Entre 1976 e 2000 a TAP é a ‘transportadora aérea nacional’, cadinho em que se fundem a realidade da empresa e a sua sublimação. A evolução do resultado líquido do exercício da TAP entre 1976/2000 (gráfico 1) é o fio condutor para situar a narrativa e avaliar o desempenho do modelo de negócio da ‘transportadora aérea nacional’:
-o
resultado líquido apenas é magramente positivo em 1997 e 1998,
-entre 1976
e 2000, o resultado líquido acumulado da TAP, actualizado a valor de 2014, é de
€-2,9 mil milhões.
Gráfico 1 – TAP, resultado líquido
do exercício (1976/2000)
(€milhões, actualizados a 2014)
*Informação ao leitor
O presente
post tem versão em PDF está disponível (aqui).
A lista dos
posts já publicados pelo blogue está acessível aqui.
1.Modelo de negócio de
“transportadora aérea nacional
*Perda das ‘linhas de África’ e nacionalização
Entre o 25
de Abril e o êxodo das colónias, a TAP transporta os passageiros que marcam o
fim das ‘linhas de África’. A nacionalização de 1975 (1)
-na
continuidade da ‘empresa da guerra colonial’, permite recuperar a visão
‘nacional’ da TAP do
tempo das colónias, que se adapta à ruptura politica, económica e social do 25
de Abril,
-está de
acordo com o então dominante modelo europeu de companhias de bandeira de
propriedade publica,
-responde à
inviabilidade económica e financeira da empresa e impossibilidade politica da
sua reconversão por causa do custo social,
-bloqueia a
capacidade da TAP se adaptar às exigências do mercado permite que a empresa
seja estruturalmente deficitária, pela estrutura de capital e custos, baixa
produtividade e gestão de génese político partidária.
Esta é a
base da narrativa e modelo de negócio ‘transportadora aérea nacional’.
*a TAP em “situação
económica difícil” (1980)
Em Julho de
1980, o governo da Aliança Democrática declara a TAP “em situação económica
difícil”, porque “a TAP EP se encontra de há muito em situação económica e
financeira preocupantemente grave.” (2).
Em Agosto
de 1980, o governo inicia o processo de activar “as medidas adequadas a uma profunda reestruturação da TAP,
visando a sua consolidação” (3). Os “considerandos” da Resolução referem
”inadequação da actual estrutura organizativa da empresa”, ”instabilidade
laboral” e que ”se impõe a mais severa disciplina na utilização dos fundos
públicos”. Em 16 de Setembro de 1980 é estabelecido o acordo de saneamento económico-financeiro
entre o Estado e a TAP Air Portugal EP (4).
Este é um de vários episódios da ajuda do Estado à TAP.
*A ‘transportadora
aérea nacional’
Em 1985 e
ainda com o governo de Mário Soares e Mota Pinto, o contrato-programa
entre o Estado e a TAP Air Portugal EP é o cadinho em que se fundem o apoio do
estado à TAP e a sublimação do contributo da TAP para o País (5). Em síntese, a TAP da ‘transportadora
aérea nacional’ vai ter duas faces:
-o modelo
de negócio de ‘o Estado paga’ permite à empresa receber mais fundos públicos,
acumular prejuízos sistemáticos e não ser objecto da transformação profunda de
que carece,
-a
narrativa sublima esta realidade, com a TAP ‘garantir’ (para utilizar palavra
da actualidade) “estabelecer ligações permanentes com as comunidades
portuguesas mais significativas” e “com os países de expressão oficial
portuguesa”, assegurar “transporte para as regiões autónomas” e ser
“dinamizador da actividade turística nacional”.
De maneira
mais detalhada, a narrativa é definida como segue:
-“A TAP-Air
Portugal, EP […] desempenha uma missão de grande importância económica e de
reconhecido mérito cultural, social e politico ao estabelecer ligações
permanentes com as comunidades portuguesas mais significativas e com os países
de expressão oficial portuguesa, para além do papel que desempenha como
dinamizador da actividade turística nacional.”.
