TAP, a ‘transportadora aérea nacional’ – de 1976 a 2000


Entre 1976 e 2000 a TAP é a ‘transportadora aérea nacional’, cadinho em que se fundem a realidade da empresa e a sua sublimação. A evolução do resultado líquido do exercício da TAP entre 1976/2000 (gráfico 1) é o fio condutor para situar a narrativa e avaliar o desempenho do modelo de negócio da ‘transportadora aérea nacional’:

-o resultado líquido apenas é magramente positivo em 1997 e 1998,

-entre 1976 e 2000, o resultado líquido acumulado da TAP, actualizado a valor de 2014, é de €-2,9 mil milhões.

Gráfico 1 – TAP, resultado líquido do exercício (1976/2000)
(€milhões, actualizados a 2014)

 
Fonte: Elaboração própria com base nos relatórios anuais da TAP EP e SA, actualizado pelo índice da Pordata

 

*Informação ao leitor
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1.Modelo de negócio de “transportadora aérea nacional

*Perda das ‘linhas de África’ e nacionalização
Entre o 25 de Abril e o êxodo das colónias, a TAP transporta os passageiros que marcam o fim das ‘linhas de África’. A nacionalização de 1975 (1)

-na continuidade da ‘empresa da guerra colonial’, permite recuperar a visão ‘nacional’ da TAP do tempo das colónias, que se adapta à ruptura politica, económica e social do 25 de Abril,

-está de acordo com o então dominante modelo europeu de companhias de bandeira de propriedade publica,

-responde à inviabilidade económica e financeira da empresa e impossibilidade politica da sua reconversão por causa do custo social,

-bloqueia a capacidade da TAP se adaptar às exigências do mercado permite que a empresa seja estruturalmente deficitária, pela estrutura de capital e custos, baixa produtividade e gestão de génese político partidária.

Esta é a base da narrativa e modelo de negócio ‘transportadora aérea nacional’.

*a TAP em “situação económica difícil” (1980)
Em Julho de 1980, o governo da Aliança Democrática declara a TAP “em situação económica difícil”, porque “a TAP EP se encontra de há muito em situação económica e financeira preocupantemente grave.” (2).

Em Agosto de 1980, o governo inicia o processo de activaras medidas adequadas a uma profunda reestruturação da TAP, visando a sua consolidação” (3). Os “considerandos” da Resolução referem ”inadequação da actual estrutura organizativa da empresa”, ”instabilidade laboral” e que ”se impõe a mais severa disciplina na utilização dos fundos públicos”. Em 16 de Setembro de 1980 é estabelecido o acordo de saneamento económico-financeiro entre o Estado e a TAP Air Portugal EP (4).

Este é um de vários episódios da ajuda do Estado à TAP.

*A ‘transportadora aérea nacional’
Em 1985 e ainda com o governo de Mário Soares e Mota Pinto, o contrato-programa entre o Estado e a TAP Air Portugal EP é o cadinho em que se fundem o apoio do estado à TAP e a sublimação do contributo da TAP para o País (5). Em síntese, a TAP da ‘transportadora aérea nacional’ vai ter duas faces:

-o modelo de negócio de ‘o Estado paga’ permite à empresa receber mais fundos públicos, acumular prejuízos sistemáticos e não ser objecto da transformação profunda de que carece,

-a narrativa sublima esta realidade, com a TAP ‘garantir’ (para utilizar palavra da actualidade) “estabelecer ligações permanentes com as comunidades portuguesas mais significativas” e “com os países de expressão oficial portuguesa”, assegurar “transporte para as regiões autónomas” e ser “dinamizador da actividade turística nacional”.

De maneira mais detalhada, a narrativa é definida como segue:

-“A TAP-Air Portugal, EP […] desempenha uma missão de grande importância económica e de reconhecido mérito cultural, social e politico ao estabelecer ligações permanentes com as comunidades portuguesas mais significativas e com os países de expressão oficial portuguesa, para além do papel que desempenha como dinamizador da actividade turística nacional.”.

