Camas Paralelas na Cidade – Debater Ilações de Narrativas e Factos


O presente post é o sexto de uma série de seis (Primeiro, Segundo, Terceiro, Quarto, Quinto, Sexto) sobre o tema:

Camas Paralelas na Cidade – Quando Factos Contrariam Narrativas

O objectivo do presente post é

-suscitar o debate sobre as Ilações a tirar das Narrativas e Factos sobre as Camas Paralelas na Cidade que descrevemos em posts anteriores.
Em pano de fundo continua a estar a nossa preocupação em

-dar uma ideia do trabalho profissional a fazer para dispormos de informação objectiva sobre o Alojamento Turístico Não Classificado,

-contribuir para convencer quem de dever, na Iniciativa Privada e Governo, que a tomada de posição e a decisão política sobre Camas Paralelas exigem conhecer melhor a realidade e “partilhar uma maneira diferente de a analisar”.


1.Ilações a Tirar das Narrativas Sobre Camas Paralelas na Cidade

*Concorrência Desleal: Desvirtuar Alojamento Local
É um facto que

-Camas Paralelas na Cidade violam a legislação em vigor sobre Alojamento Turístico, como acontece com as do Algarve desde há cinquenta anos,

-alguma da sua legalização pelo Alojamento Local, sobretudo no Algarve, viola a letra e o espirito do Regime Jurídico que define esta modalidade de Alojamento.

Face a esta realidade, a proposta de Portaria sobre Alojamento Local que a AHP apresenta vai no sentido de restringir o leque da Oferta Camas Paralelas a legalizar, e “inibir” o seu crescimento.

Em nossa opinião, há uma maneira diferente de analisar a regulação pública desta Oferta. Podemos demonstrar que a oferta de Camas Paralelas na Cidade

-resulta dos sucessivos Regimes jurídicos do Alojamento Turístico serem concebidos para a excluir,

-é manifestação de iniciativa empresarial privada, em resposta a dinâmicas da Procura por alojamento que é objecto desta exclusão,

-em conjunto com toda a oferta de Camas Paralelas do País, é objecto de Atitude Equívoca (misto de «esquecer, ignorar, hostilizar, tolerar, proibir») por parte da Politica de Turismo,

-aumenta a Contribuição do Turismo para a Economia (no Produto e Emprego), por via do aumento da Receita de Turismo na Balança de Pagamento.

Estamos em pleno no lema deste Blogue: “Vamos partilhar uma maneira diferente de analisar o Viajar e o Turismo?”. No contexto desta maneira diferente, propomos

-não seguir a politica de limitar ou “inibir” o crescimento das actuais Camas Paralelas,

-inovar e integrar no âmbito da Politica de Turismo toda a oferta de alojamento utilizado por turistas, com concorrência leal entre todos os Tipos de Alojamento.

*Concorrência Desleal: ”evasão fiscal como vantagem competitiva”
O secretário de Estado do Turismo aceita como boa a narrativa da AHP sobre a ”evasão fiscal como vantagem competitiva” e faz dela bandeira. A exemplo do que acontece há trinta anos de Camas Paralelas no Algarve, a evasão fiscal tem duas dimensões:

-empresários a aproveitar a incompreensível passividade do Fisco, que não fiscaliza a Oferta de Camas Paralelas como é seu dever – perante a visibilidade da oferta, o Fisco só não cobra impostos se não quiser e para isso não precisa de nenhuma legislação do Turismo,

-a Hotelaria a agitar este argumento para que a Politica de Turismo venha a “inibir” o leque de Oferta do Alojamento Local – assim se compreende que, na indiferença geral, haja actividades com dimensão turística onde a evasão fiscal parece ultrapassar a das Camas Paralelas na Cidade.
Questionamos o Principio Orientador do Secretário de Estado do Turismo que reduz o modelo de negócio das Camas Paralelas à “evasão fiscal como vantagem competitiva” – no ponto 2, apresentamos o que pensamos dever ser a orientação do Ministério da Economia.

*Relação Entre o Estado e a Industria da Hotelaria
A relação entre o Estado (na realidade, Politica e Serviços de Turismo) e a Industria da Hotelaria exige ser revista à luz de duas alterações profundas

-a Transformação Estrutural do Mercado Europeu da Viagem de Lazer, isto é, do mais importante mercado da oferta de turismo do País,

-de estarmos a viver o Período do Após Crise de 2008/2009 num País da periferia da Europa e de uma centralidade cujos efeitos no Turismo são relevantes em si mas limitados em relação à Oferta.

Pedir que o Estado intervenha no «combate à imobiliária», no limitar/inibir do crescimento da Oferta e no controle da Distribuição, é expressão de uma relação ultrapassada entre o Estado e a Industria da Hotelaria.

Esta relação é definida pelas palavras do Secretário de Estado do Turismo:

-“Num sector e numa economia em que o próprio Estado habituou as pessoas a que o Estado é financiador, mecenas, licenciador, comprador, fiscalizador, regulador, não é fácil. Os empresários adaptam-se à realidade que têm. E adaptaram-se a um sistema que vivia com o Estado como motor e central.”.

O Secretário de Estado também reconhece a outra face da realidade:
-“No sector hoteleiro, os grupos que estão mais sólidos são os que precisam pouco do Estado e que tiveram uma estratégia de internacionalização. 
Conseguiram ter uma estratégia de sucesso, apesar do peso do Estado.” (1).

