Reestruturação da TAP pelo accionista privado


No presente post listamos opções para a reestruturação da TAP pelo accionista privado, sem cair no ridículo de detalhar decisões que venha a tomar. Dividimos as opções em três grupos:

-criar as bases de uma nova TAP,

-estatuto do pessoal e renovação da frota,

-a nova TAP no mercado.

Se a privatização falhar, esta proposta é também uma check list para o ‘accionista estado político partidário’ liderar a recuperação da empresa (aqui).

 

Informação ao leitor

O presente post tem versão em PDF está disponível (aqui).

O leitor deve estar informado sobre os Princípios Gerais do blogue.

A lista dos posts sobre a TAP já publicados pelo blogue está acessível aqui.

 

 

1.Criar as bases de uma nova TAP

*Uma nova TAP

A ‘nova TAP no mercado’ começa por assumir a realidade que não é demais recordar:

-uma empresa à qual se exige ser rentável em mercado aberto e sem ajuda do Estado não pode garantir nada que comprometa a sua rentabilidade,

-afirmações ou exigências de ‘o accionista privado garante’ só fazem sentido se não condicionarem a gestão e forem limitadas no tempo – ver o caso dos slots de Heathrow na oferta de compra da Ryanair pelo grupo IAG (aqui).

Esta grande orientação estratégica condiciona tudo o que segue.

*Viabilidade do modelo da TAP independente

A TAP é companhia aérea média (54ª posição no ranking das companhias aéreas por PKU’s) e a sua sustentabilidade começa pela resposta a esta pergunta (1). TAP, Finnair e Aer Lingus combinam rede de rotas short haul ligadas a um aeroporto base e hub intercontinental (Lisboa, Helsínquia e Dublin). Cada uma à sua maneira, têm de responder às mesmas perguntas:

-qual a viabilidade de companhia de nicho numa indústria em consolidação?

-como conciliar operação intercontinental em longo curso e concorrência de outras companhias full service com rede europeia e concorrência de companhias low cost?

*Empresa como comunidade de accionistas, gestores, trabalhadores

Pode haver mil e uma definições, mas no essencial

-a empresa é uma comunidade de accionistas, gestores e trabalhadores que partilham uma identidade e realização de fins, com base em objectivos acordados.

O accionista privado tem de criar esta comunidade a partir da sua perversão ao longo dos quarenta anos da TAP nacionalizada.

A medida mais imediata é libertar a accionista e gestão das regras que o Estado impõe às suas empresas e que são incompatíveis com as exigências da gestão.

A segunda medida reside na inovação na relação entre accionista e gestão e inclui

-reanimação de uma relação desgastada pela fraqueza inerente ao ‘accionista estado estado português político partidário’  

-contrato de gestão, com o recuperar da exigência de remuneração do capital e responsabilização/prestação de contas pela gestão.

No conveniente ‘esquecimento’ em que este tema caiu, há inversão de valores entre afirmar ‘o estado não mete dinheiro na TAP desde 1994” e omitir a responsabilidade da gestão remunerar o capital que todos investimos na TAP.

A terceira medida é a de reequilíbrio da relação entre gestão e trabalhadores, com mais flexibilidade, responsabilização/avaliação e transformação do actual modelo de sindicalismo. Está em causa a situação que Vital Moreira tão bem sintetiza:

-“Sob o ponto de vista do controlo empresarial, a TAP constitui desde há muito uma espécie de condomínio entre o Estado e os sindicatos da empresa, que exercem um eficaz poder de veto na gestão da empresa.” (aqui).

Como vimos (aqui), esta relação de foças bloqueia a adaptação da TAP ao mercado e está na origem dos sucessivos problemas que enfrenta.

*Estratégia

A estratégia de 2001 permanece válida (2) e orienta a TAP a responder às exigências de competitividade

-das rotas intra europeias ponto a ponto, dinamizadas pelo turismo receptor, e com base em resposta diferente e mais forte da TAP à concorrência das companhias low cost,

-do hub intercontinental de Lisboa, dinamizado por tráfego com origem nos continentes a Norte e a Sul e em concorrência com outras companhias full service.

Esta resposta condiciona o estatuto do pessoal, a renovação de frota e a nova TAP no mercado.

 

2.Estatuto do pessoal e renovação da frota

Destacamos o Estatuto do Pessoal e a renovação da frota porque

-pessoal e combustível são os dois grandes custos na operação da TAP,

-atitude do pessoal na relação com os passageiros e frota renovada são decisivos para o posicionamento da empresa no mercado.

*Estatuto do pessoal

Não dispomos de informação sobre o impacto do custo de pessoal na competitividade da TAP. Em post de apoio destacamos aspectos de estudo sobre a produtividade do trabalho nas companhias aéreas da Europa – em ranking sempre discutível, a TAP é 13ª em 19 companhias (aqui).

As greves na TAP têm sido incidentes de fronteira (um escândalo no caso dos dez dias do SPAC) que desgastam a empresa e escamoteiam problemas de fundo, cuja solução pode implicar greves a sério. Mais concretamente, há duas perguntas a reter:

-precisará a TAP de um esforço de reestruturação profundo dos custos de pessoal, a exemplo do que tem acontecido outras companhias da Europa?

-os trinta meses de paz social acordados em Novembro de 2014 permitem transformação qualitativa na relação entre accionista/gestão e sindicatos, ou culminarão com um choque violento?