-“Sem prejuízo da eficácia das missões que estão confiadas pelo Estado à TAP-Air Portugal, EP, onde sobressai o transporte para as regiões autónomas,” (6).

Importa notar que mesmo no momento mais glorioso da narrativa e modelo de negócio da ‘transportadora aérea nacional’,

-não há referência a propostas como as que são formuladas em 2014/15 sobre a TAP como instrumento de soberania (o que é uma realidade até ao 25 de Abril) ou de política da língua.

*Países de expressão oficial portuguesa
Desde a descolonização está em marcha o processo que altera as ligações entre Portugal e os novos países de expressão oficial portuguesa e no qual o Brasil. Cada um à sua escala, os países de expressão oficial portuguesa  

-criam transportadoras aéreas nacionais e estabelecem acordos bilaterais de tráfego aéreo com Portugal, que fixam rotas e regras que limitam a concorrência entre as companhias que os estados designarão para as operar – a TAP passa a ser uma dessas companhias.

Nesta nova definição legal e de mercado, não há lugar para visão romântica e sublimada que data da criação da TAP, quando

-“Salazar estava desesperado, porque éramos a única potência colonial sem um serviço aéreo que nos ligasse aos territórios ultramarinos”,

-o contrato de concessão de 1953 refere a companhia que ligasse “por via aérea os diversos territórios nacionais e, assim, estreitados os laços entre os portugueses espalhados pelo Mundo.” (6bis).

Neste como noutros casos, a TAP deve ser vista como uma companhia especial, mas uma entre outras que asseguram a acessibilidade aérea competitiva a Portugal (aqui). O que diferencia a TAP é a dimensão emocional da sua imagem de marca e o captar mais-valia nacional na conectividade aérea dos aeroportos do País (aqui)

*Emigração/Diáspora
A partir de 1978, a relação entre a TAP e a emigração é integrada nos programas de governo. A TAP passa a ser “meio de união de portugueses espalhados pelo Mundo”, há uma “política de presença da TAP junto das comunidades portuguesas” e a sua importância para “fluxos de emigrantes, turístico e de comércio externo”.

A realidade comercial é algo diferente. Antes da liberalização de 1993, o exemplo de França vale uma investigação. TAP e Air France influenciam as autoridades da Aviação Civil para manter uma oferta de lugares limitada, de modo a vender caro à procura cativa dos emigrantes. Os voos fretados entre França e Portugal são esporádicos e quando os há, os emigrantes são impedidos de os utilizar. As tarifas grupo para turistas chegam a ser um terço da ‘tarifa especial’ de que os emigrantes dispõem (7).

Sem diminuir ou ignorar a dimensão afectiva da TAP,

-é a liberalização de 1993 que torna as viagens da diáspora mais baratas e acessíveis, com companhias low cost a mostrar o absurdo das tarifas da ‘transportadora aérea nacional´.

*Turismo
A actividade da TAP no transporte de turistas e no apoio a acções de promoção ou de marketing e vendas da oferta é inegável e deve ser reconhecida.

Reconhecido este facto, a politica politico partidária para o transporte aéreo permite que a gestão da TAP

-se acomode com a regulação internacional que dificulta a baixa de preços nas rotas entre cidades da Europa, o que limita o do turismo com chegada a Lisboa e Porto (8),

-ignore dos voos charter entre o Norte da Europa e áreas turísticas da ‘bacia alargada do Mediterrâneo’ que integra o Algarve e a Madeira (9).

Já no século XXI, a procura para o turismo urbano de Lisboa e Porto só ganha escala de relevo com as companhias inovadoras, filhas da desregulação de 1993.