-“Sem
prejuízo da eficácia das missões que estão confiadas pelo Estado à TAP-Air
Portugal, EP, onde sobressai o transporte para as regiões autónomas,” (6).
Importa
notar que mesmo no momento mais glorioso da narrativa e modelo de negócio da ‘transportadora
aérea nacional’,
-não há
referência a propostas como as que são formuladas em 2014/15 sobre a TAP como
instrumento de soberania (o que é uma realidade até ao 25 de Abril) ou de política
da língua.
*Países de expressão oficial
portuguesa
Desde a
descolonização está em marcha o processo que altera as ligações entre Portugal
e os novos países de expressão oficial portuguesa e no qual o Brasil. Cada um à
sua escala, os países de expressão oficial portuguesa
-criam
transportadoras aéreas nacionais e estabelecem acordos bilaterais de tráfego
aéreo com Portugal, que fixam rotas e regras que limitam a concorrência entre
as companhias que os estados designarão para as operar – a TAP passa a ser uma
dessas companhias.
Nesta nova
definição legal e de mercado, não há lugar para visão romântica e sublimada que
data da criação da TAP, quando
-“Salazar
estava desesperado, porque éramos a única potência colonial sem um serviço
aéreo que nos ligasse aos territórios ultramarinos”,
-o contrato
de concessão de 1953 refere a companhia que ligasse “por via aérea os diversos
territórios nacionais e, assim, estreitados os laços entre os portugueses
espalhados pelo Mundo.” (6bis).
Neste como
noutros casos, a TAP deve ser vista como uma companhia especial, mas uma entre
outras que asseguram a acessibilidade aérea competitiva a Portugal (aqui). O que diferencia a TAP é a
dimensão emocional da sua imagem de marca e o captar mais-valia nacional na
conectividade aérea dos aeroportos do País (aqui)
*Emigração/Diáspora
A partir de
1978, a relação entre a TAP e a emigração é integrada nos programas de governo.
A TAP passa a ser “meio de união de portugueses espalhados pelo Mundo”, há uma
“política de presença da TAP junto das comunidades portuguesas” e a sua
importância para “fluxos de emigrantes, turístico e de comércio externo”.
A realidade
comercial é algo diferente. Antes da liberalização de 1993, o exemplo de França
vale uma investigação. TAP e Air France influenciam as autoridades da Aviação
Civil para manter uma oferta de lugares limitada, de modo a vender caro à
procura cativa dos emigrantes. Os voos fretados entre França e Portugal são
esporádicos e quando os há, os emigrantes são impedidos de os utilizar. As
tarifas grupo para turistas chegam a ser um terço da ‘tarifa especial’ de que
os emigrantes dispõem (7).
Sem
diminuir ou ignorar a dimensão afectiva da TAP,
-é a
liberalização de 1993 que torna as viagens da diáspora mais baratas e
acessíveis, com companhias low cost a mostrar o absurdo das tarifas da ‘transportadora
aérea nacional´.
*Turismo
A
actividade da TAP no transporte de turistas e no apoio a acções de promoção ou
de marketing e vendas da oferta é inegável e deve ser reconhecida.
Reconhecido
este facto, a politica politico partidária para o transporte aéreo permite que
a gestão da TAP
-se acomode
com a regulação internacional que dificulta a baixa de preços nas rotas entre
cidades da Europa, o que limita o do turismo com chegada a Lisboa e Porto (8),
-ignore dos
voos charter entre o Norte da Europa
e áreas turísticas da ‘bacia alargada do Mediterrâneo’ que integra o Algarve e
a Madeira (9).
Já no
século XXI, a procura para o turismo urbano de Lisboa e Porto só ganha escala
de relevo com as companhias inovadoras, filhas da desregulação de 1993.
