Presidente da AHP, a 10 de Novembro depois da reunião do Conselho Geral. Depois de lermos quase todos os online, escolhemos a notícia do Dinheiro Digital, por ser a mais completa.

Dado o absurdo desta posição e conhecimento pessoal de muitos dos hoteleiros, falámos com alguns e não haverá recusa em estudar o assunto.

Com base no que dizem, o Presidente da AHP deveria ter acrescentado:

-“Os hoteleiros estão disponíveis e interessados em estudar a promoção de um novo Centro de Congressos, com modelo de financiamento a definir”.

*Esclarecimento sobre taxas turísticas municipais em Lisboa
A 19 de Novembro, a Câmara Municipal aprova o Orçamento para 2015 nos termos da apresentação feita no dia 10 de Manhã e abre consulta pública, até 3 de Dezembro, sobre as taxas turísticas municipais em Lisboa.

Feito isto, imporá listar os ‘novos investimentos’ previstos no Plano Estratégico de Turismo 2015-2019:

-Novo Centro de Congressos no Centro da Cidade,

-Requalificação da Estação Sul-Sueste / Gare marítimo-turística,

-Instalação de espaço museológico dedicado às Descobertas,

-Criação de “Mobilidades Suaves para o Castelo”,

-Projeto de sinalética turística e de percursos turísticos”

-Continuação da requalificação da frente ribeirinha (como exemplo o Cais do Sodré, Campo das Cebolas e Belém).

*Que fazer?
A ‘conjugação de governança nacional e municipal, iniciativa privada e opinião pública’ é um modelo teórico, mas a sua degradação é total:

-Câmara Municipal erra na informação e mobilização das partes interessadas na promoção do Centro de Congressos,

-Governo integra as taxas e o novo Centro de Congressos na pior das politics da politica e na campanha eleitoral em curso,

-Governo interfere activamente junto de empresários para que a direcção da sua associação inverta a decisão de negociação com a Câmara Municipal,

-hoteleiros comprometidos publicamente contra a promoção do novo Centro de Congressos da cidade.

 

A Bem da Nação

Lisboa 29 de Novembro de 2014

Sérgio Palma Brito

 

Notas

(1)Dinheiro Vivo de 27 de Janeiro de 2014


(2)Expresso de 14 de Novembro de 2014 – as referências a Expresso têm esta fonte.

(3)Diário de Notícias de 14 de Novembro de 2014


(4)Ver apresentação em


e power point em


(5)Publico online em


(6)Se bem percebemos é noticia da Lusa – baseamo-nos em Dinheiro Digital de 11 de Novembro de 2014, às 10H43, em

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