*Missões confiadas pelo Governo
Damos exemplo de uma decisão política de entre muitas que deixam de ser possíveis a partir de 1993 (liberalização) e 1994 (decisão da Comissão):

-“Por decisão governamental em Abril de 1984 foi introduzido um voo mensal entre Lisboa e S. Tomé, com escala intermédia em Cabo Verde, o que permitiu completar as ligações aéreas entre Portugal e todos os países de expressão portuguesa. Dada a manifesta falta de rentabilidade desta linha, existe pela parte do Governo um compromisso de uma indeminização compensatória.” (10).

Lembramos dois exemplos de ‘missões’: a extensão, temporária e deficitária, da rota de S. Paulo a Buenos Aires e a rota Lisboa-Macau que exige e vale investigação adequada.

*Enquadramento internacional da ‘transportadora aérea nacional’
Desde a década de quarenta até ao início da de noventa a regulação da actividade das empresas de transporte aéreo é assegurada por três instrumentos:

-acordos bilaterais entre estados sobre direitos de tráfego aéreo que fixam rotas, frequências e capacidade de lugares, e são aplicados pelas instituições da ‘aviação/aeronáutica civil’,

-acordos sobre preços e regras a limitar a concorrência pela IATA … uma associação das ditas empresas,

-acordos bilaterais entre empresas, como os de pool de receitas e sua partilha.

De uma maneira crescente, as mesmas empresas que limitam a concorrência consagram enorme energia a criar artifícios para as violar (10bis).

Em síntese, este modelo de regulação e a sua interpretação pela administração portuguesa protegem a TAP contra a concorrência e estão na origem de uma contradição de que é exemplo o caso da emigração em França:

-com base no argumento de ‘proteger a TAP’, o estado regulador impede que turismo, emigração e países de língua portuguesa beneficiem de tarifas mais baixas (10c).    

 

2.Início dos anos 90: TAP é salva da falência pelo PESEEF (11)        

*A TAP no início dos anos 90
Da decisão da Comissão de Julho de 1994, citamos (com edição nossa):

-No contexto comunitário, o mercado doméstico da TAP é um mercado periférico e relativamente pequeno. Portugal constitui essencialmente um destino de férias caracterizado por um tráfego com baixa rentabilidade, em que a TAP enfrenta a concorrência de transportadoras aéreas não regulares, bem como de transportadoras aéreas regulares.

-Apesar da sua dimensão limitada, a TAP explora uma rede muito heterogénea.

-O seu mercado mais importante é a Europa, em que estão concentradas mais de 80 % das suas operações.

-O mercado doméstico inclui principalmente as rotas para as regiões autónomas do Atlântico (Açores e Madeira), relativamente às quais Portugal impôs obrigações de serviço público.

-Para além disso, a TAP explora uma série de rotas do Atlântico Norte, geralmente deficitárias, e rotas para a América Central e a América do Sul.

-Um importante sector da rede da transportadora aérea é o africano, que inclui principalmente as rotas com destino às antigas colónias portuguesas.

-A TAP não explora actualmente rotas para o Extremo Oriente.”.

*A TAP à beira da insolvência
Não é impunemente que desde a nacionalização a TAP tenha tido sempre resultados líquidos negativos. No início da década de 1960 a falência da empresa parece fatal e só é evitada pelo drive do ministro Joaquim Ferreira do Amaral. Em 1994, a decisão da Comissão é precedida por um diagnóstico de que destacamos:

-“A TAP atravessa uma grave crise financeira. [] O capital próprio tem sido negativo desde 1980 (um valor negativo de 16 493 000 escudos portugueses, no ano financeiro de 1992). […] a estrutura de capital da TAP é fundamentalmente frágil”,

-“A fragilidade desta estrutura financeira deve-se essencialmente às enormes perdas acumuladas, que acarretaram a erosão do capital da empresa.”