*Missões
confiadas pelo Governo
Damos exemplo de uma decisão política de entre muitas que deixam de
ser possíveis a partir de 1993 (liberalização) e 1994 (decisão da Comissão):
-“Por decisão governamental em Abril de 1984 foi introduzido um voo
mensal entre Lisboa e S. Tomé, com escala intermédia em Cabo Verde, o que
permitiu completar as ligações aéreas entre Portugal e todos os países de
expressão portuguesa. Dada a manifesta falta de rentabilidade desta linha,
existe pela parte do Governo um compromisso de uma indeminização compensatória.”
(10).
Lembramos dois exemplos de ‘missões’: a extensão, temporária e
deficitária, da rota de S. Paulo a Buenos Aires e a rota Lisboa-Macau que exige
e vale investigação adequada.
*Enquadramento
internacional da ‘transportadora aérea nacional’
Desde a década de quarenta até ao início da de noventa a regulação da
actividade das empresas de transporte aéreo é assegurada por três instrumentos:
-acordos bilaterais entre estados sobre direitos de tráfego aéreo que
fixam rotas, frequências e capacidade de lugares, e são aplicados pelas
instituições da ‘aviação/aeronáutica civil’,
-acordos sobre preços e regras a limitar a concorrência pela IATA …
uma associação das ditas empresas,
-acordos bilaterais entre empresas, como os de pool de receitas e sua
partilha.
De uma maneira crescente, as mesmas empresas que limitam a
concorrência consagram enorme energia a criar artifícios para as violar
(10bis).
Em síntese, este modelo de regulação e a sua interpretação pela
administração portuguesa protegem a TAP contra a concorrência e estão na origem
de uma contradição de que é exemplo o caso da emigração em França:
-com base no argumento de ‘proteger a TAP’, o estado regulador impede
que turismo, emigração e países de língua portuguesa beneficiem de tarifas mais
baixas (10c).
2.Início dos anos 90: TAP é salva da falência pelo PESEEF (11)
*A TAP no início dos anos 90
Da decisão
da Comissão de Julho de 1994, citamos (com edição nossa):
-“No contexto comunitário, o mercado
doméstico da TAP é um mercado periférico e relativamente pequeno. Portugal
constitui essencialmente um destino de férias caracterizado por um tráfego com
baixa rentabilidade, em que a TAP enfrenta a concorrência de transportadoras
aéreas não regulares, bem como de transportadoras aéreas regulares.
-Apesar da
sua dimensão limitada, a TAP explora uma rede muito heterogénea.
-O seu
mercado mais importante é a Europa, em que estão concentradas mais de 80 % das
suas operações.
-O mercado
doméstico inclui principalmente as rotas para as regiões autónomas do Atlântico
(Açores e Madeira), relativamente às quais Portugal impôs obrigações de serviço
público.
-Para além
disso, a TAP explora uma série de rotas do Atlântico Norte, geralmente
deficitárias, e rotas para a América Central e a América do Sul.
-Um
importante sector da rede da transportadora aérea é o africano, que inclui
principalmente as rotas com destino às antigas colónias portuguesas.
-A TAP não
explora actualmente rotas para o Extremo Oriente.”.
*A TAP à beira da insolvência
Não é
impunemente que desde a nacionalização a TAP tenha tido sempre resultados
líquidos negativos. No início da década de 1960 a falência da empresa parece
fatal e só é evitada pelo drive do
ministro Joaquim Ferreira do Amaral. Em 1994, a decisão da Comissão é precedida
por um diagnóstico de que destacamos:
-“A TAP
atravessa uma grave crise financeira. [] O capital próprio tem sido negativo
desde 1980 (um valor negativo de 16 493 000 escudos portugueses, no ano
financeiro de 1992). […] a estrutura de capital da TAP é fundamentalmente
frágil”,
-“A
fragilidade desta estrutura financeira deve-se essencialmente às enormes perdas
acumuladas, que acarretaram a erosão do capital da empresa.”
-“A TAP é
deficitária na maior parte da sua rede. Em 1992, apenas registou lucros em 11
das suas rotas, enquanto que outras 30 registaram perdas que ultrapassaram 50 %
das receitas”,
-“Em termos
de rendibilidade, a TAP encontra-se actualmente numa situação mais difícil que
a maioria das suas concorrentes europeias.”.