Em 30 de Março, Fernando Pinto declara que “A TAP é uma empresa reconhecidamente muito eficiente. Ninguém vai chegar e fazer despedimentos de grandes grupos.” (aqui). Em 15 de Dezembro de 2014 e no âmbito das negociações com os sindicatos, o ministro da Economia defende que a empresa precisa de "capital e flexibilidade laboral" (aqui).

*Renovação da frota

A renovação da frota tem de estar em linha com a estratégia definida e compreende duas decisões:

-manter a compra dos 12 Airbus A350, para garantir a competitividade do hub intercontinental,

-renovar a frota da Portugália em função de resposta inovadora e muito mais forte à concorrência de companhias low cost nas rotas intra europeias.

 

3.A nova TAP no mercado

É na relação com o mercado que encontramos as implicações da exigência da TAP ser rentável em mercado aberto e sem ajuda do Estado, pelo que não pode garantir actividades que comprometam a sua rentabilidade ou que não dependam de factores externos poderosos.

*Rotas, frequências, capacidades e procura

Rotas, frequências e capacidades resultam da avaliação do mercado e são

-livres na quase totalidade das ligações intra europeias ou reguladas por acordos bilaterais entre estados (Rússia, Venezuela, CPLP).

A exigência de rentabilidade tem impedido e impede a TAP de operar rotas estruturalmente deficitárias, como é o caso de Bissau (aqui).  

*Diáspora e países da CPLP 

Com a narrativa e modelo de negócio da ‘transportadora aérea nacional’ obsoletos, neste novo modelo de ‘rotas, frequências, capacidades e procura’,

-a diáspora é um segmento de mercado muito valioso e sensível à dimensão emocional da imagem de marca da TAP,

-os países da CPLP que justificam ligação aérea têm transportadora nacional e acordo bilateral com Portugal – Guiné Bissau e Timor são excepções.

*Base e hub de Lisboa

Vimos como base e hub da TAP estão interligados na conectividade aérea do aeroporto de Lisboa (3)

-Lisboa é a única base da TAP, o aeroporto onde se concentra a quase totalidade da sua frota e com maior importância do turismo internacional (receptor e emissor),

-os passageiros em trânsito pelo hub desembarcam e embarcam em Lisboa, mas em teoria nada têm a ver com a localização do aeroporto,

-é o conjunto dos passageiros de turismo receptor e emissor e de hub que faz o sucesso ou insucesso da base da TAP em Lisboa.

A ideia do accionista privado da TAP garantir o hub de Lisboa é ilusão criada por políticos em País com fraca opinião pública, porque

-o hub de Lisboa é indispensável à TAP como a que conhecemos e a TAP sem o hub ficaria reduzida a uma companhia aérea insustentável,

-a competitividade da TAP é condição indispensável ao hub de Lisboa, mas pode vir a não ser suficiente e o hub minguar ou desaparecer.

*TAP e turismo – aeroportos de Lisboa, Faro, Porto e Funchal

Vimos que nos aeroportos do Porto, Faro e Funchal e no futuro previsível,

-o crescimento depende do tráfego intra europeu, onde a TAP encontra a concorrência das companhias low cost,

-nestes três aeroportos, a TAP no seu modelo de negócio actual terá muita dificuldade em ganhar quota de mercado a estas companhias (4).

A hipótese da TAP crescer nestes três aeroportos depende da capacidade de atracção dos destinos e de novo modelo de negócio com base na Portugália e/ou na própria TAP.

*Obrigações de Serviço Público

As OSP’s têm definição formal a nível da UE e de Portugal, e só se aplicam a tráfego territorial e interior. Com liberalização das ligações entre Continente e Regiões, as ObrigacoesServicoPublico são insignificantes (5).

*Grupo TAP

Uma vez integrados na nova TAP, com accionista/gestão estabilizados e conhecedores do mercado, problemas que se têm arrastado podem ganhar nova solução:

-Portugália ser ou não instrumento da TAP para concorrer com as companhias low cost, em modelo similar ao da Vueling (IAG), Transavia (Air France-KLM) ou Lufthansa (Germanwigs),

-estabilizar a solução encontrada para a SPdH (Goundforce),

-quem compra a TAP tem de ter solução para a Manutenção do Brasil.

 

A Bem da Nação

Lisboa 12 de Maio de 2015

Sérgio Palma Brito

 

Notas

(1)PKU designa Passageiro-Quilómetro, definido como o “Número total de passageiros multiplicados pelo número de quilómetros voados.”, segundo o Relatório do Grupo TAP referente a 2013.

(2)Ver post  Formação de uma TAP diferente – a gestão profissional de 2001/15 (aqui).

(3)A recente acção movida por associação ligada ao movimento Não TAP os olhos veio dar mais importância ao quarto critério que o Caderno de Encargos estabelece para a escolha do vencedor da oferta de venda (aqui). Com efeito a sua redacção é enganadora quando menciona

-“obrigações de serviço público que incumbam à TAP, S. A., incluindo no que concerne às ligações aéreas entre os principais aeroportos nacionais e das regiões autónomas, quando aplicável, bem como a continuidade e reforço das rotas que sirvam as regiões autónomas, a diáspora e os países e comunidades de expressão ou língua oficial portuguesa” (aqui).

 

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