A modernização da relação tradicional entre o Estado e a Industria da Hotelaria começa a estar na agenda da Politica de Turismo e está com atraso em relação às exigências da Competitividade Estratégica da própria Industria da Hotelaria (2).


2.Ilações a Tirar de Factos a Observar e Quantificar

*Modelo da Oferta de Camas Paralelas na Cidade
A Oferta de Camas Paralelas na Cidade é investimento ligeiro e não apoiado pelo Estado, de pessoas e empresas em

-Apartamentos arrendados a turistas, pelo proprietário e empresas especializadas,

-Estabelecimentos de escala reduzida: Hostel, B&B, Guest House e Inn.
Duas observações:

-é caso único em que o discurso oficial não apoia iniciativas empresariais, com qualidade e contributo para a Balança de Pagamentos,

-fomentar Empresas de Exploração de Apartamentos é bom para a consolidação/sustentabilidade do negócio e para a Formalidade Fiscal.

*Tentativa de Quantificação 
Com base em quatro Operadores (Booking, Tripadvisor, Flipkey e Homeaway), temos:

-Apartamentos: Barcelona (10.482), Lisboa (3.129) e Porto (832) – neste caso, ignoramos quantos apartamentos são realmente comercializados, pois a inscrição no site é fácil e não implica sucesso,

-Hostels: (346), Lisboa (149) e Porto (65).

-Conjunto de B&Bs/Inns/Guest Houses: (493), Lisboa (237) e Porto (160).

*Questões em Aberto
O exemplo de Barcelona e a importância dos quatro Operadores Turísticos considerados permitem levantar três questões, que ficam em aberto:

-é possível concluir que Lisboa e Porto não são casos únicos de cidades a posicionar-se em mercados de importância crescente? – referimos os do Alojamento da Convivialidade e o do Holiday Rental,

-os números de Barcelona podem ser interpretados como prova de haver um potencial de crescimento significativo para Lisboa e Porto?

-qual o contributo desta oferta para atrair a Lisboa e Porto turistas que não se alojariam em Hotel e quem são estes turistas – por outras palavras, a oferta da Camas Paralelas é concorrente ou complementar da Hotelaria?

*Contributo Para a Reabilitação Urbana de Zonas Históricas
A localização dos Estabelecimentos/Instalações de Alojamento em Lisboa segue o padrão comum às três cidades e confirma a necessidade de olhar para esta Procura/Oferta do ponto de vista de

-animação de zonas como a Baixa e outras zonas históricas das Cidades,

-ligação deste esforço da Iniciativa Privada com a Reabilitação Urbana,

-sinergia/conflito entre Utilização Turística dos apartamentos e Arrendamento Urbano à População Residente.

A experiência e o bom senso mostram que todo o debate sobre estes e outros pontos deve ser precedido de quantificação da realidade e de especial cuidado nas comparações internacionais.

*Politica Para o País
Nas posições da AHP, há duas vertentes:

-é mais do legítimo que a AHP exija ao Governo a regulação do mercado do alojamento turístico com equidade e o combate à informalidade fiscal, os dois pilares da concorrência desleal,

-diferente é o caso da AHP solicitar apoio do Estado na gestão da Procura/Oferta de alojamento turístico, no controle da Distribuição online e no “inibir” o aumento da oferta de Holiday Rental – é um tema polémico e a exigir debate.

Compete ao Governo construir a Politica de Turismo que escute as posições da AHP, mas tenha uma visão da diversidade da Procura/Oferta de Alojamento Turístico. Assim, como referimos antes e explicamos em outro post (ATNC4), a Procura e Oferta de Alojamento Turístico Não Classificado devem ser

-tratadas num contexto nacional, com destaque para o Algarve, e não no único contexto urbano de Lisboa e Porto,

-apoiadas por Fiscalidade Competitiva, que represente mais receita para a Iniciativa Privada e Estado e contribua para a competitividade da Oferta.
Esta é uma das inovações que o País espera do Governo. 

*Prioridade do Ministério da Economia
O fim primeiro da Política de Turismo consiste em facilitar a missão da Iniciativa Privada no maximizar a Contribuição do Turismo Para a Economia, como demonstraremos na Segunda série de posts. Em Portugal,

-o mais importante indicador desta Contribuição é o da Receita do Turismo na Balança de Pagamentos, na medida em que,

-só esta Receita exige o Investimento e cria a Procura que, de maneira sustentada, contribuem para o Emprego e para o PIB.

No respeito deste princípio, o Ministério da Economia

-deve quantificar a Procura/Oferta e compreender o potencial de criação de valor e por uma Oferta adequada a uma Procura nova e que talvez não viesse a Portugal se não existisse esta oferta,

-em função desta quantificação, deve facilitar o empreendedorismo e inovação (low tech, mas inovação) no investimento e exploração de Hostels e do conjunto de B&Bs, Inns e Guest Houses, mais de Apartamentos do Holiday Rental,

-defender a Formalidade Fiscal como instrumento para criar, a médio e longo prazo, actividades económicas competitivas (a evasão fiscal é dopping de curto prazo) e para defender a concorrência leal.


A Bem da Nação

Albufeira 25 de Novembro de 2013

Sérgio Palma Brito


Notas

(1)Entrevista do Secretário de Estado do Turismo ao jornal Sol de 9 de Abril de 2013.


(2)A expressão é de Michael Porter em Competitive Strategy – Techniques for Analyzing Industries and Competitors, um livro de tremenda actualidade para compreendermos a Industria da Hotelaria. 


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