*As medidas de 1993
Entre 1992
e 1994, o resultado líquido acumulado do exercício da TAP é de €-790 milhões, em
valor actualizado a 2014. É neste contexto que devem ser compreendidas decisões
que o governo toma ainda em 1993:
-“um novo
Regulamento Administrativo de Trabalho, que regulamenta as condições de
trabalho e as relações entre a TAP e o seu pessoal a partir de 1 de Abril de
1993”, o que pode gerar “redução anual dos custos
laborais de cerca de 3 mil milhões de escudos portugueses”,
-congelamento de salários em 1993 e 1994 e
supressão de cerca de 1.200 postos de trabalho, medidas que resultaram numa
redução dos custos de cerca de 4 mil milhões de escudos portugueses.
Os mais velhos não esqueceram as imagens da
intervenção da policia a dispersar a manifestação do pessoal da TAP em Outubro
de 1993.
*A baixa produtividade
O
principal problema da TAP é sua baixa produtividade:
-“qualquer
que seja o ângulo pelo qual se analisem os actuais níveis de produtividade da
TAP, os mesmos situam-se em valores sistematicamente abaixo dos apresentados
pelos seus principais competidores europeus, facto que, naturalmente, coloca a
empresa em situação de desigualdade competitiva”,
-“Mesmo
tendo em conta a extensão média dos percursos, a produtividade da TAP é muito inferior
à das suas concorrentes”,
-abaixa
produtividade da TAP é causada pela sua estrutura de custos elevados e baixos
rendimentos e a “companhia tem excesso de pessoal, está mal organizada e opera
demasiados tipos de aviões”.
*Recuperação económica e financeira
em quatro anos (1994/1997)
O PESEEF é elaborado com base no “cenário que visa a recuperação da
situação económica e financeira da companhia ao longo de quatro anos
(1994/1997), mas
-a “implementação bem sucedida das medidas previstas em cada um dos [oito]
cenários considerados não será suficiente para atingir os níveis de eficácia
necessários para sobreviver”,
-“a TAP não tem a massa crítica necessária para sobreviver no novo ambiente
de concorrência estabelecido com a criação do mercado comum da aviação”,
-“a longo prazo, a TAP ver-se-á, por conseguinte, forçada a formar uma
aliança ou alianças estratégicas com parceiros estrangeiros, apenas possível
após a recuperação da situação financeira da TAP em resultado da aplicação bem
sucedida das medidas de reestruturação previstas.”.
Entre
outros, o PESEEF traduz-se em
-cerca de €1,35 mil milhões para aumento de
capital, e cerca de €1,27 mil milhões de garantias a empréstimos, em euros
actualizados a 2014 (aqui).
*Decisão da
Comissão
Para a Comissão, “O auxílio a conceder à TAP no período 1994/1997,
-“tem por objectivo a sua reestruturação em conformidade com o plano e as
garantias prestadas por Portugal, incluindo a sua privatização parcial”.
A
Comissão
-considera que o auxílio do estado à TAP “é compatível com o mercado comum
e com o Acordo EEE”
-regista
o compromisso de Portugal de iniciar em 1997 o processo que deve conduzir à
privatização parcial da TAP
-lembra que “Em conformidade com a legislação comunitária, Portugal se
abstenha de conceder mais auxílios à TAP.”.
Dada a sua actualidade, o ponto da decisão sobre ‘potenciais efeitos
negativos do auxílio nas trocas comerciais e na concorrência’ é descrito no post
sobre a reestruturação pública da TAP (aqui).
3.Do PESEEF a nova ameaça de
falência
*Do PESEEF a nova ameaça de
insolvência (1995 a 2000)
Em 1995, o
programa do governo de António Gutteres é optimista ao mencionar
-“uma
companhia de bandeira dotada de uma gestão equilibrada e sólida, capaz de
concorrer em mercado aberto”.