-“A TAP é deficitária na maior parte da sua rede. Em 1992, apenas registou lucros em 11 das suas rotas, enquanto que outras 30 registaram perdas que ultrapassaram 50 % das receitas”,

-“Em termos de rendibilidade, a TAP encontra-se actualmente numa situação mais difícil que a maioria das suas concorrentes europeias.”.

*As medidas de 1993
Entre 1992 e 1994, o resultado líquido acumulado do exercício da TAP é de €-790 milhões, em valor actualizado a 2014. É neste contexto que devem ser compreendidas decisões que o governo toma ainda em 1993:

-“um novo Regulamento Administrativo de Trabalho, que regulamenta as condições de trabalho e as relações entre a TAP e o seu pessoal a partir de 1 de Abril de 1993”, o que pode gerar “redução anual dos custos laborais de cerca de 3 mil milhões de escudos portugueses”,

-congelamento de salários em 1993 e 1994 e supressão de cerca de 1.200 postos de trabalho, medidas que resultaram numa redução dos custos de cerca de 4 mil milhões de escudos portugueses.

Os mais velhos não esqueceram as imagens da intervenção da policia a dispersar a manifestação do pessoal da TAP em Outubro de 1993.

*A baixa produtividade
O principal problema da TAP é sua baixa produtividade:

-“qualquer que seja o ângulo pelo qual se analisem os actuais níveis de produtividade da TAP, os mesmos situam-se em valores sistematicamente abaixo dos apresentados pelos seus principais competidores europeus, facto que, naturalmente, coloca a empresa em situação de desigualdade competitiva”,

-“Mesmo tendo em conta a extensão média dos percursos, a produtividade da TAP é muito inferior à das suas concorrentes”,

-abaixa produtividade da TAP é causada pela sua estrutura de custos elevados e baixos rendimentos e a “companhia tem excesso de pessoal, está mal organizada e opera demasiados tipos de aviões”.

*Recuperação económica e financeira em quatro anos (1994/1997)
O PESEEF é elaborado com base no “cenário que visa a recuperação da situação económica e financeira da companhia ao longo de quatro anos (1994/1997), mas

-a “implementação bem sucedida das medidas previstas em cada um dos [oito] cenários considerados não será suficiente para atingir os níveis de eficácia necessários para sobreviver”,

-“a TAP não tem a massa crítica necessária para sobreviver no novo ambiente de concorrência estabelecido com a criação do mercado comum da aviação”,

-“a longo prazo, a TAP ver-se-á, por conseguinte, forçada a formar uma aliança ou alianças estratégicas com parceiros estrangeiros, apenas possível após a recuperação da situação financeira da TAP em resultado da aplicação bem sucedida das medidas de reestruturação previstas.”.

Entre outros, o PESEEF traduz-se em 

-cerca de €1,35 mil milhões para aumento de capital, e cerca de €1,27 mil milhões de garantias a empréstimos, em euros actualizados a 2014 (aqui).

*Decisão da Comissão
Para a Comissão, “O auxílio a conceder à TAP no período 1994/1997,

-“tem por objectivo a sua reestruturação em conformidade com o plano e as garantias prestadas por Portugal, incluindo a sua privatização parcial”.

A Comissão

-considera que o auxílio do estado à TAP “é compatível com o mercado comum e com o Acordo EEE”

-regista o compromisso de Portugal de iniciar em 1997 o processo que deve conduzir à privatização parcial da TAP

-lembra que “Em conformidade com a legislação comunitária, Portugal se abstenha de conceder mais auxílios à TAP.”.

Dada a sua actualidade, o ponto da decisão sobre ‘potenciais efeitos negativos do auxílio nas trocas comerciais e na concorrência’ é descrito no post sobre a reestruturação pública da TAP (aqui).

 

3.Do PESEEF a nova ameaça de falência

*Do PESEEF a nova ameaça de insolvência (1995 a 2000)
Em 1995, o programa do governo de António Gutteres é optimista ao mencionar

-“uma companhia de bandeira dotada de uma gestão equilibrada e sólida, capaz de concorrer em mercado aberto”.