A evolução
do resultado líquido da TAP durante os seis anos até 2000 mostra uma realidade
que contradiz este optimismo. Em valores de 2014,
-entre
1995/2000, o resultado líquido acumulado da TAP é de €-448 milhões,
-em 1997 e
1998, há um resultado líquido positivo de €23 milhões.
O “cenário que visa a recuperação da situação económica e financeira da
companhia ao longo de quatro anos (1994/1997)” parece estar a ser seguido. A
realidade vai ser diferente, ao ponto de
entre 2000/01, a TAP enfrentar de novo uma situação de insolvência.
*Visão do Plano Estratégico
1997/2000
Segundo o
Relatório da TAP referente a 1997, a visão do Plano Estratégico 1997/2000
“aponta para a seguinte proposta de valor”
-“Companhia
nacional que “domina” o mercado português, das principais comunidades com
fortes vínculos a Portugal espalhadas pelo mundo, e dos turistas estrangeiros
individuais viajando para Portugal, através de uma rede que engloba os
principais destinos desses clientes, de um serviço simples, rápido e
tipicamente português, e da recompensa da lealdade desses clientes à TAP, a um
preço em linha com as companhias de bandeira concorrentes.”.
Esta
“proposta de valor” retoma mitos da ‘transportadora aérea nacional’ e não tem
em conta a inviabilidade deste modelo de negócio. A referência a “turistas
estrangeiros individuais” parece ser resposta à crítica da Decisão da Comissão
que figura na Nota (7).
*Privatização ligada à SWISSAIR
Em Julho de 1994, Comissão
-“regista o compromisso de Portugal de iniciar em 1997 o processo que deve
conduzir à privatização parcial da TAP”.
Depois, a privatização da TAP é
mencionada no Programa do Governo (1995/99) e integrada no Programa de
Privatizações para 1998/99.
Os acordos
iniciais entre a TAP e o SAirGroup, remontam a 1997, ano em que a TAP
adere à Aliança Estratégica Qualiflyer. Em Dezembro de 1999, há revisão profunda do
acordo entre a TAP e o SAirGroup. O processo segue o seu curso, mas
desmorona-se em 2001:
-em
Janeiro, o SAirGroup decide não efectuar investimentos adicionais no transporte
aéreo e em Fevereiro desiste da participação em 34% do capital da TAP – em Outubro
é a falência da Swissair e da Sabena em Novembro.
É neste
quadro que a TAP passa a ter gestão profissional.
*Rota de Macau e Air Macau – o longo
curso indispensável à TAP?
Segundo o Relatório
e Contas da TAP referente a 1994, recebido o apoio publico que evita a falência
e no contexto descrito antes, a empresa decide
-“a
abertura de voos para o Extremo Oriente, associados à participação numa
companhia local, a Air Macau”
-a
aquisição, indirecta, de 25% do Capital da Air Macau.
Esta
aquisição
-cria
“novos e promissores horizontes à sua [da TAP] operação para uma zona geográfica
em forte expansão”,
-“Em
coordenação com a nova transportadora e utilizando-a como “feeder” e
distribuidora preferencial, a TAP projecta, assim, o seu futuro numa área até
agora inexplorada, abrindo, em simultâneo, a possibilidade de cooperação técnica
e a realização de actividades complementares, indutoras de valor acrescentado à
sua actividade principal, potenciando as vantagens sinergéticas e de
diversificação das suas capacidades.”
Estas decisões valem investigação que nos informe, entre outros,
sobre:
-a TAP depender de voos rentáveis de longo curso e o mercado para uma
actividade significativa residir no aeroporto de Macau,
-a decisão empresarial ter origem política, de avião português ligar
Lisboa a Macau e ‘ser o primeiro a aterrar no aeroporto de Macau’,
-quem assume a responsabilidade da decisão, presta contas dos
prejuízos e e assume as consequências?
Um módico de bom senso e conhecimento do mercado confirmam a ilusão sobre
o tráfego potencial da rota e da empresa feeder.
*A TAP
de novo à beira da falência
Do
Relatório da TAP SA referente a 2001, citamos:
-“Consequência
de prejuízos acumulados e dos resultados de 1999 e 2000, chegámos a uma
situação que nos impõe uma gestão de Tesouraria aturadíssima. A melhoria dos
resultados comerciais alcançados tem sido um factor decisivo para a sua
sustentabilidade.
Assume, por isso, elevado grau de urgência o projecto de
privatização, o qual prevê a entrada na Empresa da participação no seu capital
por parte do(s) novo(s) accionista(s).
No quadro da actual legislação comunitária, privatização é a
via para a reestruturação e a consolidação financeira da TAP.”.
4.Modelo de negócio e narrativa da ‘transportadora
aérea nacional’
*Queda do modelo de negócio
da
‘transportadora aérea nacional’
Entre 1993/1994
o modelo de negócio da ‘transportadora aérea nacional’ está condenado por duas
decisões interligadas ‘da Europa’. A primeira data de Janeiro de 1993 e
estabelece a liberalização do tráfego aéreo de passageiros no espaço aéreo europeu
-retira ao estado
o poder de controlar rotas, frequências e capacidade de lugares oferecidos,
indirectamente, preços,
-torna
obsoleta e ilegaliza a tradicional fixação de preços pela IATA os preços pela
IATA.
A segunda é
a decisão da Comissão de Julho de 1994 sobre a ajuda do Estado à TAP exige
que, “Em conformidade com a
legislação comunitária, Portugal se abstenha de conceder mais auxílios à TAP.”.
A TAP entra
num mundo novo:
-o estado
deixa de poder pagar as ‘garantias’ que a TAP dá e a empresa é obrigada a ser rentável
em mercado aberto e sem ajuda do estado.
*Consequências para a narrativa da ‘transportadora
aérea nacional’
A imposição
do novo modelo de negócio à TAP desfaz a narrativa da ‘transportadora aérea
nacional’ porque
-a TAP só
pode garantir o que a procura e a sua competitividade tornam rentável, o que
exclui manter rotas estruturalmente deficitárias.
-companhias
inovadoras vão prestar melhor serviço e a melhores preços à emigração e ao
turismo,.
-nos países
de língua oficial portuguesa, a TAP vai competir, sem ajuda financeira do
estado, com as companhias aéreas estatais que os governos podem apoiar
directamente ou por via dos acordos bilaterais de tráfego aéreo duramente
negociados.
*Elementos da narrativa que perduram
O modelo de
negócio está inviabilizado por factores externos, mas na narrativa sobre a “transportadora
aérea nacional” há elementos que perduram e não devem ser ignorados:
Outros são
mais importantes,
-entre
2002/03, quando o presidente Cardoso e Cunha quer acabar com a gestão profissional,
a narrativa da “transportadora aérea nacional” integra de novo a visão
empresarial.
-na
privatização de 2014/15, a ideia de que ‘a TAP garante’ é partilhada pelo governo
e pela oposição à privatização.
A Bem da
Nação
Lisboa 4 de
Maio de 2015
Sérgio
Palma Brito
Notas
(1)Em 1975,
o Decreto-Lei nº 205-E/75, de 16 de Abril de 1975 “Nacionaliza a companhia dos
Transportes Aéreos Portugueses, a contar de 15 de Abril de 1975”.
A Decisão da
Comissão lembra que “As dificuldades financeiras da TAP tiveram início em 1974,
quando a empresa perdeu o monopólio de transporte nas rotas com destino às
antigas colónias portuguesas em África, que se caracterizavam por um tráfego
intenso, com elevadas taxas de ocupação e rentabilidade.”
“Decisão da Comissão de Julho de 1994” é
a designação corrente de
94/698/CE: Decisão da Comissão, de 6 de Julho de
1994, relativa ao aumento de capital, garantias de crédito e isenção fiscal
existente em favor da TAP. (aqui).