A evolução do resultado líquido da TAP durante os seis anos até 2000 mostra uma realidade que contradiz este optimismo. Em valores de 2014,

-entre 1995/2000, o resultado líquido acumulado da TAP é de €-448 milhões,

-em 1997 e 1998, há um resultado líquido positivo de €23 milhões.

O “cenário que visa a recuperação da situação económica e financeira da companhia ao longo de quatro anos (1994/1997)” parece estar a ser seguido. A realidade vai ser diferente, ao ponto de entre 2000/01, a TAP enfrentar de novo uma situação de insolvência.

*Visão do Plano Estratégico 1997/2000
Segundo o Relatório da TAP referente a 1997, a visão do Plano Estratégico 1997/2000 “aponta para a seguinte proposta de valor”

-“Companhia nacional que “domina” o mercado português, das principais comunidades com fortes vínculos a Portugal espalhadas pelo mundo, e dos turistas estrangeiros individuais viajando para Portugal, através de uma rede que engloba os principais destinos desses clientes, de um serviço simples, rápido e tipicamente português, e da recompensa da lealdade desses clientes à TAP, a um preço em linha com as companhias de bandeira concorrentes.”.

Esta “proposta de valor” retoma mitos da ‘transportadora aérea nacional’ e não tem em conta a inviabilidade deste modelo de negócio. A referência a “turistas estrangeiros individuais” parece ser resposta à crítica da Decisão da Comissão que figura na Nota (7).

*Privatização ligada à SWISSAIR
Em Julho de 1994, Comissão

-“regista o compromisso de Portugal de iniciar em 1997 o processo que deve conduzir à privatização parcial da TAP”.

Depois, a privatização da TAP é mencionada no Programa do Governo (1995/99) e integrada no Programa de Privatizações para 1998/99.

Os acordos iniciais entre a TAP e o SAirGroup, remontam a 1997, ano em que a TAP adere à Aliança Estratégica Qualiflyer. Em Dezembro de 1999, há revisão profunda do acordo entre a TAP e o SAirGroup. O processo segue o seu curso, mas desmorona-se em 2001:

-em Janeiro, o SAirGroup decide não efectuar investimentos adicionais no transporte aéreo e em Fevereiro desiste da participação em 34% do capital da TAP – em Outubro é a falência da Swissair e da Sabena em Novembro.

É neste quadro que a TAP passa a ter gestão profissional.

*Rota de Macau e Air Macau – o longo curso indispensável à TAP?
Segundo o Relatório e Contas da TAP referente a 1994, recebido o apoio publico que evita a falência e no contexto descrito antes, a empresa decide

-“a abertura de voos para o Extremo Oriente, associados à participação numa companhia local, a Air Macau”

-a aquisição, indirecta, de 25% do Capital da Air Macau.

Esta aquisição

-cria “novos e promissores horizontes à sua [da TAP] operação para uma zona geográfica em forte expansão”,

-“Em coordenação com a nova transportadora e utilizando-a como “feeder” e distribuidora preferencial, a TAP projecta, assim, o seu futuro numa área até agora inexplorada, abrindo, em simultâneo, a possibilidade de cooperação técnica e a realização de actividades complementares, indutoras de valor acrescentado à sua actividade principal, potenciando as vantagens sinergéticas e de diversificação das suas capacidades.”

Estas decisões valem investigação que nos informe, entre outros, sobre:

-a TAP depender de voos rentáveis de longo curso e o mercado para uma actividade significativa residir no aeroporto de Macau,

-a decisão empresarial ter origem política, de avião português ligar Lisboa a Macau e ‘ser o primeiro a aterrar no aeroporto de Macau’,

-quem assume a responsabilidade da decisão, presta contas dos prejuízos e e assume as consequências?

Um módico de bom senso e conhecimento do mercado confirmam a ilusão sobre o tráfego potencial da rota e da empresa feeder.

*A TAP de novo à beira da falência
Do Relatório da TAP SA referente a 2001, citamos:

-“Consequência de prejuízos acumulados e dos resultados de 1999 e 2000, chegámos a uma situação que nos impõe uma gestão de Tesouraria aturadíssima. A melhoria dos resultados comerciais alcançados tem sido um factor decisivo para a sua sustentabilidade.

Assume, por isso, elevado grau de urgência o projecto de privatização, o qual prevê a entrada na Empresa da participação no seu capital por parte do(s) novo(s) accionista(s).

No quadro da actual legislação comunitária, privatização é a via para a reestruturação e a consolidação financeira da TAP.”.

 

4.Modelo de negócio e narrativa da ‘transportadora aérea nacional’

*Queda do modelo de negócio da ‘transportadora aérea nacional’
Entre 1993/1994 o modelo de negócio da ‘transportadora aérea nacional’ está condenado por duas decisões interligadas ‘da Europa’. A primeira data de Janeiro de 1993 e estabelece a liberalização do tráfego aéreo de passageiros no espaço aéreo europeu

-retira ao estado o poder de controlar rotas, frequências e capacidade de lugares oferecidos, indirectamente, preços,

-torna obsoleta e ilegaliza a tradicional fixação de preços pela IATA os preços pela IATA.

A segunda é a decisão da Comissão de Julho de 1994 sobre a ajuda do Estado à TAP exige que, “Em conformidade com a legislação comunitária, Portugal se abstenha de conceder mais auxílios à TAP.”.

A TAP entra num mundo novo:

-o estado deixa de poder pagar as ‘garantias’ que a TAP dá e a empresa é obrigada a ser rentável em mercado aberto e sem ajuda do estado.

*Consequências para a narrativa da ‘transportadora aérea nacional’
A imposição do novo modelo de negócio à TAP desfaz a narrativa da ‘transportadora aérea nacional’ porque

-a TAP só pode garantir o que a procura e a sua competitividade tornam rentável, o que exclui manter rotas estruturalmente deficitárias.

-companhias inovadoras vão prestar melhor serviço e a melhores preços à emigração e ao turismo,.

-nos países de língua oficial portuguesa, a TAP vai competir, sem ajuda financeira do estado, com as companhias aéreas estatais que os governos podem apoiar directamente ou por via dos acordos bilaterais de tráfego aéreo duramente negociados.

*Elementos da narrativa que perduram
O modelo de negócio está inviabilizado por factores externos, mas na narrativa sobre a “transportadora aérea nacional” há elementos que perduram e não devem ser ignorados:

Outros são mais importantes,

-entre 2002/03, quando o presidente Cardoso e Cunha quer acabar com a gestão profissional, a narrativa da “transportadora aérea nacional” integra de novo a visão empresarial.

-na privatização de 2014/15, a ideia de que ‘a TAP garante’ é partilhada pelo governo e pela oposição à privatização. 

 

A Bem da Nação

Lisboa 4 de Maio de 2015

Sérgio Palma Brito

 

Notas

(1)Em 1975, o Decreto-Lei nº 205-E/75, de 16 de Abril de 1975 “Nacionaliza a companhia dos Transportes Aéreos Portugueses, a contar de 15 de Abril de 1975”.

A Decisão da Comissão lembra que “As dificuldades financeiras da TAP tiveram início em 1974, quando a empresa perdeu o monopólio de transporte nas rotas com destino às antigas colónias portuguesas em África, que se caracterizavam por um tráfego intenso, com elevadas taxas de ocupação e rentabilidade.”

Decisão da Comissão de Julho de 1994” é a designação corrente de

94/698/CE: Decisão da Comissão, de 6 de Julho de 1994, relativa ao aumento de capital, garantias de crédito e isenção fiscal existente em favor da TAP. (aqui).