(2)A Resolução nº 244/80, de 7 de Julho
“Declara a TAP – Transportes Aéreos Portugueses, EP em situação económica
difícil a partir de 4 de Julho de 1980”. O detalhe do presente item é a alínea
b do ponto 1.2.1 do documento de trabalho TAP Air Portugal – Notas Genealógicas
(1944/2012) de apoio ao post Privatização da TAP Air Portugal (I) - de Salazar
à Actualidade (aqui).
(3)Em
Agosto de 1980, a Resolução nº 274/80, de 4 de Agosto do Gabinete do Primeiro
Ministro “Incumbe os Ministros das Finanças e do Plano, do Trabalho e dos
Transportes e Comunicações de activarem as medidas adequadas a uma profunda
reestruturação da TAP, visando a sua consolidação”.
(4)Fonte: Anexo à
Portaria nº 991/80, de 17 de Novembro.
(5)A
Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/85, de 6 de Fevereiro “Aprova a
celebração de um contrato-programa entre o Estado e a TAP - Air Portugal, E.
P., e autoriza os Ministros das Finanças e do Plano e do Equipamento Social a
intervir na celebração desse contrato em representação do Estado”.
(6)Com a
evidente excepção das “linhas de África”, este conceito é muito semelhante ao
do de antes do 25 de Abril:
-o
principio geral de haver missões que o Estado pode confiar à TAP-Air Portugal,
EP – ontem as “linhas de África”, hoje “o transporte para as regiões autónomas”
ou S. Tomé e Príncipe, em 1984,
-os antigos
“territórios ultramarinos” mais o lugar especial que o Brasil sempre teve [ver
Decreto-Lei de 1953], são hoje os Países de Língua Portuguesa,
-a
dinamização da actividade turística nacional é mais evidente, mas é constante
desde 1944.
(6bis)Ver
respectivamente, Humberto
Delgado, Memórias, Edições Delfos, 1974; e Preâmbulo do Decreto-Lei nº 39188, de 25 de Abril de
1953, que cria a TAP, SARL.
(7)Em 1994,
a decisão da Comissão refere “No passado, a TAP não seguiu uma política
comercial correcta no que respeita à fixação dos preços dos seus produtos,
procurando garantir o êxito da companhia através de elevadas taxas de ocupação
e não da fixação de tarifas lucrativas. Parecia ser mais importante encher os
aviões (frequentemente através da venda de grupos a preços marginais) do que
optimizar os resultados operacionais.”. A observação de ‘grupos a preços
marginais’ parece influenciar a estratégia da TAP para 1997/2000 – ver o ponto
3. A comparação entre tarifas é baseada na nossa experiência profissional.
(8) A TAP pela
sua definição de ‘transportadora aérea nacional´, é um dos elementos do Sistema
de Regulação do Tráfego Aéreo de Passageiros, que impede a concorrência e
favorece uma politica de tarifas altas.
(9)A TAP
ainda tenta captar este mercado com a criação da Air Atlantis. Para sermos
justos, a tendência dos operadores que garantem os charters é a integração
vertical de ‘organização do package, transporte aéreo e distribuição’. Este
processo de integração vertical é acompanhado pelo de fusões e aquisições e
culmina em 2006 com a TUI Travel plc e Thomas Cook plc.
(10)Relatório da TAP referente a 1984, p. 17.
(10b)Não é fácil documentar estas práticas que conhecemos por
experiência própria, na Bélgica e em Portugal. Com base desta experiencia
podemos afirmar que a TAP não tinha dinamismo significativo nesta área, se é
que tinha algum.
(10c)Esta cultura ainda está presente em muitas das intervenções
contra as companhias low cost que são autorizadas a voar para a Portela e assim
‘prejudicar’ a TAP.
(11)O
PESEEF (Plano Estratégico de Saneamento Económico
e Financeiro)
é elaborado no segundo semestre de 1993, aprovado em Assembleia Geral da TAP de
Janeiro de 1994 e objecto da Decisão da Comissão de 6 de Julho de 1994.
Sem comentários:
Enviar um comentário