 (2)A Resolução nº 244/80, de 7 de Julho “Declara a TAP – Transportes Aéreos Portugueses, EP em situação económica difícil a partir de 4 de Julho de 1980”. O detalhe do presente item é a alínea b do ponto 1.2.1 do documento de trabalho TAP Air Portugal – Notas Genealógicas (1944/2012) de apoio ao post Privatização da TAP Air Portugal (I) - de Salazar à Actualidade (aqui).

(3)Em Agosto de 1980, a Resolução nº 274/80, de 4 de Agosto do Gabinete do Primeiro Ministro “Incumbe os Ministros das Finanças e do Plano, do Trabalho e dos Transportes e Comunicações de activarem as medidas adequadas a uma profunda reestruturação da TAP, visando a sua consolidação”.

(4)Fonte: Anexo à Portaria nº 991/80, de 17 de Novembro.

(5)A Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/85, de 6 de Fevereiro “Aprova a celebração de um contrato-programa entre o Estado e a TAP - Air Portugal, E. P., e autoriza os Ministros das Finanças e do Plano e do Equipamento Social a intervir na celebração desse contrato em representação do Estado”.

(6)Com a evidente excepção das “linhas de África”, este conceito é muito semelhante ao do de antes do 25 de Abril:

-o principio geral de haver missões que o Estado pode confiar à TAP-Air Portugal, EP – ontem as “linhas de África”, hoje “o transporte para as regiões autónomas” ou S. Tomé e Príncipe, em 1984,

-os antigos “territórios ultramarinos” mais o lugar especial que o Brasil sempre teve [ver Decreto-Lei de 1953], são hoje os Países de Língua Portuguesa,

-a dinamização da actividade turística nacional é mais evidente, mas é constante desde 1944.

(6bis)Ver respectivamente, Humberto Delgado, Memórias, Edições Delfos, 1974; e Preâmbulo do Decreto-Lei nº 39188, de 25 de Abril de 1953, que cria a TAP, SARL.

(7)Em 1994, a decisão da Comissão refere “No passado, a TAP não seguiu uma política comercial correcta no que respeita à fixação dos preços dos seus produtos, procurando garantir o êxito da companhia através de elevadas taxas de ocupação e não da fixação de tarifas lucrativas. Parecia ser mais importante encher os aviões (frequentemente através da venda de grupos a preços marginais) do que optimizar os resultados operacionais.”. A observação de ‘grupos a preços marginais’ parece influenciar a estratégia da TAP para 1997/2000 – ver o ponto 3. A comparação entre tarifas é baseada na nossa experiência profissional.

(8) A TAP pela sua definição de ‘transportadora aérea nacional´, é um dos elementos do Sistema de Regulação do Tráfego Aéreo de Passageiros, que impede a concorrência e favorece uma politica de tarifas altas.

(9)A TAP ainda tenta captar este mercado com a criação da Air Atlantis. Para sermos justos, a tendência dos operadores que garantem os charters é a integração vertical de ‘organização do package, transporte aéreo e distribuição’. Este processo de integração vertical é acompanhado pelo de fusões e aquisições e culmina em 2006 com a TUI Travel plc e Thomas Cook plc.

(10)Relatório da TAP referente a 1984, p. 17.

(10b)Não é fácil documentar estas práticas que conhecemos por experiência própria, na Bélgica e em Portugal. Com base desta experiencia podemos afirmar que a TAP não tinha dinamismo significativo nesta área, se é que tinha algum.

(10c)Esta cultura ainda está presente em muitas das intervenções contra as companhias low cost que são autorizadas a voar para a Portela e assim ‘prejudicar’ a TAP.

(11)O PESEEF (Plano Estratégico de Saneamento Económico e Financeiro) é elaborado no segundo semestre de 1993, aprovado em Assembleia Geral da TAP de Janeiro de 1994 e objecto da Decisão da Comissão de 6 de Julho de 1994.

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